Nesta segunda-feira (20), como parte de uma política de reparação, é celebrado o Dia da Consciência Negra. Esta data, instituída oficialmente pela lei nº 12.519, faz referência à morte de Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares, situado entre os estados de Alagoas e Pernambuco, na região Nordeste do Brasil.

Mesmo com a criação da data e políticas voltadas para este reparo histórico, o Brasil está entre os países mais racistas do mundo. Os registros de racismo cresceram mais de 50% no Brasil em 2022, em comparação com o ano anterior, segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

Sobre isso, Tamiris Melo, professora de direito da Estácio, destaca que expressões racistas ainda permeiam diversas esferas do cotidiano, desde discursos comuns até a presença na mídia e em instituições. Identificar e compreender essas expressões tornam-se cruciais para um enfrentamento eficaz. “É necessário utilizar o Dia da Consciência Negra como um momento de reflexão coletiva, não apenas para relembrar as lutas do passado, mas também para analisar criticamente o presente e construir um futuro mais inclusivo”, enfatiza.

FOTO: Arquivo pessoal - Advogada do Núcleo de Práticas Jurídicas da Estácio Tamires Oliveira

A docente comenta que alguns termos e expressões da sociedade carregam falas racistas e precisam ser abolidas ou substituídas do vocabulário. “Expressões como ‘mulata’, ‘não sou tuas negras’, ‘nasceu com um pé na cozinha’, ‘amanhã é dia de branco’, ‘denegrir’, ‘inveja branca’, ‘a coisa tá preta’, ‘meia tigela’, ‘doméstica’, ‘nhaca’, ‘criado-mudo’ e tantas outras expressões precisam sair do nosso vocabulário. A fala também pode ser uma ferramenta importante para o combate contra o racismo”, explica.

Tamires ainda explica que mesmo se uma pessoa se desculpar pelo ato racista ao chamar uma pessoa negra por essas expressões, ela passará pelas punições previstas em lei e caracterizadas por injúria racial: "O que a gente precisa entender é que hoje injúrias raciais são crimes e eles [indivíduos que cometeram racismo] são punidos com prisão. Inclusive, o crime de racismo é um crime inafiançável. Então, independente da pessoa se retratar ou não, ela precisa ser penalizada para que ela possa se avaliar. [...] Hoje em dia, as leis têm evoluído e a compreensão social também, então mesmo que ela se justifique, e possa tentar se retratar, ela pode ser responsabilizada cível e criminalmente pela sua conduta danosa e racista."

Dentro desse contexto, a professora destaca algumas soluções essenciais: “Primeiramente, a implementação de uma educação antirracista desde cedo, promovendo a compreensão da diversidade e a desconstrução de estereótipos. O empoderamento e a representatividade negra em todos os setores da sociedade também são cruciais, desde a mídia até o mercado de trabalho e a política”, orienta Tamiris.

Além disso, ela enfatiza a importância de promover um diálogo aberto sobre o racismo, incentivando a conscientização e o combate às expressões racistas, tanto individuais quanto coletivamente. “É necessário ter políticas públicas efetivas que abordem as desigualdades raciais, evoluindo para uma sociedade mais justa e igualitária”, destaca.

O Dia da Consciência Negra, segundo Tamiris, torna-se não apenas um dia de reflexão, mas uma oportunidade para contribuir ativamente na desconstrução de expressões racistas e na construção de uma sociedade verdadeiramente inclusiva e justa.

É preciso repensar as atitudes e as falas

As expressões racistas, muitas vezes, são encaradas com uma dualidade que nos leva a questionar a sua gravidade. "Nós estamos tão acostumados a ela que as pessoas falam – ah, isso é racismo mesmo? Mas é uma coisa tão simples, por que a gente tem que pensar sobre isso?", destaca a advogada do Núcleo de Práticas Juridicas da Estácio Juiz de Fora, Tamires Oliveira.

"A realidade é que, para identificar esses termos, é necessário que a gente tenha um olhar atento para a realidade e também é necessário que a gente consiga se reavaliar. Então, esse ponto de reavaliação também é muito difícil", continua a advogada. "Para a gente poder identificar, a gente precisa pensar sobre as expressões que a gente vem reproduzindo. Pinhaca, mulata, negro do cabelo duro... São diversas ações que a gente reproduz com um tom pejorativo sem pensar que isso pode trazer um prejuízo a alguém."

Tamires ressalta que, "para poder analisar a si, é necessário se reconstruir, então exige um trabalho de agente. Como a gente vai enfrentar isso de forma eficaz? Primeiro, através de debates, através do ensino, mas através também da autoreflexão. E a autoreflexão é um instrumento muito eficaz de transformação pessoal e do nosso entorno."

"Algumas sugestões sobre como a gente pode incentivar a conscientização e o combate às expressões racistas é pensar, e se fosse comigo? Porque é muito fácil a gente olhar de fora e falar não tem problema, eu sempre disse isso, eu não vejo mal algum nisso. Mas e se fosse com você? E se fosse com os seus pais?", questiona Tamires. "E certamente a gente vai ter respostas diferentes no combate. Essas expressões precisam ser combatidas, substituídas, abandonadas, de fato, pra gente poder buscar algo melhor pra nós e pros nossos futuramente."

Luis Quintero/Unsplash - Mão de uma pessoa negra com punho erguido

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