Brasil terá de quadruplicar restauração de florestas para atingir meta até 2030

Por GABRIEL GAMA

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O Brasil terá de quadruplicar o ritmo atual de restauração de florestas para atingir a meta de recuperar 12 milhões de hectares até 2030. Se quiser cumprir a promessa, o país deverá restaurar, em cada um dos próximos cinco anos, uma área equivalente a 11 vezes a cidade de São Paulo ou a 14 vezes a cidade do Rio de Janeiro.

O objetivo relacionado à vegetação existe desde a primeira NDC brasileira (sigla em inglês para contribuição nacionalmente determinada, como é chamada a meta de cada país no Acordo de Paris). O documento entrou em vigor em setembro de 2016.

O MMA (Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima) afirma que 3,4 milhões de hectares estavam em processo de restauração até novembro de 2025. Assim, desde a definição da meta, apenas 28,25% do prometido está em recuperação.

Seria necessário restaurar, portanto, 1,7 milhão de hectares, ou 17 mil km2, em cada um dos próximos cinco anos para cumprir o compromisso

Em média, o Brasil recuperou 380 mil hectares por ano desde 2016, segundo o levantamento da reportagem com base nos dados do MMA. Assim, o país precisará quadruplicar a taxa.

Leonardo Sobral, diretor de Florestas e Restauração Florestal da ONG Imaflora, afirma que o Brasil custou a sair da inércia e começar as ações de restauração.

"Desde 2016 está estipulada essa meta, e o que a gente fez em 2017, 2018? Praticamente nada, o país demorou a entender que realmente essa é uma agenda importante para o desenvolvimento, para as questões ambientais e também sociais, de geração de emprego", diz. "A gente chega nesse resultado hoje, que é muito baixo, sem dúvida, e que precisa ser acelerado."

A secretária de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais do MMA, Rita Mesquita, afirma que haverá atualizações das áreas restauradas no país a cada seis meses. "Eu não vejo que a gente chegou a um terço desde 2016. A partir do momento que a gente definiu uma metodologia, nós conseguimos cumprir um terço da meta no primeiro ano de acompanhamento."

A Conaveg (Comissão Nacional para Recuperação da Vegetação Nativa) aprovou neste ano os parâmetros que vão guiar o monitoramento da meta.

Paulo Amaral, pesquisador sênior do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia), afirma que o país está aquém do objetivo. "É muito, muito abaixo do potencial que existe e das metas que a gente pode alcançar de forma rápida e até simples, se considerar a vegetação secundária [aquela que volta naturalmente após uma área ser destruída]."

Ele diz que o déficit de áreas florestais que precisam ser restauradas alcança 23 milhões de hectares, dos quais 14 milhões estão na amazônia.

Em uma escala linear, sem acelerar o ritmo atual, o Brasil chegará em 2030 com cerca de 5,3 milhões de hectares recuperados, apenas 44% do prometido.

Rubens Benini, diretor de florestas da organização The Nature Conservancy, vê, porém, que a restauração acontece em progressão exponencial e acredita que as ações devem acelerar nos próximos anos. "Lá atrás, ninguém nem sabia fazer restauração, a capacidade de execução e implementação era mínima", avalia.

"Hoje tem dinheiro, já têm instituições na ponta que executam com qualidade. Falta convencer o dono da terra, e estamos lutando para isso", diz. "Agora que já temos a casa mais organizada, não tem mais por que não ter o salto."

De acordo com a pasta da ministra Marina Silva, 52% da área já restaurada no país (1,77 milhão dos 3,4 milhões de hectares) corresponde a vegetação secundária em terras indígenas e unidades de conservação ?florestas que avançam de forma natural e espontânea.

"Essas áreas sequer deveriam ter sido desmatadas, porque já são protegidas. Então, é o governo olhando para o seu quintal, que ele não tomou conta, e agora oferecendo isso como uma oferta", diz Amaral.

A secretária do MMA afirma que a restauração nesses territórios decorre de processos de desintrusão liderados pelo poder público.

O Planaveg (Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa) determina que 9 milhões dos 12 milhões de hectares serão obtidos pela recuperação de reservas legais, áreas de preservação permanente e de uso restrito, todas previstas no Código Florestal. Conforme os dados oficiais, essas categorias somam 1,2 milhão de hectares em restauração em propriedades rurais com o CAR (Cadastro Ambiental Rural) validado, cerca de 13% do prometido.

Mesquita argumenta que é preciso identificar uma intencionalidade na restauração para que uma determinada área seja contabilizada na estatística oficial. "Eu não posso começar a contar como estando regular uma propriedade que ainda não teve seu CAR validado. Enquanto o CAR não está validado, ela não entra na estatística de propriedade regular", afirma.

"Mas, na paisagem brasileira, nós já temos muito mais de 12 milhões de hectares em restauração, nos mais diversos biomas", destaca também.

Sobral, do Imaflora, vê a meta para 2030 como factível, mas diz ter preocupação com mudanças no cenário político do país. "A restauração florestal não é simplesmente plantar árvores. A gente está falando de um processo caro, que leva anos, e as manutenções são até mais importantes que o plantio efetivamente."

A pesquisadora Ane Alencar, diretora de ciência do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), afirma que o cenário é desafiador porque há casos de projetos de restauração afetados fortemente pelas mudanças climáticas e por queimadas. "Relatos de pessoas que trabalham com plantio de mudas, por exemplo, que tiveram perda de 20% a 40% por conta da seca [em 2024]."

O Observatório da Restauração, liderado pela Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, centraliza informações coletadas de empresas, governos e organizações sociais que desenvolvem projetos de recuperação.

Dados publicados no último dia 10 indicam que 204,2 mil hectares estão em processo de restauração no país. A mata atlântica concentra 64% do total, seguida pela amazônia (19%) e pelo cerrado (15%). A caatinga, o pantanal e o pampa somam apenas 0,7% das áreas em recuperação.

O número difere dos 3,4 milhões hectares contabilizados pelo MMA pois considera apenas projetos autodeclarados pelas organizações, enquanto o dado do governo envolve medições por satélite.

Tainah Godoy, secretária-executiva do Observatório, afirma que o início dos anos 2020 serviu para preparar as bases para a recuperação florestal. "Os primeiros cinco anos dessa década foram para organizar a cadeia da restauração, para falar e divulgar sobre o que é restauração e seus benefícios múltiplos."

"Acredito que a partir de agora, do meio da década de restauração em diante, até 2030, tende a ter um crescimento maior, mais pujante."

Segundo o Observatório, organizações da sociedade civil respondem por 40,5% dos 204 mil hectares em restauração, enquanto o setor privado contribui com 32,9%. Os governos ocupam a terceira posição, com 18,3%.