Representação dos negros nas Telenovelas Brasileiras: Entre estereótipos e resistências

Como as tramas da TV refletem, reforçam ou desafiam as estruturas sociais no Brasil.

Por Da redação

Representação dos negros em telenovelas.

As telenovelas, enquanto produto cultural e principal formato ficcional da televisão brasileira, sempre ocuparam um papel central na construção da identidade nacional. Desde a popularização do gênero na década de 1960, com obras como Beto Rockfeller (TV Tupi, 1968), até os telenovelas contemporâneas do Globoplay, a representação das minorias — raciais, sexuais, religiosas, regionais e de classe — tem oscilado entre o reforço de estereótipos e a tentativa de inclusão e visibilidade.

Durante décadas, a telenovela brasileira foi marcada por um protagonismo quase exclusivo de personagens brancos, ricos e do eixo sudestino Rio-São Paulo. A branquitude foi naturalizada como identidade nacional dominante.

Um marco simbólico nessa disputa por visibilidade foi a escalação de Taís Araújo como protagonista da novela Viver a Vida (Globo, 2009), escrita por Manoel Carlos. Ela se tornou a primeira mulher negra a interpretar uma “Helena”, personagem-tipo criada pelo autor — até então sempre associada a mulheres brancas, de classe média-alta e de aparência eurocêntrica, como Regina Duarte (História de Amor, 1995), Vera Fischer (Laços de Família, 2000) e Christiane Torloni (Mulheres Apaixonadas, 2003).

A escolha de Taís foi, à época, celebrada como avanço, mas também revelou o racismo estrutural ainda presente no imaginário do público. A atriz foi duramente atacada nas redes sociais e enfrentou rejeição de parte da audiência, como ela mesma relata anos depois em um vídeo publicado no Tiktok.

Como aponta a pesquisadora Maria Immaculata Vassallo de Lopes em Telenovela: indústria, linguagem e identidade nacional (2009): “A telenovela contribui para a construção simbólica da identidade nacional, mas essa identidade não é neutra: é uma versão hegemônica, em que certos sujeitos e experiências são privilegiados, enquanto outros são silenciados ou estereotipados.”

Nesse contexto, a Helena negra de Taís Araújo pode ser vista como um corpo estranho ao modelo hegemônico das novelas globais — não por sua atuação, mas pela quebra de expectativa racial da audiência. É um episódio que revela o quanto a representatividade, sozinha, não é suficiente se não vier acompanhada de narrativas potentes, acolhimento institucional e mudança no olhar do público.
O contraste com Vai na Fé (2023), protagonizada pela mesma atriz, é revelador: Sol é negra, periférica e evangélica — e, ao contrário de Helena, é amada, popular e legitimada pela audiência, crítica e redes sociais. A diferença não está apenas na recepção, mas na construção narrativa que reconhece a experiência negra como legítima e central.