Ultraje, desnecess?rio, a Rigor

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Ultraje, desnecess?rio, a Rigor
Leon Cleveland 6/04/2015

Ultraje, desnecessário, a Rigor

Olá novamente, internautas, fãs e entusiastas do maravilhoso mundo dos games. Primeiramente peço desculpas pelo atraso. Acabei passando umas noites no hospital e não consegui trazer a coluna a tempo. Hoje traria uma resenha do mais novo game Hidetaki Miyazaki, o dificílimo Bloodborne, mas um outro sério assunto me instigou a escrever a coluna desta semana.

Imagine a seguinte situação: Um dono de restaurante chama alguém famoso para fazer o prato principal da noite, só que esse alguém não entende bulhufas de gastronomia, mas, mesmo assim, topa o "desafio" e entrega uma comida intragável. Então, quando seus clientes reclamam da comida, o convidado famoso xinga todos os presentes de burro por terem aceitado vir ao restaurante e ainda briga com um outro chef que estava ali, só porque tentou dar um "toque" positivo, uma crítica construtiva, para que não aconteça de novo. Situação chata, não é? Então fiquem com essa cena na cabeça e vamos lá.

Talvez seja do conhecimento de vocês de que o músico Roger, da banda Ultraje à Rigor, tenha participado da dublagem de Battlefied: Hardline (lançado pela EA, distribuído pela Warner aqui no Brasil), emprestando a voz para Nick Mendoza – personagem principal do jogo. Quando soube disto, fiquei cético, mas com quarenta e dois pés atrás. O som dos caras não é bem a minha praia, gosto de uma ou duas músicas só, mas quem sabe não havia um talento escondido ali. Então, me dei o benefício da dúvida, preferindo esperar o jogo sair para ver como aquilo ficaria, mas uma vozinha falava lá no cantinho mais escuro da minha mente: "isso vai ser horrível".

Aí o jogo saiu.

O meu instinto estava certo: A dublagem de Roger foi um desastre de carro daqueles bem feios mesmo.

(Infelizmente?)O marketing tem dessas de colocar alguém famoso para alavancar as vendas de produtos, ou pelo menos atrair as pessoas, tornando o produto mais visível. Não gosto de ficar em achismos aqui, mas eu sou capaz de jurar que Monange só vende bem por causa da Xuxa. Ora, no próprio Battlefied: Hardline, o apresentador Marcelo Resende fez publicidade, como se fosse um daqueles programas jornalísticos sensacionalistas que ele apresenta. Tudo a ver, afinal, Battlefied: Hardline tem a temática "polícia e ladrão", com jogadores escolhendo um dos dois lados, enquanto se enfrentam nos mais diversos modos. Ainda teve um "corta pra mim" para deixar todo mundo rindo a toa.

O problema é que com dublagem estamos lidando com uma parte crucial dos games. A partir do momento em que o game não contará com a opção de troca de línguas, a pessoa fica obrigada a encarar a dublagem horrorosa que Roger nos deu. Dublagem não é só ficar em frente a um microfone, sentado numa cadeirinha, falando frases. Dublagem é interpretação, antes de tudo. É atuação sem corpo, só com a voz. É passar uma sensação e/ou emoção, tal qual um ator faria num palco. E Roger falhou miseravelmente nesse aspecto, é claro. Ele não é ator, nem dublador e nem nunca dublou ou atuou na sua vida. Era de se esperar que fosse ruim. E como se não bastasse, Roger parece não aceitar muito bem críticas, xingando pessoas que compraram o game – e criticaram-no – de burros por não saberem inglês. Xingou até mesmo Guilherme Briggs (dublador de inúmero filmes e personagens de desenho animado, como Cosmo de Padrinhos Mágicos, ELE das Meninas Super Poderosas e o Samurai Jack, do desenho homônimo), um monstro da dublagem e direção de dublagem aqui no Brasil.

Esse é o preço que se paga pela publicidade mal estudada e pessimamente executada. O game teve visibilidade? Ô se teve. Não do jeito certo, do jeito pretendido. A Warner pode ser declarada a "grande culpada" por esse fiasco, afinal, a ideia de chamar o cara foi dela. Oras, Battlefield 4 contou com as vozes de DOIS atores, André Ramiro (Tropa de Elite) e Dan Stulbach. Gente famosa, atores, que sabem fazer dublagem. Roger, apesar de mais parecer uma vítima da ocasião, tem sua parcela de culpa, ao ter aceitado um trabalho que não tinha habilidade nenhuma. Naquela situação do restaurante, no papel do dono, você chamaria alguém sem habilidade? E no papel do famoso convidado, você aceitaria?

O pior de tudo é que quem sai perdendo é quem não pode mudar isso. É quem consome o produto final; a dublagem fanha, sem sal, insossa e muito, muito estranha do Roger. E apertem os cintos, leitores, pois em Mortal Kombat X, Pitty dublará um personagem também e, desta vez, eu tenho certeza que teremos uma dublagem tão ou mais ridícula que a do Roger. A situação se complica ainda mais, Warner do Brasil...

Só me resta parafrasear o próprio Roger: "Inútil! A gente somos inútil".


Leon Cleveland é formado em Comunicação Social pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora. É fã de desenhos animados, mitologias, heavy metal, culinária, gastronomia, bacon e é completamente apaixonado por games. Tão apaixonado que sua Tese de Conclusão de Curso foi "O uso da Linguagem Cinematográfica nos Games". Já escreveu para várias publicações, analógicas e digitais, sobre o assunto e planeja se especializar na recente área de "Crítica de Videogames".