Ailton Alves Ailton Alves 1/6/2009

Os confins do atrevimento

Chuvendo bola no campo do Sport, que foi goleado pelo TupiConforme uma previsão escrita há seis mil anos, o Tupi goleou o Sport por 6 a 0 com a tranquilidade de quem come pipoca no cinema. Esse atrevimento dos Periquitos em achar que poderiam não ser massacrados pelos Carijós é coisa de jovens, ou de alguém que pensa de forma juvenil lá pelas bandas da Avenida. É normal. Só os jovens, quando jovens, colocam algumas idéias malucas na cabeça. Acham, por exemplo, que podem dirigir um carro a 100 km por hora ou passar boa parte da vida sem ouvir os mais velhos.

Agora, desastre consumado, não adianta colocar a culpa em variantes diversas: time muito jovem, ainda em formação, duas partidas em menos de 24 horas, campo de dimensões gigantescas, nada disso. A história é escrita, desde sempre, pelos vencedores. E estará nos almanaques, para júbilo dos adeptos do clube de Santa Terezinha, que em 31 de maio do ano da Graça de 2009 o Tupi rebaixou o Sport a mero coadjuvante na festa da cidade.

Exatamente como aconteceu há quase 21 anos, quando o Sport cravou no Tupi, como se fosse uma marca bordada a ferro e fogo, um 2 a 0, justamente na inauguração do Estádio Municipal Radialista Mário Helênio - um templo que com o passar do tempo e as consequências históricas passou a ser a casa alvinegra, nunca verde ou vermelha. Nós, Carijós, passamos todos esses anos tentando explicar que jogamos com um time reserva, recheado de ex-jogadores, já que o time titular tinha compromissos oficiais fora da cidade e usando outros argumentos, mais ou menos apaixonados. De nada adiantou. Como disse: a história, desde que o mundo é mundo, é escrita pelos vencedores.

Mas... o jogo deste domingo teve uma atmosfera bastante diferente daquela partida de duas décadas atrás. Principalmente porque muito pouca gente foi prestigiar o confronto - afinal, não havia a presença de clubes cariocas. Estavam lá alguns adeptos do Sport, reunidos em torno da torcida organizada Inferno Verde, o pessoal das facções Carijós e outros, os independentes, espalhados nas cadeiras aos pés das cabines de rádio. Nós, os torcedores do Tupi, estamos acostumados com isso e se fosse permitido um conselho aos moços do Sport: resistam, sigam em frente mas nunca esqueçam que a cidade vira sistematicamente as costas para os clubes da cidade.

Depois, havia o bolor de uma rivalidade adormecida. Talvez não haja paralelos na história do futebol brasileiro essa realidade: dois clubes de uma mesma cidade sem medir forças, mantidos à distância, por inacreditáveis quase duas décadas. Talvez tenha sido por isso que o Tupi tenha buscado tantos gols, e achado um por cada 3 anos e meio de ausência. E talvez tenha sido por isso que o Sport mergulhou até os confins do atrevimento.

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No final da festa, o técnico do Sport, Renato dos Santos destoou do discurso de todos, sobre a importância do jogo, placar a parte. Em entrevista a uma emissora de radio, ele criticou o próprio clube, diminuiu o triunfo legítimo do adversário e atacou de forma bastante dura o árbitro da partida. Ou seja, atravessou os confins do atrevimento e chegou às raias da injustiça.



Ailton Alves é jornalista e cronista esportivo
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