Idosa ficou 6 dias sem luz, mas recebeu conta para pagar
SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) - A professora aposentada Filomena Laurienzo, 70, acompanhava da calçada do prédio em que vive na Mooca, zona leste de São Paulo, o momento em que a energia era restabelecida hoje após seis dias de interrupção. Descer e subir as escadas do prédio nos últimos a deixou com dificuldade para caminhar.
"Subi as escadas do prédio chorando de raiva", diz a professora aposentada. Ela e o marido Guido Laurienzo, 80, estavam sem energia elétrica desde a terça-feira (9). Embora a Enel tenha sido intimada pela Justiça de São Paulo a religar a energia imediatamente, os moradores do edifício Piazza San Paolo, na Mooca, acordaram nessa segunda-feira ainda sem luz.
Na manhã de hoje, ela e outros moradores esperavam as equipes da Enel finalizarem os trabalho para o religamento da luz. Após a saída das equipes, o sentimento dos moradores era de desconfiança e alívio. Alguns comemoraram e correram para testar os elevadores e outros relataram que temem que quedas de árvores provoquem novas interrupções no fornecimento de energia.
"Descemos para almoçar porque não tem comida em casa", diz Filomena. A professora aposentada relata que desceu as escadas do prédio com o marido apenas para almoçar e, na volta, por volta das 18h, "chorou de raiva" ao ter que subir as escadas do prédio ainda sem energia. "Tenho problema no joelho e duas tromboses", diz ela apontando para o joelho direito inchado. "É uma coisa humilhante".
A previsão era sempre o dia seguinte, diz ela. "Na quinta-feira, falaram que a energia voltaria no dia seguinte e assim por diante", afirma. Filomena conta também que os protocolos de atendimento constavam como "executados", mesmo sem o religamento da luz. "Comecei a entrar com novos protocolos e deram até hoje, às 23h."
Filomena disse que perdeu todos os alimentos que precisavam de refrigeração. "Tudo o que está na geladeira estragou e ainda tem o risco de queimar como já aconteceu antes", diz. Mesmo com o fornecimento da energia interrompido, a conta da luz chegou na casa da professora na quinta-feira. "A luz atrasa para voltar, mas a conta não atrasa um dia, chegou em casa na quinta-feira. Fiquei com mais raiva ainda."
Ela diz que foi à casa dos filhos para dormir uma noite, mas não poderia permanecer com eles todos os dias. "Fui dormir com meus filhos uma noite, mas a gente quer o nosso cantinho." O prédio que, segundo o síndico Uagi Jorge, 66, tem maioria dos moradores de idosos, está mais vazio hoje. Isso porque muitos moradores deixaram suas casas no fim de semana para buscar alternativas para a falta de luz.
A pedagoga Larissa Avelino, 29 anos, conta que a primeira vez que acabou a energia no local foi na terça-feira (9). "Voltou por cinco horas na quarta, mas aí apagou de vez", relata ela que mora há 25 anos no prédio. "Isso nunca aconteceu", diz.
Larissa, que mora com a mãe e o irmão, diz que o maior prejuízo foi com os alimentos estragados. "A gente precisou tirar tudo do freezer, minha mãe tinha 15 quilos de peixe", diz. Ela também lembra que a família precisou tomar banho na casa de familiares. "Por sorte temos rede de apoio, mas a falta de luz gerou a falta de água que nos impediu de tomar, usar o banheiro e fazer comida. Não sei nem descrever o estresse", diz. "A Enel fala que todo mundo é prioridade, mas não faz nada".
A mãe de Larissa de 59 anos foi passar dias na casa do irmão e da avó. Ela conta que um vizinho pagou para tomar banho em um hotel. "O prédio está mais vazio desde sexta-feira", afirma. "A gente se sente lesado. São promessas que não são cumpridas e todo dia é uma promessa diferente."
Moradores relatam preocupação com árvore que pode cair. "Nossa preocupação é que essa árvore caia e a gente vá ficar sem luz de novo", diz Larissa apontando para uma árvore em frente à fachada do prédio. "Não pagamos barato pela energia. Se atrasar uma conta, a luz é cortada na hora."
Síndico afirmou ao UOL que fará reunião emergencial para avaliar estragos. Segundo ele, o prédio não tem gerador, mas agora o equipamento passou a ser prioridade. "São 80 apartamentos com muitos aposentados", diz Jorge. "Vamos fazer uma reunião para avaliar os estragos, temos Natal pela frente e correndo o risco de não ter Natal", diz.
Jorge explica que os elevadores estão sendo reprogramados. "As caixas d'água estavam vazias. As luzes devem estar em ordem", diz ele ao tentar fazer um balanço dos anos. Segundo Jorge, a principal reclamação dos moradores foi a falta de água. "Não tinha como levar para o topo do prédio, sem eletricidade não tem jeito", diz.
Ele disse ainda que tentou comprar geradores para amenizar prejuízos, mas não encontrou o equipamento que precisava. "Todos já estavam alugados", afirma. "Cheguei a pagar R$ 3.000 por um gerador, mas não era o que a gente precisava. Depois até me devolveram o dinheiro. Aluguei um enorme porque era o que tinha", diz ele.
"Aqui qualquer ventinho já ficamos com medo", diz o síndico. A reportagem do UOL acompanhou o momento em que o síndico verificou o funcionamento dos equipamentos do prédio com elevadores, portões e sistema de segurança. "Aqui ficamos tantos dias sem luz porque é um transformador somente para o meu prédio", afirma ele. "Agora vamos torcer para não acontecer de novo", diz ele mostrando os locais do edifício onde pretende instalar um gerador.
O UOL procurou a Enel sobre as críticas dos moradores e aguarda retorno. O espaço segue aberto.
