SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Parece roteiro de ficção (quem viu Succession, da HBO, talvez veja semelhanças), mas não é.

Em ação judicial apresentada há uma semana à Justiça de Nova York, Alberto Safra, bilionário herdeiro da família de banqueiros, diz ter sido vítima de uma manipulação encabeçada por dois de seus irmãos para que perdesse força e participação na holding que controla o Safra National Bank, nos Estados Unidos, a SNBNY.

O banco, que não tem relação com o banco Safra no Brasil, administra US$ 9 bilhões (cerca de R$ 46,5 bilhões) em ativos. A sede em Nova York fica na 5ª Avenida, em Manhattan, frequentemente lembrada pelas lojas de luxo e por atrações turísticas.

No processo, Alberto diz que o banco mudou seus parâmetros contábeis para inflar o valor do Safra National Bank em mais de US$ 870 milhões (cerca de R$ 4,50 bilhões), manobra que teria permitido a emissão de novas ações distribuídas somente para Jacob e David.

A operação teria resultado na redução da participação acionária de Alberto na instituição, de 28% para 13,48%. Até 2019, quando a operação foi realizada, cada um dos três herdeiros que atuavam nos negócios da família Safra tinham 28% das ações. Outra irmã, que não estava envolvida com as atividades, tinha 16%.

Com as novas ações emitidas em dezembro de 2019, Jacob e David passaram a ter, cada um, 39,4% de ações. A irmã passou a ter, então, 7,7%. Em maio de 2020, parte das ações dos dois irmãos (chamadas de ações classe B) foram transferidas para a irmã, que voltou a ter 16% de participação. Jacob e David passaram a ter 35,26% cada um.

"As transações não tinham qualquer propósito econômico legítimo ou lógica de negócio, e não resultaram em benefícios ao SNBNY ou suas subsidiárias. O único efeito dessas transações foi diluir a participação de Alberto no SNBNY e inflar as participações de seus irmãos, David e Jacob, sem que eles (ou ninguém) tenham investido qualquer capital adicional", escrevem os representantes de Alberto no processo.

Isso tudo teria acontecido, segundo o herdeiro na ação, quando o patriarca, Joseph Safra (que morreu em dezembro de 2020), estava gravemente debilitado. "David e Jacob se aproveitaram da condição de Joseph para influenciá-lo indevidamente e para obter sua suposta aprovação para as medidas corporativas hostis a Alberto", diz a petição no processo.

Além dos irmãos, Alberto também processa a mãe, Vicky, e três diretores do SNBNY, Carlos Alberto Vieira, Carlos Cesar Bertaco Bomfim e Simoni Passos Morato. Todos, segundo o pedido de Alberto Safra, teriam cometido atos de prevaricação para prejudicar seus interesses no banco.

A família, segundo Alberto afirma no processo, alega que as mudanças de resoluções que permitiram a diluição de sua participação acionária teriam ocorrido com o consentimento de Joseph. Seriam uma resposta à insatisfação do patriarca com filho.

Para Alberto, porém, o pai, àquela altura, não teria condições de decidir e aprovar ou o teria feito sob influência dos demais. O aumento da participação acionária de Jacob e David também afetou o volume de ações da irmã.

Segundo os advogados de Alberto, a diluição da participação da irmã demonstra "que David e Jacob estavam apenas se aproveitando da condição debilitada de Joseph para consolidar suas participações, forçando mudanças que o pai jamais teria aprovado se estivesse sob juízo perfeito."

O bilionário pede à Suprema Corte do Estado de Nova York a restauração de sua participação acionária até o percentual de 28% e o reconhecimento de seu direito de indicar um diretor ao conselho do banco. Segundo ele, a gestão do banco recusou seguidamente aprovar a indicação a que teria direito como acionista.

Na ação apresentada no dia 3 de fevereiro, ele questiona ainda o atraso na divulgação da reavaliação contábil que permitiu o aumento da participação societária dos irmãos. Ocorrida em 2019, a operação só teria aparecido nos balanços em junho de 2021.

"Este atraso levanta mais questões sobre se o aumento inexplicável na receita pode ter sido uma manobra contábil", diz o processo. A petição encaminhada à Justiça de Nova York aponta também a existência de "inexplicáveis inconsistências" entre os arquivamentos registrados nos Estados Unidos e os enviados a Gibraltar (onde a holding está sediada).

O pano de fundo da briga pela participação societária no Safra de Nova York é a disputa iniciada pelos irmãos ainda antes da morte do patriarca.

Alberto e David dividiram o comando do Safra no Brasil até 2019, quando o primeiro deixou o banco e fundou o ASA Investments sob rumores de que ambos teriam se desentendido. De saída, Alberto levou para o ASA executivos do Safra, o que teria desagradado o pai, que acabou deserdando-o.

O outro irmão citado no processo, Jacob, comanda os negócios internacionais da família, como ativos imobiliários e o banco Sarassin, na Suíça.

Em nota, a família Safra não comenta as acusações feitas pelo herdeiro em relação às operações contábeis realizadas no fim de 2019, mas refuta as alegações. No comunicado divulgado nesta terça, a família diz lamentar o caminho adotado por Alberto.

Veja a nota na íntegra:

"Poucos meses após receber doação do sr. Joseph, como antecipação de sua herança, Alberto deixou o Banco Safra, sem atender aos apelos feitos pessoalmente pelo seu pai e iniciou negócio concorrente ao Banco Safra, tendo, inclusive, assediado e contratado vários executivos do grupo.

Nessa ocasião sr. Joseph conversou com diversos executivos solicitando que não acompanhassem Alberto em sua empreitada, já que se tratava de uma afronta a ele próprio. Após diversas recusas de Alberto de mudar seus planos, sr. Joseph o deserdou e tomou medidas naquele momento.

Agora Alberto promove disputa contra toda a família, dizendo que o pai não teria motivos para fazer o que fez, alegando tratar-se de uma conspiração para prejudicá-lo. A família lamenta o caminho adotado por Alberto, que primeiro atentou contra o pai em vida e agora o faz contra sua memória, e refuta suas alegações."


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