SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Receita Federal da Índia realizou uma operação nos escritórios da rede britânica BBC no país nesta terça (14) por suspeitas de evasão fiscal. Segundo funcionários da emissora, eles foram impedidos de entrar e sair dos edifícios da empresa em Nova Déli e Mumbai e telefones e documentos de jornalistas foram confiscados.
O episódio ocorre semanas após o governo censurar um documentário sobre o premiê Narendra Modi.
Intitulada "Índia: A Questão Modi", a produção questionava o papel do líder nos distúrbios de Gujarat em 2002, exibindo um documento que supostamente comprova que ele pediu à polícia para não intervir em agressões contra grupos muçulmanos. A onda de violência deixou ao menos mil mortos, a maioria membros da minoria islâmica.
O governo chamou o documentário de uma "peça de propaganda" criada para reforçar uma "mentalidade colonial" e ressaltou que a Suprema Corte julgou Modi inocente de todas as acusações em 2012.
Embora a produção não tenha sido exibida na BBC Índia, o governo indiano recorreu a leis de bloqueio de informação vigentes desde 2021 para censurar links para o documentário no YouTube e no Twitter --as plataformas cumpriram as ordens.
Em nota, a BBC afirmou estar "cooperando totalmente" com as autoridades e disse esperar que a situação se resolva rapidamente.
A Receita Federal indiana não respondeu a pedidos de comentário das agências AFP e Reuters. Mas o partido de Modi, Bharatiya Janata (BJP), afirmou em nota que as instituições indianas são independentes e que a Receita Federal trabalha "dentro dos limites da lei".
Após as buscas, Gaurav Bhatia, porta-voz da sigla, descreveu a emissora britânica centenária como a "organização mais corrupta do mundo", segundo o jornal The Guardian. Representantes da imprensa e da oposição acusaram o governo de usar a Receita como uma fachada para exercer mais censura.
O Sindicato dos Editores Indianos disse estar preocupado com a visita do órgão à emissora, uma vez que ele teria realizado operações semelhantes em veículos como NewsClick, Newslaundry, Dainik Bhaskar e Bharat Samachar em 2021 depois que eles fizeram coberturas críticas ao governo.
"É doloroso assistir ao uso contínuo de agências do governo para intimidar e assediar organizações jornalísticas que criticam o establishment", afirmou o sindicato em nota.
Já o parlamentar K.C. Venugopal, do maior partido de oposição no Congresso, o Congresso Nacional Indiano, afirmou que a atitude é "ditatorial" e não pode persistir.
A BBC tem estado sob escrutínio do governo desde o lançamento do documentário e chegou a ser alvo de uma petição enviada ao Supremo Tribunal para que fosse banida do país --o pedido foi indeferido.
Com isso, a rede se junta a uma lista de organizações vítimas de um Estado crescentemente autoritário. A sede local da ONG Anistia Internacional, por exemplo, que vinha publicando uma série de relatórios sobre a erosão dos direitos humanos e da liberdade de expressão no país asiático, teve suas contas congeladas por uma agência governamental e acabou encerrando suas atividades no país.
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