Busca:     


O "burro operante"

Luiz Carlos Azedo - Março 2015
 

Um dos artífices do Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade (PBQP) - ao lado do empresário Jorge Gerdau Johannpeter e do ex-prefeito de Vitória Luiz Paulo Vellozo Lucas, então no Ministério da Economia -, o executivo Antônio Maciel Neto, hoje presidente do grupo Caoa, tem uma definição especial para o sujeito que consegue potencializar suas qualidades pessoais para fazer tudo errado: é o "burro operante".

Segundo Maciel, qualquer projeto, programa ou produto para dar certo precisa de um tripé robusto: o conceito acertado, o método adequado e um ambiente favorável. O conceito, porém, é o mais decisivo. Se estiver errado, pode transformar o que seriam atributos positivos em fatores negativos que só aumentam o tamanho do desastre. Isso vale para o carisma, a combatividade, o dinamismo, a firmeza, a iniciativa, etc.

Ninguém está livre de se tornar um "burro operante" quando erra na direção do processo. Um pequeno livro de cases está disponível nas boas livrarias; intitulado As piores decisões da história e as pessoas que as tomaram (Sextante), reúne uma galeria de líderes e estadistas que tomaram decisões catastróficas: Nero, o papa Alexandre III, Napoleão, o general Custer, Winston Churchill (duas vezes), Stalin, Robert McNamara e Mao Tse-Tung, entre outros protagonistas da História.

O caso do líder comunista chinês é o mais dramático. Mao provocou a morte por inanição de pelo menos 20 milhões de pessoas - fala-se que chegariam a 40 milhões. A tragédia humanitária, demograficamente, pode ter sido uma perversa solução política, diante do equívoco econômico que foi o Grande Salto Para a Frente. O principal problema da China era a alimentação.

O ambicioso programa econômico aprovado no 8º Congresso do Partido Comunista Chinês, em 1956, pretendia superar em 15 anos a antiga União Soviética, com quem Mao havia rompido, e a Inglaterra. E pôr a indústria da China para competir com os Estados Unidos e todo o Ocidente, como, aliás, acontece hoje, quase 60 anos depois, mas por outros meios. A fé revolucionária levou Mao a conceber o programa voluntarista; o orgulho pessoal, a não admitir o seu trágico erro.

O caso do pré-sal

Estamos longe de um desastre social, mas o caso serve de ilustração para os riscos de decisões voluntaristas em matéria de economia, como algumas que foram tomadas nos governos Lula e Dilma, cujas consequências agora estamos vivendo. O grande erro de conceito ocorreu na Petrobras, mergulhada na maior crise de sua história. Seu efeito catalisador está sendo a Operação Lava-Jato, que revelou o mais escandaloso caso de corrupção da atualidade mundial.

A decisão estratégica, cujas consequências estão se irradiando por toda a economia, da quebradeira de empreiteiras à greve dos caminhoneiros, foi a mudança do regime de concessões para o de partilha, no qual o petróleo extraído deixa de ser do concessionário para ser todo do Estado. A Petrobras passou a ser responsável por 30% dos investimentos na exploração do pré-sal. Para isso, ampliou seus investimentos sem ter, porém, condições reais para isso.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi o principal responsável pelo equívoco. Foi convencido a ancorar toda a estratégia de desenvolvimento do país na exploração do pré-sal pelo ex-diretor da Petrobras Guilherme Estrela; pelo então senador Aloizio Mercadante, hoje chefe da Casa Civil; e pela presidente Dilma Rousseff, que ocupava o cargo atual do ex-parlamentar. Em razão disso, o regime de concessões virou um estorvo; o programa do pró-álcool e outras fontes de energia renováveis, pura perda de tempo. O pré-sal passou a ser uma espécie de bezerro de ouro, que iria conduzir o país ao status de nova potência mundial, em meio à crise econômica internacional.

Em torno da Petrobras, articulou-se um grande cluster metal-mecânico e petroquímico de empresas associadas ou contratadas pela estatal, que agora enfrenta sua maior crise, com falências e demissões em massa. O regime especial de licitações e a lei de incentivo à transferência de tecnologia e proteção das empresas nacionais serviram de cortina de fumaça para a corrupção generalizada e para o financiamento do projeto de poder do PT e de seus aliados.

Na Presidência, Dilma viu no capitalismo de Estado, alavancado pela Petrobras, a antessala do paraíso. A Petrobras, como símbolo do progresso nacional, e seu poder político e econômico serviram para vedar os olhos da sociedade e paralisar as instituições políticas até eclodir a Operação Lava-Jato. Entretanto, o conceito estava errado, o método dispensa comentários e o ambiente nunca foi tão desfavorável. O atual modelo fracassou e terá que ser revisto.

----------

Luiz Carlos Azedo é jornalista.

----------

Artigo relacionado:

Notas políticas



Fonte: Correio Braziliense, 1 mar. 2015.

  •