Na atmosfera de cuidados da Estação dos Barbeiros, em Juiz de Fora, nasceu o projeto "Estilo e Cuidados para Todos", uma iniciativa que vai além do corte de cabelo e se firma como uma expressão de solidariedade e inclusão.
Coordenado por Maycon Gonçalves, de 36 anos, fundador da Estação dos Barbeiros, e pela Thamires Gonçalves, de 32 anos, professora do curso de barbeiros e assessora da instituição, o projeto se tornou um farol de cuidado e autoestima em Juiz de Fora.
O nascimento do Estilo e Cuidados remonta à inauguração da barbearia em 2013. Thamires relembra:
"Sempre fomos muito envolvidos em ações sociais, e o projeto começou quase que junto com a abertura da barbearia. Com o tempo, ele ganhou força e se estabeleceu de forma permanente".
No início, quando os dois ainda namoravam, a barbearia recebeu o nome de Salão do Maikin e ficava localizado no Bairro Jardim Esperança. Na mesma época, Maycon começou a tirar um dia da semana para visitar um abrigo chamado Casa da Cidadania, atendendo as pessoas de forma gratuita todas as terças-feiras.
"É um serviço que nasceu do coração dele de ofertar um atendimento gratuito".
Atualmente, o projeto, que completa 11 anos, opera duas vezes por semana e oferece serviços gratuitos à população e instituições de acolhimento.
A dinâmica do funcionamento é marcada por dois modos de atendimento. A população em geral pode agendar os serviços através do WhatsApp ou comparecer diretamente à instituição.
As segundas e terças-feiras, manhã e noite, são dedicadas a esse propósito na unidade centro da escola, localizada na Travessa Dr. Prisco, número 23. Sob a supervisão de professores, os alunos da Escola para Barbeiros e Companhia oferecem cortes de cabelo, barba e higienização capilar.
O diferencial do projeto é que ele vai além do cuidado físico, incorporando uma abordagem educativa. Sobre isso, Thamires explica:
"Além dos serviços, oferecemos palestras sobre a importância do cuidado capilar. Conversamos com crianças e adolescentes, de maneira leve e descontraída, ensinando a importância da higiene e autocuidado".
Parcerias e ações
A colaboração com instituições e órgãos locais como parcerias com a Associação Municipal de Apoio Comunitário (AMAC), Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais (ADRA) e a Unidade de Acolhimento Institucional Colméia permitem que o projeto alcance pessoas em situação de rua, além de crianças e adolescentes.
Em dezembro de 2023, uma ação realizada na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) proporcionou cuidados e conscientização para o Dia da Pessoa com Deficiência.
"Fomos levar serviços de cuidado, autoestima e bem-estar para os assistidos e também para os pais e colaboradores que quiseram participar", conta a coordenadora do projeto.
Desde a concepção, a instituição impactou cerca de 5 mil pessoas:
"Hoje, após 11 anos, é gratificante ver como ela cresceu e se tornou uma fonte de cuidado e inclusão para nossa comunidade".
Cuidados que vão além do corte
A essência do projeto ultrapassa as tesouras e lâminas de barbear, atingindo também as histórias de vida das pessoas assistidas. Thamires relata que a conexão que se estabelece entre os voluntários e aqueles que recebem os cuidados gera um sentimento comum de gratidão e reconhecimento que permeia as interações, independentemente do público atendido.
"É um sentimento de amor, de amizade e, acima de tudo, de gratidão. Muitas vezes atendemos pessoas em situação de vulnerabilidade social, e nós vamos de boa vontade, com carinho e amor, levando o melhor de nós, sem esperar nada em troca."
Lá, as pessoas que foram já assistidas têm o costume de retornar a instituição tempos depois para compartilhar desfechos positivos das vidas. "Recebemos relatos de curas, reatamento de casamentos, conquistas de empregos. Essas histórias mostram que nosso cuidado vai muito além do corte".
Uma dessas conexões foi com o Roberto Rangel, que enfrentava uma situação de vulnerabilidade quando teve seu primeiro contato com o projeto.
"A gente o conheceu em uma dessas ações há cerca de quatro anos. Nessa época, ele morava em uma casa de passagem, pois estava em situação de rua", conta.
A interação com Roberto tornou-se semanal, e ao longo do tempo foi observada a transformação. Thamires compartilha a notícia mais recente que teve sobre ele.
"Nesta semana, ele veio a nossa instituição e contou pra gente que conseguiu alugar uma casa, conseguiu um emprego, e agradeceu a nós por essa mudança, que começou a acontecer através de um corte de cabelo, de um cuidado, por termos o tratado bem e sem preconceito, com carinho e amor em um momento que ele estava precisando e não encontrava em muitas pessoas".
Atendimento Especializado para Pessoas com Deficiência
A preocupação em oferecer um atendimento inclusivo é uma característica do projeto. A coordenadora explica que, nesses casos, são os profissionais já formados, que têm conhecimentos específicos, que assumem a responsabilidade de proporcionar o cuidado.
Guilherme Albano Cardoso, adolescente de 13 anos que possui deficiência intelectual, síndrome de Down e Transtorno do Espectro Autista (TEA), já foi atendido em uma das ações da barbearia. A mãe, Cleide Cardoso, funcionária pública de 55 anos, compartilha que, anteriormente, enfrentava dificuldades ao tentar cortar o cabelo dele.
"Por causa das questões sensoriais, é muito difícil conseguir fazer algumas coisas que são cotidianas com ele. O corte de cabelo é uma dessas questões. Então, sempre foi muito complicado para nós".
A mãe detalha como, ao longo do tempo, Guilherme deixou que outras pessoas fizessem o corte, até que a tarefa ficou restrita a ela, que utilizava uma tesourinha de unha debaixo do chuveiro.
"Nunca ficaria um corte perfeito, um corte bonito, mas era o possível", destaca.
A oportunidade de que um profissional voltasse a cortar o cabelo de Guilherme surgiu quando uma ação da Estação dos Barbeiros anunciou a chegada na APAE. Como o filho passou a recusar que profissionais e até mesmo familiares, exceto a mãe, cortassem o próprio cabelo, Cleide ficou em dúvida se esta tentativa daria certo. Porém, como o ambiente da instituição era um local familiar, onde ele já realizava atendimento clínico, ela decidiu inscrevê-lo para o atendimento, e o resultado surpreendeu.
Maycon, fundador da Estação dos Barbeiros, segundo Cleide, desempenhou um papel fundamental ao realizar um trabalho cuidadoso com Guilherme.
"Foi uma coisa muito bonita, muito lúdica. Ele foi aceitando as brincadeiras do Guilherme... Era uma brincadeira, uma cortadinha, uma brincadeira, uma cortadinha".
O apoio da família também foi crucial. Com o pai de Guilherme, Albano Souza, de 48 anos, sentado ao lado para cortar o cabelo, transmitindo a mensagem de que não havia nada a temer, aos poucos deu certo.
"Foi a primeira vez que o Guilherme teve um corte de menino da idade dele, com um estilo próprio de um pré-adolescente. E eu fiquei muito emocionada mesmo, foi muito importante pra mim esse momento".
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