Entidades médicas se manifestam contra 'chip da beleza' e testosterona em mulheres

Por Folhapress

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Associações médicas de endocrinologia, ginecologia e cardiologia publicaram na quarta-feira (10) um documento sobre o uso de testosterona em mulheres para fins estéticos e reposição na menopausa. Em maio, as mesmas entidades já haviam emitido um alerta contra as indicações crescentes.

"Com base nas melhores evidências científicas e em consonância com princípios éticos e regulatórios", SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia), Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia) e SBC (Sociedade Brasileira de Cardiologia) afirmam que a prescrição de testosterona a mulheres deve se restringir à única indicação formalmente reconhecida: o transtorno do desejo sexual hipoativo.

O uso fora desse transtorno, diz a nota, aumenta o risco de efeitos adversos como tumores de

fígado, infertilidade, alterações psicológicas e psiquiátricas, acne, queda de cabelo, crescimento de pelos, crescimento do clitóris e engrossamento irreversível da voz.

As entidades alertam ainda que o uso pode ter repercussões cardiovasculares como hipertensão arterial, arritmias, embolias, tromboses, infarto, AVC e até aumento da mortalidade, além de alterações de outros exames laboratoriais, como os de colesterol e triglicerídeos.

"A gente tem visto mulheres que aparecem [nos consultórios] cheias de acne, pelos, com queda no cabelo, alteração da voz e gordura no sangue, que pode levar a alteração cardiovascular", diz José Maria Soares Júnior, presidente da Comissão Nacional Especializada em Ginecologia Endócrina da Febrasgo.

Segundo o médico, também há relatos de pacientes que foram internadas por infarto e estavam usando o hormônio. "Existem doenças invisíveis. Entre elas, doença do coração, que a paciente não consegue ver e quando perceber, é tarde demais. Por isso, elas precisam saber o que estão usando e o que isso pode causar nelas".

O acesso a indicações, porém, é fácil. Em uma página online, por exemplo, uma ginecologista que afirma ser membro da Febrasgo oferece implantação de testosterona por um preço que varia entre R$ 3.000 e R$ 5.000.

Esse é o "chip da beleza" que a influenciadora Virgínia Fonseca afirmou ser o responsável pelo seu rápido aumento de massa muscular neste ano. Em setembro, questionada se estava usando anabolizantes devido à alteração na voz, ela disse que usava o implante hormonal que combina gestrinona e testosterona.

Diferentes médicos usam as plataformas digitais, como Instagram e TikTok, para recomendar a reposição, que viria sem efeitos colaterais caso feita com acompanhamento médico e na dosagem correta.

As associações médicas de endocrinologia, ginecologia e cardiologia, entretanto, afirmam que não recomendam os implantes subcutâneos manipulados por causa da imprevisibilidade de como o corpo pode reagir a eles e da ausência de dados robustos de eficácia e segurança.

Além disso, a nota ressalta que não existe no Brasil formulação de testosterona aprovada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para uso em mulheres. O posicionamento diz ainda que não existe sequer indicação de dosagem de testosterona em mulheres para investigar se ela está com suposta deficiência.

"O uso de testosterona para fins estéticos, de melhora de composição corporal, desempenho físico, disposição ou antienvelhecimento, em mulheres ou em homens, é vedado pelo CFM (Conselho Federal de Medicina) e não reconhecido pela Anvisa, carecendo de base científica e regulatória", diz o posicionamento.

Sobre o uso na menopausa, as entidades afirmam ainda que a testosterona não apresenta queda abrupta com a menopausa, havendo redução gradual ao longo da vida adulta. "Não há valores de referência validados que definam deficiência androgênica feminina passível de tratamento clínico", diz a nota.