Colega diz que alertou técnica sobre adrenalina na veia do menino Benício

Por Folhapress

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Depoimento colhido ontem pela Polícia Civil aponta que a técnica de enfermagem Raíza Bentes foi orientada a não aplicar adrenalina na veia do menino Benício Xavier. A criança, de seis anos, morreu logo após a medicação, em um hospital em Manaus.

Técnica de enfermagem Rocicleide Lopes de Oliveira teria alertado Raíza dos riscos de aplicação intravenosa. Em depoimento à polícia na sexta-feira (5), ela contou que disse para profissional que os 3 ml de adrenalina, quantidade usada pela profissional em Benício, só poderiam ser injetados na veia em casos de parada cardiorrespiratória. Rocicleide estava cobrindo o intervalo da colega na sala de medicação pediátrica do hospital Santa Júlia no dia 22 de dezembro.

Rocicleide contou que orientou que quantidade prescrita deveria ser administrada por nebulização. Por isso, chegou a preparar um kit para que Raiza administrasse na criança. "Raiza, a prescrição EV (intravenosa) nesse volume de 3 ml não pode ser feito via EV, e, sim, por nebulização", teria afirmado à colega, de acordo com o depoimento obtido pelo UOL.

A defesa de Raiza negou a versão da colega. "Raiza questionou como proceder com a prescrição. Ela pediu pra Raiza seguir a prescrição médica", afirmou a defesa ao UOL.

Profissional contou ainda que percebeu que a seringa para aplicação já estava aspirada e reforçou o alerta. "A seringa (que já estava aspirada em 3 ml) não poderia estar aspirada em razão de que um 1 ml se faz apenas em uma parada cardiorrespiratória e acima de 1 ml de adrenalina pura é feita somente por via inalatória!", afirmou, ainda segundo o registro de depoimento.

Rocicleide perguntou se Raiza havia entendido as orientações, e ela respondeu que sim. Ela diz que se dirigiu para o setor onde trabalhava e, instantes depois, ouviu gritos de Raiza.

Ao voltar para sala de medicação onde estava Benício, ouviu de Raíza que havia aplicado a adrenalina na veia do menino. "Roci, eu fiz a medicação EV (via intravenosa) e ele foi ficando branco", teria dito Raiza para a colega.

Técnica disse à polícia não saber por que a colega não seguiu a orientação. Contou também que, em nenhum momento, afirmou para Raíza que ela deveria seguir estritamente a prescrição eletrônica e que, pela sua experiência, interpretou que a médica queria a via por nebulização, e não intravenosa.

Ainda segundo Rocicleide, comentários no hospital apontavam que Raiza não gostava de receber orientações. Por causa disso, a técnica foi transferida de um plantão anterior para aquele em que atendeu Benício devido a atritos com a equipe médica.

Profissional disse ainda que o hospital oferece treinamentos de protocolos de segurança. Relatou que estranhou Raiza ter afirmado que não havia procedimentos implementados.

Benício estava 'amarelado'

Depoimento de outra técnica de enfermagem reforça versão de Rocicleide. Nilda de Souza Evangelista, que também estava no plantão no dia do caso, relatou à polícia que ouviu Raiza gritar o nome de Rocicleide e correu até a sala de medicação pediátrica.

Ela viu que o menino estava "amarelado" e que colegas já prestavam o primeiro atendimento. Segundo ela, Raiza afirmou naquele momento que havia aplicado a adrenalina por via intravenosa, "conforme aparecia na prescrição".

Nilda contou que não presenciou se Raíza pediu ajuda para confirmar a via ou a dose da medicação antes da administração. Ela disse também que já tinha recebido uma prescrição duvidosa de um médico, em outro momento, e que procurou o profissional, tendo a receita corrigida. A técnica não se recorda, entretanto, se isso ocorreu com a médica Juliana Brasil, que fez a prescrição de adrenalina para Benício.

Técnica ainda afirmou que viu Juliana durante atendimento. Ela não se lembra, entretanto, de tê-la visto executando alguma conduta direta no paciente naquele momento.

Nilda também mencionou que o sistema usado para prescrição e evolução dos pacientes "às vezes, apresenta instabilidade". Quando isso ocorre, a equipe registra as informações em papel e depois atualiza o sistema.

Médica muda versão

Em acareação com Raiza na quinta, Juliana afirmou que o erro na prescrição foi do sistema. A versão contraria prints de mensagens enviadas por ela, vazadas nas redes sociais, em que ela assume duas vezes ter errado na forma como prescreveu a aplicação.

Juliana também informou que fez a prescrição errada em um relatório feito à direção do hospital Santa Júlia. No documento, ela disse que, apesar de prescrever o remédio de forma errada, orientou verbalmente à mãe do menino que a adrenalina não deveria ser intravenosa, e sim por nebulização.

Polícia Civil pediu perícia no sistema do hospital. O objetivo é atestar se procede a versão da médica de que houve erro eletrônico, e não médico, na prescrição.