Fernando Agra Fernando Agra 14/11/2008


Crise financeira: breve discuss?o

Ilustra??o: ACESSA.com/Laura Martins Ferreira. Ilustra??o de notas de dinheiro voando

Ultimamente s? se fala na crise financeira mundial. Tem sido uma enxurrada de not?cias em todos os ve?culos de comunica??o. Mesmo quem n?o entende do assunto emite algum tipo de opini?o. Mas o que realmente causou essa crise? Por que tanta preocupa??o? Por que tanto p?nico nas Bolsas de Valores? Quais as poss?veis implica?es no nosso dia-a-dia? Quando a mesma terminar??

Essas s?o quest?es que n?o querem calar. Ao iniciar pelas causas da crise, podem-se relembrar os ataques ao World Trade Center, em 11 de setembro de 2001. A destrui??o das torres g?meas atingiu em cheio o ?cora??o? financeiro mundial. O templo do sistema capitalista foi abalado. O medo de novos ataques terroristas a grandes empresas ampliou o clima de incertezas no mundo.

Muitos se perguntavam: quais ser?o os pr?ximos alvos? E na economia, quando o clima de incerteza se instaura, os agentes econ?micos tendem a ser parcimoniosos, ou seja, passam a tomar decis?es com mais cautela, como dizia o John Maynard Keynes, um dos mais importantes economistas do s?culo XX. As id?ias de Keynes contribu?ram para salvar o sistema capitalista da Grande Depress?o de 1929. Quem quiser conhecer um pouco mais desse economista, poder? consultar sua obra mais importante, ?Teoria Geral do Juro, do Emprego e da Moeda?, publicada em 1936.

Ao retomar a discuss?o para 11 de setembro de 2001, destaca-se que o medo do futuro levou acionistas a ampliarem a oferta de venda de suas a?es nas Bolsas Valores. Muitos se questionavam se grandes empresas corriam o risco de sofrerem atentados semelhantes aos das torres g?meas. E como se sabe, a a??o ? uma parte da empresa. O detentor da mesma ? s?cio (mesmo que minorit?rio) da empresa. Caso a empresa venha a ser destru?da por terroristas, sua a??o pode passar a n?o valer quase nada. Com isso, ? melhor se desfazer das mesmas desde ent?o, pois n?o se sabia ao certo quais eram os planos dos terroristas naquela ?poca.

Esse pensamento generalizado macroeconomicamente ampliou as vendas de a?es nas Bolsas e de acordo com a velha e conhecida Lei da Oferta e da Procura, o excesso de oferta de a?es fez com que suas cota?es despencassem no mundo todo. E a? surge uma quest?o: mas se o ataque terrorista foi nos EUA, por que a Bovespa (Bolsa de Valores de S?o Paulo) tamb?m se desvalorizou? Hoje em dia, com o atual processo de globaliza??o fruto do desenvolvimento tecnol?gico da microinform?tica, os indiv?duos podem aplicar seus recursos financeiros em qualquer lugar do mundo, em tempo real.

Isso quer dizer que quem aplicou na Bolsa de Valores nos EUA e viu suas a?es despencarem, resolveu sacar o que tamb?m havia aplicado na Bovespa para auferir os lucros obtidos at? ent?o no Brasil e cobrir parte dos preju?zos realizado nos EUA. Novamente, esse racioc?nio ? extrapolado, de modo agregado, e afeta todas as Bolsas do Mundo, como tem acontecido com a atual crise financeira.

Como j? foi dito anteriormente, a desvaloriza??o das a?es empobrece as pessoas que aplicaram seus recursos na Bolsa. Com menor riqueza, as pessoas diminuem a capacidade de consumir. Associado a isso, o medo do futuro ainda faz as pessoas gastarem menos no presente. Isso diminuiu a demanda agregada da economia. Com menor demanda, as empresas vendem menos, deixam de contratar e at? demitem trabalhadores.

O desemprego aumenta e o consumo cai mais ainda. ? um clico vicioso que precisa ser rompido com interven??o governamental at? que uma recess?o (queda do n?vel de atividade da economia por dois trimestres seguidos, de acordo com manuais de economia) se transforme numa depress?o econ?mica (agravamento da recess?o por longo per?odo de tempo e com quedas bruscas e cont?nuas do n?vel de atividade econ?mica).

Para evitar tal situa??o, o governo dos EUA utilizou, j? em 2001, uma pol?tica monet?ria expansionista, ou seja, ampliou a liquidez (quantidade de dinheiro) na economia. Vale ressaltar que a taxa de juros ? o pre?o da moeda, ou seja, quando h? um excesso de liquidez (de moeda) na economia, as taxas de juros caem. Essa era a inten??o das autoridades ao ampliarem a oferta de moedas na economia. Pois juros menores podem estimular a demanda agregada, sobretudo nos itens de consumo e investimentos. Juros mais baixos significam presta?es mais baixas.

Quem geralmente compra de modo parcelado ter? um estimulo a consumir mais. Juros menores tamb?m viabilizam projetos de investimentos empresariais. Tudo isso, de um modo geral estimula o n?vel de atividade na economia para que a mesma volte a crescer.

Ilustra??o: ACESSA.com/Laura Martins Ferreira. Ilustra??o de notas de dinheiro E tem mais, o governo dos EUA ampliou a oferta de cr?ditos para quem quisesse comprar um im?vel. E para facilitar ainda mais, n?o estipulou muitas exig?ncias e nem muitas garantias para a concess?o desse cr?dito, conhecido como subprime (de elevado risco). Muitas pessoas passaram a demandar mais im?veis e isso fez com que o pre?o dos mesmos aumentasse consideravelmente.

Nos EUA, a pr?tica da hipoteca ? comum, ou seja, o indiv?duo que possu?a um im?vel cujo valor era US$ 50 mil poderia pegar os mesmos US$ 50 mil d?lares em empr?stimos e dar o seu im?vel como garantia, por exemplo. Como a demanda por im?vel subiu mais do que a oferta dos mesmos, esse im?vel passou a valer US$ 80 mil, por exemplo. Com isso, aquele indiv?duo poderia pegar um empr?stimo adicional de US$ 30 mil. De um modo geral, foi isso que aconteceu no setor imobili?rio nos EUA.

Acontece que o aquecimento da demanda agregada ampliou a infla??o na economia. E preocupado em n?o perder o controle do n?vel de pre?os, o governo voltou a subir a taxa de juros. Vale lembrar que juros altos tornam o cr?dito mais caro e desestimula o consumo e o investimento produtivo. Com juros mais altos, as parcelas p?s-fixadas (variam de acordo com os juros futuros) das pessoas que pegaram empr?stimos ficaram mais altas. Muitas pessoas n?o conseguiram pagar as hipotecas de seus im?veis e ficaram inadimplentes.

Com isso, o banco poderia pegar o im?vel como garantia. Aconteceu que os juros mais altos diminu?ram a demanda por im?veis tamb?m. Com isso, o pre?o dos im?veis caiu. Ent?o, aquele indiv?duo que devia US$ 80 mil e n?o conseguia mais pagar a presta??o da hipoteca que havia subido, viu o pre?o do seu im?vel cair e mesmo que entregasse o pr?prio im?vel para o banco ainda ficaria a dever, pois seu im?vel passara a valer menos de US$ 80 mil.

Al?m disso, os bancos haviam transformado as hipotecas em t?tulos e lan?ado no mercado. Tanto os bancos quantos outros agentes econ?micos detentores desses t?tulos ficaram sem receber dos clientes inadimplentes. Mesmo as institui?es financeiras que pegaram os im?veis dos seus clientes n?o conseguiram vender os mesmos, pois n?o havia demanda. Isso quebrou uma s?rie de bancos, como a m?dia mostrou ao longo desse ano de 2008.

A fal?ncia desses bancos (muitos deles eram considerados ?grandes? institui?es financeiras) mostrou qu?o fr?gil era o sistema financeiro nos EUA. A quebradeira desses bancos diminuiu a liquidez no sistema. Muitas institui?es que ainda tinham dinheiro em caixa preferiram diminuir os empr?stimos com receio de calotes. E como se sabe, o dinheiro ? o lubrificante do sistema econ?mico. A escassez do mesmo trava a engrenagem da economia. Com menos moeda em circula??o, o pre?o dela sobe, ou seja, os juros sobrem. Juros altos tornam o cr?dito mais caro e diminui a demanda por consumo e por investimentos produtivos. Com menos consumo, as empresas vendem menos e conseq?entemente investem menos.

Com isso, o desemprego aumenta e o consumo cai mais ainda, conforme o explicado no in?cio do texto. E o que isso tem a ver com as Bolsas de Valores? Tudo! Uma a??o de uma empresa representa o fundamento econ?mico atual da pr?pria empresa, bem como as expectativas de valoriza??o (ou desvaloriza??o) da mesma ao longo do tempo.

No caso dos EUA, o consumo das fam?lias ? o principal item na demanda agregada (uma das maneiras de se medir o PIB). A diminui??o do pr?prio consumo faz com que as empresas vendam e lucrem menos. Com lucros menores, as perspectivas quanto ? valoriza??o das a?es dessas empresas diminui. Com isso, os agentes econ?micos que det?m a?es tendem a se desfazer das mesmas no presente e buscar alternativas mais rent?veis para seus recursos financeiros.

Ao pensar assim, de modo agregado, os agentes econ?micos ampliam as vendas de suas a?es j? no presente e faz com que o pre?o das mesmas despenque. A pr?pria queda das a?es empobrece os detentores das mesmas, que com isso, diminuir?o ainda mais o consumo na economia e a crise d? sinais de que ? s?ria.


Fernando Ant?nio Agra Santos ? Economista pela UFAL (Universidade Federal de Alagoas), Doutor em Economia Aplicada pela Universidade Federal de Vi?osa (UFV) e professor universit?rio das faculdades Vianna J?nior, Est?cio de S? e Universo e do curso de Forma??o Gerencial do Instituto Educacional Machado Sobrinho, sendo todas a institui?es em Juiz de Fora - MG.

Sobre quais temas (da ?rea de economia) voc? quer ler novos artigos nesta se??o? O economista Fernando Agra aguarda suas sugest?es no e-mail negocios_economia@acessa.com.