Enel repete demora em SP e deixa 1,3 milhão sem luz 24 horas depois do pico do apagão

Por CLAUDINEI QUEIROZ

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Mais de um dia após o início do apagão causado pela passagem de um ciclone extratropical pelo estado de São Paulo, moradores da capital paulista ainda convivem nesta quinta-feira (11) com a falta de energia, que em alguns bairros, chega a superar 50 horas.

A demora da Enel em retomar a energia na região metropolitana voltou a causar reclamações dos clientes -esse é o quinto apagão a atingir a área em pouco mais de dois anos, desde novembro de 2023. Questionada, a concessionária não deu uma previsão de quando o serviço será restabelecido totalmente.

Além da falta de luz, a cidade também enfrenta outros problemas causados pelo vendaval, como falta de água, caos nos aeroportos e mais de mil árvores caídas.

Até às 20h45 deste quinta, 1,3 milhão de clientes da Enel na Grande São Paulo continuavam sem energia. O número chegou a cair para 1,2 milhão no início da tarde, mas voltou a subir. No pico, na quarta (10), o apagão atingiu 2,2 milhões de imóveis. Outros 300 mil passaram a ter problemas de abastecimento nesta quinta.

O ritmo da retomada do serviço é semelhante ao registrado nos apagões recentes. Isso apesar da reclamação de clientes, das cobranças dos governos e de promessas da Enel de resolver os problemas.

Em outubro do ano passado, após uma queda de energia que atingiu 2,1 milhões de imóveis na área de concessão da Enel, a Folha publicou uma reportagem mostrando que a velocidade com que a empresa resolvia a falta de energia estava em um ritmo menor do que o que ela teve durante o apagão de novembro de 2023, o primeiro da série.

Desde então, houve mais um problema parecido em dezembro passado, atingindo cerca de 666 mil residências, além do atual, que atingiu 2,2 milhões.

O que se percebe é que a demora na volta da energia elétrica se mantém como padrão. Em 2023, foram 2 milhões de imóveis afetados e, após 24 horas, 800 mil ainda enfrentavam problemas. Em outubro de 2024, foram 2,1 milhões de imóveis atingidos e, um dia depois, 1,34 milhão ainda não tinham luz, cenário parecido com o atual.

Questionada sobre a demora no retorno da energia para as áreas mais afetadas, a Enel disse que em "algumas localidades, o restabelecimento é mais complexo, porque envolvem a reconstrução completa da rede, com substituição de postes, transformadores e, por vezes, recondução de quilômetros de cabos".

A empresa afirma ainda que a capital paulista permanece como uma das regiões mais prejudicadas, com mais de 900 mil imóveis sem luz -mais de 15% do total.

A Enel diz que trechos inteiros da rede foram danificados, o que impacta o fornecimento de energia. A empresa afirma ter mobilizado equipes desde o início dos registros de falta de luz e "desde ontem até as 5h de hoje [quinta], mais de 500 mil clientes afetados tiveram o fornecimento normalizado".

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), no entanto, afirmou nesta quinta que o estado fica refém da Enel e voltou a pedir intervenção e caducidade no contrato de concessão do fornecimento de energia elétrica na região metropolitana. A empresa já atua para conseguir prorrogar o contrato, que vence em 2028, por mais 30 anos.

"Temos um contrato muito antigo que está no Ministério de Minas e Energia e que tem a regulação que cabe à Aneel [uma autarquia federal]. Precisamos de investimentos para tornar a rede automatizada porque todos os anos vamos ter eventos climáticos", afirmou Tarcísio.

"O plano de contingência não funcionou, ontem tivemos 1.600 equipes de campo, segundo a empresa informou, e é absolutamente insuficiente, chegamos a ter 2,2 milhões de pessoas sem energia."

"Por isso sugerimos o início do processo de caducidade e intervenção, somos críticos à intervenção. A intervenção funciona porque o interventor terá o caixa [da Enel] para fazer obras. O que nos preocupa é a falta de velocidade no reestabelecimento da energia", prosseguiu o governador.

Ele afirmou que tem notificado o Ministério de Minas e Energia e a Aneel de todos os problemas. Os dois orgãos fazem a gestão e fiscalização do contrato de concessão.

Nesta quinta, o procurador-geral da Justiça, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, designou à Promotoria de Defesa do Consumidor da Capital para acompanhar a crise e tomar medidas para que a Enel ressarça e indenize os consumidores prejudicados com perdas de alimentos e remédios.

Procurada pela reportagem, a Enel não se pronunciou sobre as afirmações do governador. Em nota nesta quinta, a concessionária havia informado que São Paulo e a região metropolitana foram atingidas por um vendaval considerado histórico pelo Inmet, que perdurou por cerca de 12 horas ontem.

O vendaval provocado pelo ciclone extratropical e a falta de energia também provocaram efeitos nos aeroportos de São Paulo e do Rio de Janeiro. Até 22h desta quinta, os cancelamentos de voos no aeroporto de Congonhas chegaram a 300, somados os dois dias de transtornos.

No Rio, a concessionária RIOgaleão disse que, às 15h40, o Galeão teve 39 voos cancelados e recebeu 31 desviados de Congonhas e Guarulhos desde quarta. O balanço inclui chegadas e partidas.

O Ministério de Minas e Energia afirmou que equipes de distribuidoras de energia próximas a São Paulo estão se deslocando para regiões mais afetadas no estado, sobretudo a capital e Campos do Jordão.

Já a Aneel e a Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo) dizem que, de forma conjunta, fazem fiscalização na sede da Enel para avaliar o cumprimento do plano de contingência e das providências para recuperação do serviço.

OS ÚLTIMOS APAGÕES NA GRANDE SÃO PAULO

3.nov.23: Diversas regiões de São Paulo registraram um rastro de destruição durante aquela tarde devido a um temporal acompanhado de rajadas de vento acima de 100 km/h e granizo. Ao menos três mortes foram confirmadas pela Defesa Civil e pelos Bombeiros. Mais de 110 horas após o temporal, cerca de 11 mil imóveis continuavam, às 10h de quarta (8), sem energia elétrica na região metropolitana da capital, provocando protestos de moradores.

18.mar.24: Um apagão causou interrupções no fornecimento de energia, chegando a afetar o abastecimento de água. Segundo a Enel, uma ocorrência na rede subterrânea que atende o bairro de Higienópolis provocou interrupção por volta das 10h30. No início da manhã desta terça-feira (19) ainda havia relatos de falta de luz.

11.out.24: A cidade sofreu um grande apagão após um forte temporal, afetando mais de 2 milhões de residências. Algumas áreas levaram mais de uma semana para ter o serviço totalmente restabelecido. A Controladoria-Geral da União (CGU) concluiu mais tarde que a Enel falhou em seus planos de contingência durante este e outros eventos de 2024.

21.dez.24: Outro evento de grande escala ocorreu entre sexta (20) e sábado (21), derrubando dezenas de árvores, alagando vias e provocando transbordamentos de córregos. Na região metropolitana da capital, aproximadamente 666 mil clientes Enel chegaram a ficar sem luz. Segundo a empresa, 70% das ocorrências foram causadas pelo contato dos fios com a vegetação. Até as 20h do sábado, quase 88 mil residências continuavam sem energia.

10.dez.25: No caso atual, os ventos de quase 100 km/h deixaram mais de 2,2 milhões de imóveis sem energia na Grande São Paulo, com cerca de 1,3 milhão ainda no escuro mais de 24 horas depois.