'Madalenização' do Bixiga mobiliza moradores contra barulho excessivo
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Morador do Bixiga, no centro de São Paulo, desde a infância, o chef de cozinha João Marcos Yajima, 50, tem uma coleção de vídeos enviados por vizinhos incomodados com o barulho excessivo durante as madrugadas, quando parte do bairro, tradicionalmente boêmio, atinge o ápice da vocação com apresentações de rodas de samba e shows nas calçadas.
A rua 13 de maio concentra o maior número de bares que instalam caixas de som na porta para atrair público jovem que se aglomera na calçada e chega a tomar parte da rua. A movimentação atrai vendedores ambulantes de bebidas, que abastecem a noitada até de manhã.
A rotina de madrugadas movimentadas no bairro se intensificou ao longo deste ano quando a famosa rua do Bixiga se tornou referência de apresentações improvisadas de piseiro, uma espécie de forró estilizado, ao lado das já consolidadas rodas de samba.
O sucesso do cantor de piseiro Rom Santana, a atração mais concorrida que atrai multidões para ouvi-lo cantar na rua, fez a presidente do Conseg (Conselho de Segurança) da Bela Vista, Silvana Cunha, monitorar as redes sociais onde as apresentações são anunciadas.
"Postaram que ia ter um baile de rua e conseguimos impedir porque o bar não tinha alvará para o evento", diz. "Os cantores ficam no meio da rua, recebo dezenas de reclamações de moradores."
As mesmas queixas de vizinhos chegam ao chef de cozinha em formato de vídeos enviados pelos moradores das ruas tomadas de pessoas e excesso de barulho. Ele mantém há quatro anos um perfil em rede social dedicado a chamar atenção para os problemas do bairro.
"Costumava receber mais vídeos, mais de dez por fim de semana, mas as pessoas estão cansadas de reclamar e não acreditam mais no poder público", diz. "Estou a base de remédios para conseguir dormir", continua.
A mesma dificuldade é relatada por outra moradora do bairro. "Não temos mais paz na 13 de maio", diz a cozinheira Helia Bispo, 69, vizinha de uma casa noturna que lhe tira o sono aos finais de semana.
"Estamos nos sentindo abandonados porque esses bares e casas noturnas não tem fiscalização da prefeitura", continua.
A presidente do Conseg conta que parte dos bares da 13 de maio já funcionaram na Vila Madalena, bairro da zona oeste da capital igualmente conhecido pela boemia, que também mobilizou moradores há alguns anos incomodados com o excesso de barulho aos finais de semana.
De acordo com a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB), dois estabelecimentos foram fechados nas ruas 13 de maio e Conselheiro Carrão neste ano após fiscalização feita pelo Programa de Silêncio Urbano (PSIU). No mesmo período, a subprefeitura Sé informou que autorizou oito eventos na rua 13 de maio. Novas ações serão realizadas nos bares da região, segundo a administração.
Acostumado com a movimentação noturna do bairro, Yajima relata que a questão do barulho excessivo piorou nos últimos anos. "Não somos contra a vida noturna no Bixiga, mas tem que ter algum tipo de regulamentação."
Entre julho a setembro deste ano, a prefeitura recebeu 202 reclamações de perturbação do sossego de moradores da Bela Vista, quantidade semelhante ao mesmo período do ano passado, quando ocorreram 207 registros.
As queixas sobre perturbação do sossego cresceram 40% de 2015 a 2024, saltando de 31,5 mil para 43,9 mil registros, segundo dados oficiais da gestão municipal.
O volume de registros atingido no ano passado é o segundo maior da década analisada, superado por pouco pelos 45,3 mil chamados feitos em 2023, cujo mês de maio marca o encerramento da pandemia.
Neste ano, foram registrados 36,9 mil chamados de janeiro a setembro, valor que já corresponde a 84% do total dos registros de 2024.
O bairro de Pinheiros, na zona oeste, foi campeão de reclamações ao Psiu em 2024 com 929 registros.
