Edição 691

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A maior decepção
A derrota em uma Copa do Mundo é tão doída que, muitas vezes, marca mais do que um título. O tetra em 1994, por exemplo, foi tão insosso, que daqui há 60 anos certamente poucos se lembrarão. Hoje, de um modo geral, prefere-se exaltar a super seleção de Telê Santanna, em 1982, campeã do futebol-arte, ou ainda, o time de guerreiros de Cláudio Coutinho, em 1978, que acabou fora da final depois da "armação" entre peruanos e argentinos. Por isso, a discussão parece não ter fim. Ao invés de lembrarmos dos cinco bons momentos (1958/1962/1970/1994/2002), preferimos lembrar qual a maior decepção brasileira em uma Copa do Mundo. 
Se é para falar de fracassos, vamos então ao maior deles, que teve sua história contada e recontada diversas vezes. No relato de pessoas que estavam lá, aquele 1º de julho de 1950 foi o dia mais triste da história do futebol brasileiro. De virada, a Seleção Canarinha perdeu para o Uruguai por 2 a 1. Nascia ali o "maracanaço", que os uruguaios até hoje festejam mais do que a reconquista da Província Cisplatina.
Há quem diga, e um deles é meu pai, que a derrota só tomou essa proporção pela euforia criada no jogo anterior. No segundo jogo do quadrangular decisivo do Mundial, contra a Espanha, o Brasil de Zizinho, Ademir e Jair atropelou a Espanha diante de um Maracanã lotado. A Espanha era tida como uma das favoritas. A euforia pelo 6 a 1 era tanta que a torcida começou a entoar, de forma espontânea, a marchinha “Touradas de Madri” no estádio. A junção entre música e futebol comoveu os jornalistas presentes, que escreveram maravilhas sobre o futebol-arte praticado pelos brasileiros. A partir daí, a história é conhecida: o "peru morreu (não aquele de 1978) de véspera". O clima de “já ganhou” tomou conta da seleção e dos brasileiros. Políticos e cartolas se aproveitaram do triunfo anunciado para posarem em fotos ao lado dos futuros campeões do mundo. Houve até um evento na véspera da grande final em que autoridades se deixaram fotografar com a faixa de campão no peito. Réplicas da taça circulavam livremente entre os cartolas e torcedores. No jogo, Obdulio Varela e Ghiggia trataram de calar 150 mil vozes que estavam no marcanã e outras milhares espalhadas pelo Brasil. Duas pessoas morreram de ataque cardíaco no estádio e a camisa branca foi usada pela última vez pela Seleção Brasileira.
A derrota de 1950 é tão emblemática que virou um curta-metragem, Barbosa, produzido em 1988 por Ana Luiza Azevedo e Jorge Furtado. O filme tenta recuperar a imagem do goleiro brasileiro, Barbosa, um negro esguio de quase dois metros que teria falhado no segundo gol uruguaio. No curta, um homem atormentado por aquela derrota tenta voltar no tempo e mudar o destino da bola chutada por Gighia. Porém, dez anos depois do lançamento do filme nada mudou no destino infeliz de Barbosa, que virou um simples funcionário do Maracanã, açoitado pelas lembranças dos mais tristes 90 minutos da sua vida. Em 1997, o técnico Zagalo, supersticioso ao extremo, barrou a entrada do ex- goleiro na concentração da Seleção Brasileira às vésperas de um jogo pelas Eliminatórias da Copa da França alegando que ele era pé-frio. As derrotas servem de lições, muito mais do que as vitórias, mas marcam a vida das pessoas. Daqui há quatro anos, quando a Copa do Mundo se realiza no Brasil, certamente a derrota de 1950 será o episódio das copas mais lembrado pelos brasileiros, um fantasma que atormentou a vida de Barbosa até 2000, quando ele morreu, e continuará atormentando a vida dos brasileiros para sempre.

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