Cúpula dos Povos faz 'barqueata' na COP30 para debater crise climática 'de baixo para cima'

Por GEOVANA OLIVEIRA

BELÉM, PA (FOLHAPRESS) - A sociedade civil não participa das decisões nas conferências da ONU sobre clima. Ela acompanha as reuniões de negociação entre ministros e diplomatas dos países, mas só para observar e cobrar decisões em outros espaços.

Por isso, na COP30, em Belém, haverá também a Cúpula dos Povos, entre os dias 12 e 16 de novembro, que afirma discutir a crise climática "de baixo para cima", a partir da experiência das pessoas.

A reunião, que tem cerca de 15 mil credenciados, inspira-se em movimentos paralelos às conferências de clima iniciados durante a Rio-92, conhecida como a "mãe das COPs".

Coordenado por mais de mil organizações sociais de 62 países, o evento acontece na UFPA (Universidade Federal do Pará), a cerca de 8 km do Parque da Cidade, onde ficam as zonas azul e verde da COP.

A abertura, porém, será no rio Guamá, com uma "barqueata", manifestação com cerca de 150 embarcações que levam ambientalistas e representantes de comunidades tradicionais, como o cacique Raoni Metuktire.

Essa será a primeira grande ação popular em uma COP desde 2021, quando a conferência foi realizada em Glasgow, na Escócia. As últimas três aconteceram em países com regimes autoritários, que limitaram as manifestações.

A tradicional Marcha Mundial pelo Clima, que costuma acontecer no primeiro final de semana das COPs, também volta a ser realizada em grande escala neste ano, no sábado (15), com organização da Cúpula dos Povos. São esperadas mais de 20 mil pessoas nas ruas, em caminhada que sai do Mercado de São Brás.

A marcha seguirá as demandas da Carta de Declaração dos Povos, que será construída pelos movimentos sociais e representantes de comunidades tradicionais em seis plenárias na quarta (13) e na quinta-feira (14).

"Enquanto as COPs oficiais seguem negociando números e metas, a Cúpula fala de vidas, direitos e territórios", diz o manifesto da organização.

As plenárias discutem seis eixos: soberania popular e alimentar, racismo ambiental, transição justa, cooperação internacional, crise climática nas cidades e periferias, e mulheres. Em paralelo, acontecerão cerca de 200 atividades, propostas por movimentos sociais do Brasil e de países como China, França, Reino Unido, África do Sul e Arábia Saudita.

A conferência popular vai começar todos os dias com a Cúpula das Infâncias, por exemplo. Segundo o coordenador-geral do evento, Salomão Hage, professor da UFPA, não é possível discutir temas como justiça social, mudanças climáticas, racismo e justiça ambiental sem garantir a voz e a participação de quem terá seu futuro e desenvolvimentos mais afetados por qualquer decisão tomada na atualidade.

"Cada dia da programação é uma etapa viva de construção coletiva e demonstra que o enfrentamento à crise climática passa, necessariamente, pelo fortalecimento das comunidades que já protegem e regeneram os biomas", diz a organização.

A intenção da programação paralela, segundo a cúpula, é permitir que grupos à margem das negociações formais da ONU apresentem suas próprias propostas, soluções e demandas por justiça climática, soberania alimentar e direitos territoriais.

Além disso, o espaço serviria como um contraponto aos negociadores da COP30, sendo uma forma de cobrar ações mais ambiciosas e justas dos líderes mundiais e governos.

Isso começou a ser feito na última semana, durante a Cúpula de Líderes. Em entrevista coletiva na sexta-feira (7), a comissão política da Cúpula dos Povos criticou a falta de compromissos concretos dos líderes.

"Até o momento há pouca verdade e muito vazio de compromisso por parte dos países historicamente responsáveis pela crise climática", disse o mexicano Jacobo Ocharan, da ONG Climate Action Network.

Segundo Ocharan, os países ricos chegaram "com as mãos vazias, sem planos nacionais realistas nem compromissos concretos com a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis".

Para manter a inclusão da sociedade civil no processo de negociação e pressionar os diplomatas por ações mais efetivas, a Cúpula dos Povos também entregará a Carta de Declaração dos Povos ao embaixador André Corrêa do Lago, presidente da COP30, em uma audiência pública no domingo (16).

O encerramento será feito logo depois, na Praça da República, espaço de manifestações simbólico da capital paraense. Será organizado um "banquetaço" ?refeição aberta a todas as pessoas, feita com alimentos da agricultura familiar.