Eleições 2012 13/9/2012

A crença na transferência de votos e os dilemas da campanha em Juiz de Fora

candidatosOs programas televisivos das três candidaturas que ocupam as primeiras posições nas pesquisas eleitorais têm buscado, desde o início, a associação dos prefeitáveis com nomes de peso da política nacional. Nas últimas semanas o processo se acentuou: Margarida vem intensamente buscando uma simbiose de sua persona com a da presidente Dilma, além de ter em Lula o grande cabo eleitoral nas aparições dos spots de 30 segundos; Custódio ancorou-se fortemente no apoio de Aécio Neves; e, sobretudo a partir do programa televisivo de 7 de setembro, Bruno vem procurando associar-se à trajetória de Itamar Franco.

Mas em que medida os pedidos de voto de Lula para Margarida e de Aécio para Custódio, bem como os elogios gravados em programas antigos nos quais Itamar fala de Bruno, têm o poder de transferir o capital político dessas lideranças para os candidatos? É razoável supor que essa estratégia seja a variável mais decisiva para gerar votos?

A resposta provavelmente é não. A própria expressão "transferência de votos" é claramente metafórica, visto que nenhum político tem o poder de deslocar automaticamente seu cacife eleitoral para qualquer outro nome: no máximo, é possível considerar que o apoio de um ator político pode impactar, em graus variados, o voto de segmentos bem específicos do eleitorado.

Um momento paradigmático desse quadro foi a eleição presidencial de 2010, em que Dilma e Serra chegaram ao segundo turno e o debate sobre o fenômeno da transferência de votos de Lula para sua candidata circulou de forma intensa. Os dados coletados à época pelo Datafolha (registrada no TSE sob o nº 17162/2010) servem para ilustrar os problemas na excessiva crença de que votos são facilmente transferíveis.

Naquela pesquisa, 41% dos eleitores com certeza votariam na indicação de Lula e outros 24% disseram que talvez definissem o voto seguindo sua sugestão; por outro lado, 28% deixariam de votar no/a candidato/a indicado/a indicado por ele. E é preciso ressaltar que, além de fatores municipais serem significativamente mais importantes numa eleição para prefeito do que questões nacionais, a eleição presidencial de 2010 viveu com muito mais intensidade a estratégia de colagem de nomes (Lula e Dilma) do que se verifica até o momento em Juiz de Fora.

Ou seja, é bastante provável que o potencial de transferência de votos na cidade seja muito inferior a esse apurado pelo Datafolha para as eleições presidenciais. O cientista político Marcos Coimbra, presidente do Instituto Vox Populi, costuma dizer que a capacidade de transferir votos tem limites evidentes. Nessas eleições municipais de 2012, o balanço parcial das pesquisas aponta que Lula (indiscutivelmente o mais popular nome da política brasileira contemporânea) não tem conseguido virar a favor de seus candidatos eleições das quais têm participado intensamente – por exemplo, Recife.

"O eleitor partidário e ideológico se define muito cedo. Quem é Serra, é Serra. Não precisa de FHC. Em Belo Horizonte é a mesma coisa", disse Marcos Coimbra ao jornal Brasil Econômico, em 13 de setembro, ao comentar as eleições na capital mineira, onde, apesar da forte presença de Lula pedindo na TV votos para Patrus Ananias (PT), a eleição parece caminhar para uma vitória do atual prefeito, Márcio Lacerda (PSB). O mesmo tem se repetido com relativa frequência. Em 2008 o apoio do Presidente Lula não foi suficiente para que Marta Suplicy se sagrasse vitoriosa na luta pela importante prefeitura de São Paulo - em ocorrência parecida com aquela de 1996, em que o concorrente era José Serra e o apoiador o Presidente FHC.

A transferência de votos em relação ao sucesso eleitoral poderia ser interpretada, em expressões provenientes dos estudos lógicos sobre relações causais, como uma causalidade INUS: parte insuficiente mas não redundante, de uma condição suficiente mas não necessária. É insuficiente, pois a existência de apoiadores com prestígio não garante por si só a vitória eleitoral (há outras condições que devem estar presentes); é não-redundante, pois, sem a transferência do prestígio, a existência das outras condições relacionadas (clima de opinião favorável, maior índice de indecisos) perde valor; é suficiente, pois há casos em que a transferência de votos e suas condições secundárias modificam na direção da vitória uma campanha eleitoral; e é, por fim, não necessária, pois há diversos outros conjuntos de condições explicativas que confluem para o sucesso eleitoral. O que as teorias de causalidade ensinam, desde muito cedo, é que os efeitos possuem, quase sempre, uma pluralidade de causas.

Lula, Aécio ou Itamar são ou foram nomes relevantes da política brasileira – longe, portanto, de se imaginar que seus pedidos (no caso dos dois primeiros) ou sua lembrança (no caso do último) sejam pouco importantes. Mas as campanhas de Margarida, Custódio e Bruno precisam ter clareza de que esses pedidos de voto ou associações provavelmente estão longe de ser a variável mais relevante da campanha. Um breve panorama do atual cenário das disputas país afora sugere que, em eleições municipais, questões municipais constituem frequentemente o cerne do processo de decisão de voto.


Paulo Roberto Figueira Leal (professor da UFJF; doutor em Ciência Política pelo Iuperj) e Vinícius Werneck Barbosa Diniz (doutorando em Ciência Política pelo Iesp-Uerj)

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