Paulo César Paulo César 11/8/2012

Músicas de Roberto Carlos inspiram o emocionante road movie À Beira do Caminho

Quando parecia que o cinema nacional tinha apresentado suas melhores obras, com os sucessos de público Heleno e Xingu, e também com o perturbador Febre do rato, eis que um despretensioso road movie surge de uma releitura inspirada de algumas canções do "rei" Roberto Carlos. À Beira do Caminho é um filme que, por mais óbvio que pareça e aconteça, consegue ir fundo no estudo das relações fraternais e no comportamento humano ante seus próprios demônios.

O longa acompanha o caminhoneiro João (João Miguel) pelas mais diversas paisagens das estradas do sertão e agreste nordestino. Ora entre a poeira e a vegetação escassa, ora cercado pelas verdejantes matas agrestinas. Traumatizado com acontecimentos do passado, ele vaga sem destino concreto, se martirizando e sofrendo com algo que não pode ser mudado. Mas quando seu caminho se enlaça com o do órfão Duda (Vinícius Nascimento), que pretende ir a São Paulo em busca do pai, ambos descobrirão que são importantes um para o outro, mais do que imaginavam.

A história que nasceu de um argumento de Léa Penteado, que já trabalhou com o cantor Roberto Carlos, tem como cartão de visitas a dureza da vida de caminhoneiro, das refeições em espeluncas à beira da estrada, as roupas lavadas a sabão bravo no rio, e a companhia da cachaça bebida no gargalo. A personalidade reclusa, carregada de autopiedade exagerada de João se interpondo com a determinação e perspicácia do menino Duda, permitem uma leitura livre de pieguices, das quais filmes do gênero geralmente pendem.

Mas tudo só funciona da maneira esperada quando o trabalho do diretor Breno Silveira entra em ação. Na mesma sensibilidade em que conduziu 2 filhos de Francisco, ele conseguiu pontuar, com canções de Roberto Carlos e frases de pára-choques, cada momento em que se encontrava o espírito de João. Intimista, buscava a todo o momento a melhor expressão dos atores, as alegrias, as tristezas e frustrações. Arranca sorrisos do público com tanta facilidade quanto os leva às lágrimas. Trevas e luz, o curso da vida na forma do tortuoso caminho e a solução de todos os problemas à beira, sugerindo a felicidade da escolha do título.

João Miguel é o mais camaleônico dos atores do cinema nacional, e provou isto dando vida a um personagem soturno, fracassado e sofredor. Entregue à melancolia e ao flagelo de não se perdoar por erros do passado, e fez deste seu melhor trabalho. Seu companheiro de cena, o pequeno Vinicius, mostra segurança e consegue transmitir o otimismo e equilíbrio de Duda. Até as participações pequenas de Dira Paes e Denise Weinberg são competentes.

Tudo bem que o filme seja óbvio demais, e que seu enredo passe por outras produções nacionais que se fazem por viagens de engrandecimento e autoconhecimento, como Central do Brasil e Caminho das Nuvens. Mas as canções de Roberto Carlos conduzindo a sorte dos personagens traz algo a mais ao longa de Silveira, e mesmo que todo mundo saiba o que esperar, a comoção da relação do homem com o menino é inexplicavelmente inevitável. Uma bela surpresa para o cada vez melhor cinema tupiniquim, e uma involuntária (ou não) homenagem ao Dia dos Pais.



Paulo César da Silva é estudante de Jornalismo e autodidata em Cinema.
Escreveu e dirigiu um curta-metragem em 2010, Nicotina 2mg.

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