Horta Comunitária Sebastião Duque é inaugurada em Benfica 

Nome do Colunista Angeliza Lopes 18/01/2019

As vivências em coletivo nos transformam em ferramentas engrenadas para a construção da cidadania, tão fundamental para cidades saudáveis e sustentáveis. Essa frase ilustra bem a história que vou contar no primeiro texto da coluna Pensar Sustentável que estreio no Portal ACESSA.com. Vou relatar, com a ajuda dos seus personagens, como um gesto, que a princípio parecia uma utopia, interferiu de forma positiva na vida de um conjunto de pessoas na região Norte de Juiz de Fora.

Os primeiros passos dessa história iniciaram há seis meses e seu primeiro resultado será apresentado neste sábado, 19 de janeiro, às 9h, quando acontece a inauguração da primeira Horta Comunitária de Juiz de Fora dentro de uma faixa de domínio da linha férrea, na Rua Evaristo Veiga, no bairro Benfica. A área de 1.000 m2, isolada da ferrovia, é margem de segurança gerida pela empresa MRS Logística.

História

Na última quarta, 16, peguei a linha 717, sentido bairro Benfica para conhecer a horta do José Maria Tomaz e do Arimateia Neves. O sol já estava rachando, mas o clima era agradável quando me deparei com tamanha área toda cercada e vários canteiros de horta cheios de mudinhas já desenvolvidas de Alface, Almeirão, Couve, Cebolinha, Jiló e Quiabo. Também vi os canteiros de jardim, tudo muito novinho e bem cuidado. Fui direto no Zé Maria, que me cumprimentou. - Não liga não, minhas mãos estão cheias de terra, pode lavar sua mão ali na água, apontando para a caixa d’água que abastece os regadores e garrafas usadas para aguar as plantas. Mal sabe ele que adoro ficar com a mão cheia de terra. Este não era um problema.

Ao me relatar todo o desenrolar do projeto, Zé Maria gesticulava e demonstrava um sentimento particular por tudo aquilo. “Há seis meses me dedico a esta horta, deixo compromissos pessoais para cuidar daqui”. Mas, como começou tudo isso? Pergunto ao Zé. Ele me diz que foi reclamando na página e grupos no Facebook. “Sempre mostrava nas páginas do Facebook a situação da linha férrea. Não culpo a empresa, mas as pessoas continuavam abusando da área, descartando entulhos de obra e lixo de forma irregular. A empresa vinha, limpava, e um mês depois estava tudo sujo de novo”.

As reclamações nas redes sociais surtiram efeito, já que a analista de relações institucionais da MRS, Tathiane Miranda, entrou em contato com o morador para conversarem sobre o problema. “Vimos a postagem dele e decidimos entrar em contato. Percebemos que ele era uma pessoa atuante na comunidade de Benfica e entorno. Fizemos uma reunião com ele e a Associação de Pró-Melhoramento do Bairro. Depois de sermos apresentados ao projeto da horta, resolvemos abraça-la”, conta Tathiane.

Mesmo inédita para a MRS, e em Minas Gerais, a ideia de implantar horta na faixa de domínio de ferrovias já é algo realizado por outra empresa no Brasil. A Rumo Logística já aplica este modelo de parceria público-privada em outros Estados do Sul do país, como Santa Catarina (clique aqui) e Paraná (clique aqui).

Limpeza

Fechado o acordo para a criação da Horta Sebastião Duque, em homenagem ao ‘Tião Duque da Feira Livre’ - vou contar esta história mais a frente; a empresa custeou o cercamento da área para proteção do projeto e segurança ferroviária, vedando a linha através de telas de arame. Também foram doadas cerca de mil mudas, tintas, a caixa d’água, 600 blocos de cimento e uma tenda. Ao todo, foram investidos R$ 30 mil na iniciativa.

O especialista ferroviário, Paulo Sérgio Pereira, conta que o trecho era crítico devido à facilidade que as pessoas tinham para descartar o lixo no local. “O volume era grande. A cada 30 dias a gente retirava mais de 200 metros cúbicos de entulho. Parece muito, mas a nossa última empreitada superou! Tiramos 300 metros cúbicos, o que representa 60 caçambas. Ao vermos a área agora como está, ficamos impressionados e felizes”, relata.

Braço Direito

Braço direito na empreitada, como diz Zé Maria, Arimeteia Neves também não mede esforços para tornar a Horta um projeto para o usufruto de toda a comunidade. “Tenho uma loja de material de construção aqui do lado e meus clientes sempre me questionavam sobre a condição desta área. Quando Zé me chamou, fui de pronto ajudar. Tenho muita amizade em Benfica. Conversando com alguns amigos que estavam aterrando um lote, ofereci que jogassem na horta a terra preta que estavam tirando, trouxe máquinas para acertar o terreno e o vereador Kennedy doou o esterco. Depois que fizemos isso tudo, não vi ninguém mais jogando lixo aqui”.

Arimateia, que desde a infância teve contato com a terra, sabe o seu valor para as crianças do bairro. Ele já chama a atenção para vontade que tem de fazer parcerias com as Escolas Estaduais Professor Lopes e Ana Sales. “Vamos ensinar essas crianças a plantar, ter contato com a terra e dar mudas para que elas aprendam a cuidar. Queremos que elas fiquem perto da gente e longe das ruas”.

Enquanto fazia a entrevista, dois jovens ajudavam na manutenção dos canteiros. Em determinado momento um deles falou com o Zé - Vamos só ali beber uma água, ainda não vamos almoçar, está cedo e dá para adiantar mais!. “Sempre colocamos no Facebook que precisamos de voluntários e eles aparecem. Vejo que as pessoas estão cuidando, de fato, dessa área. Se sentem responsáveis por sua preservação”, diz Arimateia.

Tudo orgânico

Ao ser questionado quanto ao custo para manutenção da horta, Zé Maria enfatiza que é tudo de graça. “Pego o resto das verduras e legumes produzido durante a Feira de Benfica e trago para cá. Misturo com a terra, calcário, esterco. Vira compostagem o que seria jogado no aterro da cidade. Agora damos de graça o que é nos dado de graça pela terra. Toda a produção será doada e é orgânica!”, destaca.

Entre 30 e 40 dias as hortaliças e legumes estarão no ponto para colheita, momento que os voluntários deverão separar, lavar e embalar para a doação. “Vamos priorizar, inicialmente, doar para escolas, creches, instituições de caridade e de recuperação de dependentes químicos, depois faremos o cadastro das famílias carentes”, explica o idealizador.

Outra ideia que pretendem implementar é um Sopão Solidário no futuro. “Vamos fazer um quartinho com os blocos doados pela MRS para separação das doações e um fogão à lenha, tudo rústico, para produzir a comida”, já imagina Zé.

Tião Duque da Feira Livre

Senhor Tião Duque da Feira, que faleceu há poucos meses, foi personalidade solidária do bairro. Conhecido por anunciar na feira, sempre que apareciam pessoas precisando de um remédio ou doações ele falava no microfone e todos se mobilizavam para ajudar. “Hoje sua filha dá continuidade ao trabalho que ele fazia. Sr. Tião queria estar aqui na inauguração da horta, mas, infelizmente, teve um problema de saúde e faleceu antes, por isso decidimos fazer justa homenagem colocando seu nome aqui”, conta Zé Maria.

Veja entrevista em vídeo do Zé Maria no IGTV no Instagram da ACESSA.com (clique aqui)

Expansão do projeto

O projeto da horta comunitária nas margens da linha férrea já é uma proposta vista como solução para outras áreas críticas da cidade. Tathiane Miranda afirma que a MRS estuda áreas em outros bairros. “Outros pontos, que como aqui, são pontos de descarte irregular. Queremos que estas áreas se tornem espaços que a comunidade tenha prazer em preservar. Depois da inauguração da Horta de Benfica tenho certeza que outras Associações de Pró-Melhoramento e voluntários vão nos procurar”.

Coluna Pensar Sustentável

Quer entender melhor o objetivo desta coluna e as pautas que serão tratadas nas próximas edições? Acompanhe a gente também no Instagram @pensarsustentavel. Vou postar vídeos com mais no Storie e no IGTV.

Obrigada pela companhia e até logo!

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