Com recorde de calor, áreas de SP ficam sem água e Sabesp alega aumento de consumo
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Em meio à onda de calor que levou à temperatura mais alta do ano na cidade de São Paulo nesta semana, bairros da capital paulista e de cidades da região metropolitana estão sem abastecimento regular de água. Há moradores que enfrentam problemas graves há mais de dez dias.
A Sabesp (Companhia de Saneamento Básico de São Paulo) atribui os problemas de abastecimento ao aumento de consumo de água pela população, provocado justamente pelas temperaturas acima da média na última semana. A empresa relata que houve uma alta de 60% no consumo nesta semana, mesmo com uma estimativa de que 30% da população esteja fora de casa durante as festas de fim de ano.
O problema de abastecimento é pior nas periferias da capital -especialmente nas regiões mais altas, onde a água só chega por meio de bombas hidráulicas- e cidades da região metropolitana.
Parte das questões ocorrem por causa do nível dos reservatórios, o mais baixo dos últimos dez anos. As represas que abastecem a região metropolitana operavam nesta sexta (26) com 26% da capacidade. Um ano atrás, tinham 48% do volume total.
Nas áreas mais altas do Butantã, zona oeste da capital, moradores relatam que desde terça-feira (23) o fluxo de água encanada é interrompido nas primeiras horas da manhã e só volta durante a madrugada. A população fica privada de banho, não consegue lavar roupas, e depende das caixas d'água para cumprir tarefas básicas. A falta de abastecimento significa até prejuízo financeiro para alguns.
A cabeleireira Elaine Cristina dos Santos, 47, só conseguiu trabalhar em três de sete dias na semana do Natal, que costuma ser uma das mais movimentadas do ano em seu pequeno salão no Jardim São Jorge, na zona oeste. Ela estima que tenha perdido mais de 20 clientes nesse período.
"Passei o Natal lavando o cabelo das clientes com [água em] garrafa de plástico. Perdi alguns atendimentos. Foi constrangedor", ela conta. A falta de abastecimento também estragou a ceia natalina da família, pois ninguém conseguiu tomar banho.
Ela conta que os problemas de abastecimento se intensificaram há pouco mais de dez dias. A água tem chegado nos canos da casa dela por volta das 5h, mas suja e com pressão baixa. O abastecimento costuma durar de cinco a seis horas, portanto ao meio-dia já não há mais água.
Ela não tem caixa d'água, então precisou ir até a casa da mãe para conseguir lavar roupas nesse período.
"Tenho quatro crianças dentro de casa. Tenho uma filha especial e uma criança adotiva com dermatite, que tem que ficar tomando banho direto porque ela coça muito a pele", relata Elaine. "Eu não sei o que fazer."
A cerca de 1,5 km dali, a aposentada Valeria dos Reis, 62, está com uma pilha de roupa suja para lavar da qual não consegue dar conta. Desde a última terça-feira, a casa dela no Jardim Paulo VI não recebe água encanada durante a maior parte do dia. Ela também ouviu de vizinhos que moram em áreas ainda mais altas do bairro que o abastecimento intermitente já dura quase duas semanas.
Sua situação só é amenizada porque ela tem uma caixa d'água e costuma fazer reúso para algumas tarefas, mas a torneira da sua lavanderia está desabastecida porque tem conexão direta com o encanamento que chega da rua. As roupas se acumulam e o espaço fica sujo por causa do cachorro.
Quando a água volta, entre a noite e a madruga, o problema é o contrário do que ocorre no bairro vizinho: chega com pressão forte e muito ar nos canos. "É mais ar do que água", ela conta.
Alguns bairros vizinhos e mais baixos do Butantã não vivem problemas de abastecimento. "Ontem [quinta] passei o dia inteiro sem água, mas só aqui em cima. Eu passei lá na rua na parte de baixo, e vi o pessoal tomando banho de mangueira", diz Valeria.
A Sabesp afirma que o aumento do consumo nas partes mais baixas da região metropolitana ajuda a explicar porque a água não tem chegado nas áreas mais altas. Além disso, as quedas de energia que atingiram a capital na primeira quinzena de dezembro também trouxeram reflexos à distribuição de água, já que as bombas hidráulicas que levam água ao bairros mais elevados são movidas a energia elétrica.
"Ao longo do último mês tivemos alguns percalços", diz a diretora de Relações Institucionais e Sustentabilidade da Sabesp, Samanta Souza, citando as quedas de energia e o aumento do consumo na última semana.
A companhia tem orientado a população a economizar o uso da água, evitando lavar carros e calçadas, encher piscinas ou utilizar água para fins não essenciais. A prioridade deve ser para atividades básicas como alimentação e higiene pessoal. "É preciso que o consumo se estabilize na base das cidades para que o topo, o alto da montanha, possa receber também a água na pressão adequada."
Em agosto, por determinação da Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo) e da SP Águas, a empresa passou a diminuir a pressão da água no encanamento de toda a região metropolitana de São Paulo por oito horas no período noturno, para tentar reduzir o volume retirado dos reservatórios da região.
Segundo Samanta, a companhia suspendeu a redução de pressão noturna em regiões periféricas da Grande São Paulo para que os bairros mais altos não fossem ainda mais prejudicados pela falta d'água.
Há expectativa é que ocorra um aumento das chuvas a partir da próxima semana, mas a tendência para a temporada é de um verão mais seco do que a média histórica, segundo prognóstico do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia).
Como mostrou a Folha de S.Paulo em outubro, a Sabesp bateu recorde de retirada de água do sistema metropolitano em 2025, superando a média dos últimos oito anos e ultrapassando até mesmo o volume subtraído durante os anos pré-crise hídrica paulista de 2014, segundo técnicos do IAS (Instituto Água e Saneamento).
A companhia afirmou, à época, que o aumento da retirada se deve ao crescimento da população atendida e a ajustes operacionais.
