Artigo
Eu n?o quero!
::: 13/10/2003

Com certeza, essa frase faz parte da rotina di?ria de muitos pais e m?es ansiosos por oferecer uma alimenta??o adequada a seus filhos e que acabam se sentindo derrotados e impotentes diante de uma recusa insistente e, muitas vezes, agressiva.

Diante do "n?o", a tend?ncia dos pais costuma ser a de buscar algo que compense, ou seja, a ansiedade em alimentar o filho, seguida de recusas freq?entes, acaba gerando pr?ticas alimentares extremamente permissivas, onde a crian?a consegue receber apenas o que deseja.

A sensa??o de conforto diante do filho alimentado, mesmo com alimentos inadequados, costuma compensar, nos pais, a frustra??o diante das recusas freq?entes. ? quando os pais dizem: "pelo menos isso ele come".

A recusa aos alimentos costuma come?ar j? nos primeiros anos de vida, consolidando-se ao longo do tempo. Al?m de uma quest?o de paladar, onde ocorrem diferen?as individuais, a escolha pelos alimentos passa tamb?m pela maturidade psicol?gica e por aspectos sociais e culturais. Enfim, a forma??o do h?bito alimentar ? bastante complexa, envolvendo diversos fatores, mas o papel da fam?lia ? de fundamental import?ncia nesse processo.

Entendendo a fam?lia como o primeiro contato da crian?a com o mundo, o comportamento de todos os membros ir?, fatalmente, influenciar o comportamento da crian?a, o que poder? condicionar seus h?bitos. Assim sendo, uma fam?lia que tem uma alimenta??o de boa qualidade, com consumo di?rio de legumes e verduras, por exemplo, certamente influenciar? a aceita??o da crian?a por esses alimentos. A visualiza??o freq?ente de tais alimentos ? mesa, acompanhada de demonstra?es agrad?veis e verbaliza?es positivas, cria o ambiente prop?cio para que o h?bito alimentar seja formado.

? medida que a crian?a come?a a freq?entar outros ambientes, como a escola, novas influ?ncias ser?o sentidas. Como existe a tend?ncia ? repeti??o do comportamento de outros, ? comum a crian?a alterar o seu comportamento alimentar, fazendo escolhas baseadas no seu conv?vio com colegas de escola, amigos, professores etc. Nesse per?odo, a influ?ncia da propaganda tamb?m ? grande, o que pode trazer conseq??ncias bastante negativas, como uma escolha insistente por alimentos de alto valor cal?rico e baixo valor nutricional (biscoitos, salgadinhos, refrigerante, balas etc). ? importante que os pais n?o estimulem tal comportamento, nunca demonstrando muito interesse por tais propagandas diante dos filhos.

Cabe aos familiares estimular, tanto quanto poss?vel, a forma??o de bons h?bitos nas crian?as, seja pelo exemplo (procurando tamb?m manter uma alimenta??o adequada, evitando certos excessos, principalmente na frente dos filhos), ou exercendo influ?ncias positivas quanto ao consumo de alimentos de qualidade, atrav?s de verbaliza?es positivas ou desenvolvendo atividades l?dicas e prazeirosas que possam tornar a hora da refei??o um momento de prazer.

Seguem algumas dicas que podem ajudar pais e educadores a estimular as crian?as na hora das refei?es.

1- Nunca se referir de forma negativa a nenhum alimento ou fazer express?es que demonstrem desagrado ao mesmo diante da crian?a. Essas atitudes criam uma resist?ncia muitas vezes dif?cil de ser vencida.

2- N?o demonstrar interesse excessivo pela quantidade de alimentos ingerida pela crian?a. Percebendo esse interesse, a crian?a poder? vir a utilizar a refei??o para chantagear os pais, conseguindo sempre o que deseja atrav?s da recusa pela comida. Trate-a com naturalidade ? mesa, mostrando que esse ? um momento de uni?o familiar, devendo ser vivido com tranq?ilidade e sem cobran?a. Jamais force a crian?a a comer quando ela n?o deseja. Tal atitude cria a sensa??o de que o alimento ? uma imposi??o, o que torna ainda pior a sua aceita??o.

3- Nunca compensar a recusa por uma refei??o (ou uma ingest?o insuficiente de alimentos) com produtos do tipo iogurte, biscoito, fruta etc. Se a crian?a recusou o alimento por estar sem fome, ? preciso esperar a pr?xima refei??o, quando ela, fatalmente, ter? fome para comer. Um erro freq?ente dos pais ? o de n?o esperar que a crian?a sinta fome, alimentando-a com freq??ncia e em hor?rios muito pr?ximos.

4- Manter hor?rios fixos para as refei?es e procurar n?o substitu?-las por lanchinhos ou guloseimas. As necessidades nutricionais da crian?a precisam ser supridas e "pular" refei?es ou troc?-las por outros alimentos tanto pode comprometer o estado nutricional quanto criar h?bitos indesej?veis de alimenta??o. ? importante que os pais tamb?m sigam uma rotina alimentar mais pr?xima da de seus filhos.

5- N?o estimular h?bitos indesejados desde cedo. Utilizar muito a?car para ado?ar os alimentos, adicionar mais sal aos alimentos j? temperados e prontos para comer, ingerir l?quidos durante as refei?es (principalmente se forem bebidas gaseificadas, como os refrigerantes), comer frituras com freq??ncia, s?o h?bitos que os pais n?o devem estimular nos filhos pequenos, para n?o chegarem ? idade adulta com tais pr?ticas alimentares, as quais podem comprometer a sa?de ao longo do tempo. Quando os pais t?m tais h?bitos, ? desej?vel procurar corrigi-los diante dos filhos.

6- Sempre que poss?vel, tentar alguma atividade l?dica que possa ser desenvolvida durante a refei??o, como contar hist?rias sobre os alimentos, fazer desenhos com a comida, contar quantas cores t?m no prato etc. Quando a crian?a j? tem idade suficiente para freq?entar a cozinha, deix?-la participar do preparo de algum alimento pode ser uma pr?tica bastante estimuladora para o consumo do mesmo, como lavar as folhinhas da alface, tirar a casca da batata cozida, picar frutas para salada (usando faquinhas de pl?stico) etc. Fazer com que a crian?a sinta que foi a respons?vel pelo preparo de algum alimento presente ? mesa (mesmo quando a sua participa??o foi m?nima) ? uma forma de trabalhar a auto-estima, contribuindo tamb?m para uma melhor aceita??o dos alimentos. Elogios s?o importantes nesse momento.

7- Conhecer sobre os alimentos ? uma forma de estimular a aceita??o dos mesmos. At? uma certa idade, ? bom evitar conceitos muito abstratos, que dificilmente a crian?a entende, como falar de vitaminas, prote?nas etc. Entender que os alimentos fazem "ficar forte" ou "ficar bonita", muitas vezes j? ? o bastante. Exibir o alimento antes de preparado, falar de como ele cresce e se desenvolve (mostrar, por exemplo a semente que o gerou) ajudam a criar um elo de afetividade e interesse pelo mesmo, facilitando a sua aceita??o.

Resumindo, o envolvimento de toda a fam?lia no momento da alimenta??o ? de fundamental import?ncia na forma??o do h?bito alimentar da crian?a. Para tanto, muitas vezes ? necess?rio que a fam?lia eduque os seus h?bitos tamb?m, adaptando-os ?s necessidades da crian?a, o que, fatalmente, ir? beneficiar a todos.

Na pr?xima parte desse artigo estaremos falando da chamada neofobia, express?o utilizada para se referir ? recusa pelos novos alimentos, t?o comum entre as crian?as.


Cristina Garcia Lopes
? nutricionista formada
pela Universidade Federal de Vi?osa.
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