Magnata da mídia pró-democracia é considerado culpado sob lei de segurança em Hong Kong
PEQUIM, CHINA (FOLHAPRESS) - O magnata da mídia Jimmy Lai, 78, preso desde 2020 em Hong Kong, foi considerado culpado nesta segunda-feira (14) por acusações de violar a Lei de Segurança Nacional imposta por Pequim à cidade em 2020.
Lai será sentenciado com base na acusação de sedição, além de conluio com forças estrangeiras, que prevê prisão perpétua como pena máxima. A próxima etapa do processo será a audiência de atenuação da pena, marcada para começar em 12 de janeiro. A sentença será proferida após essa fase.
O veredicto foi anunciado após um julgamento que durou 156 dias, gerou 855 páginas de decisões judiciais e passou a ser visto como um marco da aplicação da Lei de Segurança Nacional. Uma das juízas do caso, Esther Toh, afirmou que Lai demonstrava "ódio e ressentimento" em relação à China e que seus depoimentos ao tribunal foram inconsistentes, contraditórios e não confiáveis.
O QUE DIZ A LEI DE SEGURANÇA NACIONAL
**Legislação é válida desde junho de 2020**
Em resposta aos protestos pró-democracia ocorridos em Hong Kong em 2019, Pequim impôs a lei que criminaliza atos de secessão, subversão, terrorismo e conluio com forças estrangeiras. À época, o regime chinês afirmou que os direitos e liberdades dos honcongueses seriam respeitados. A legislação, que não tem efeito retroativo, também estabelece que agentes da China continental destacados para Hong Kong não estão sujeitos à jurisdição local enquanto estiverem no exercício de suas funções.
Fundador e dono do jornal pró-democracia Apple Daily, que encerrou suas atividades em 2021 após uma ofensiva das autoridades, Lai é a figura mais proeminente julgada até agora sob a Lei de Segurança Nacional em Hong Kong.
A sessão contou com a presença do réu, que vestia um casaco e um cardigã verde-claro e acenou para familiares ao entrar no tribunal. Sua esposa e um de seus filhos acompanharam a audiência.
Apoiadores do magnata, incluindo organizações de jornalistas e leitores do Apple Daily, permaneceram dentro e fora do tribunal durante o anúncio do veredicto. Alguns passaram a noite na fila em busca de uma das 507 autorizações para acompanhar a sessão no plenário.
Durante o período de detenção, Lai passou mais de 1.800 dias em confinamento solitário, segundo sua defesa. Familiares e organizações de direitos humanos afirmaram que sua saúde está se deteriorando, uma vez que ele é diabético, hipertenso e tem problemas cardíacos. Também foram denunciadas restrições no acesso a tratamento médico adequado.
QUEM É JIMMY LAI, 78
**Magnata está preso há cerca de cinco anos**
Milionário, é um dos principais críticos das políticas e da liderança do Partido Comunista da China. É conhecido por ter usado sua fortuna para financiar movimentos pró-democracia em Hong Kong. Natural de Guangzhou, no sul do país, fez fortuna administrando uma fábrica e criando a rede de lojas de roupas Giordano, que foi alvo de boicote oficial na China na década de 1990 em razão do ativismo político de seu proprietário. Após vender sua participação na empresa, fundou, em 1995, o jornal Apple Daily.
À Folha de S.Paulo em setembro, o regime chinês afirmou que Hong Kong oferece condições seguras, humanas e adequadas de detenção, além de diagnóstico e tratamento médico apropriados para Lai.
ENTENDA O CASO
Lai foi preso em agosto de 2020, suspeito de crimes relacionados à Lei de Segurança Nacional, imposta a Hong Kong em resposta aos protestos ocorridos em 2019 na região. As manifestações eram contrárias às lideranças locais por seu alinhamento a Pequim, tinham teor pró-democracia e desafiavam a liderança do Partido Comunista Chinês.
Os promotores do caso afirmam que Lai utilizou o Apple Daily para publicar material considerado sedicioso entre 2019 e 2021 e para realizar conluio com forças estrangeiras entre 2020 e 2021.
Segundo a acusação, o magnata violou a legislação ao trabalhar com políticos estrangeiros e ativistas, incitando "sanções, bloqueios ou outras atividades hostis" contra o país, o que representaria um risco à segurança nacional. Ele foi acusado ainda de cooperação de longo prazo com forças no exterior.
Lai foi apontado como mentor e financiador do grupo "Fight For Freedom, Stand With Hong Kong" (lute pela liberdade, apoie Hong Kong), que, de acordo com os promotores, pressionava países por sanções contra a China e Hong Kong.
Lai sempre negou as acusações. O magnata afirmou que nunca pediu sanções contra o país após a Lei de Segurança Nacional, pois isso seria um "suicídio". Disse ainda que o direcionamento editorial do jornal refletia os valores dos honcongueses, que se importam com a democracia e a liberdade.
O caso foi acompanhado pelo governo americano, visto que os Estados Unidos têm legislação direcionada a Hong Kong que obriga o governo a avaliar se a região mantém autonomia suficiente para ter tratamento diferenciado em relação à China, entre outras determinações. O presidente dos EUA, Donald Trump, chegou a dizer que poderia incluir o caso de Lai nas negociações com Pequim.
Relatos de fontes próximas indicavam que o americano levantou o caso do magnata em sua conversa com o líder chinês, Xi Jinping, durante um encontro em outubro de 2025, apelando por sua libertação. Nenhum comunicado oficial de Washington ou Pequim, porém, havia confirmado isso publicamente até esta segunda, quando Trump disse que se sente "muito mal" com a decisão judicial contra Lai e confirmou o apelo a Xi.
O processo também foi acompanhado pelo Reino Unido, uma vez que Lai é cidadão britânico. A ministra das Relações Exteriores, Yvette Cooper, escreveu nas redes sociais que a acusação contra Lai tem motivações políticas e exigiu a liberação imediata do magnata, assim como o tratamento médico necessário com profissionais independentes.
"Jimmy Lai tem sido alvo dos governos chinês e de Hong Kong por exercer pacificamente seu direito à liberdade de expressão. A Lei de Segurança Nacional de Pequim foi imposta a Hong Kong para silenciar os críticos da China. O Reino Unido tem reiteradamente pedido a revogação da Lei de Segurança Nacional e o fim da perseguição judicial de todos os indivíduos acusados com base nela", escreveu.
A China não reconhece a dupla cidadania; por isso, Lai foi julgado apenas como cidadão chinês.
Mais tarde, o governo em Londres convocou o embaixador da China para explicações, sinal tradicional na diplomacia quando há descontentamento entre países.
