SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Uma Velma de pele escura se apaixona por uma Daphne com traços orientais em "Velma", nova série adulta do universo do Scooby-Doo lançada pela HBO Max. O tesão entre elas surge quando as duas precisam se beijar para afastar entidades assustadoras que assombram a mente da protagonista.

Sangue, piadas de teor sexual e um texto pró-minorias preenchem esta animação que conta a história de origem da trupe de investigadores. Na trama, Velma apura assassinatos em série com a ajuda de seu colega Norville, o Salsicha, que nesta versão é negro. Fred Jones, por sua vez, agora só serve de chacota do grupo por ser um homem branco estúpido.

Os últimos capítulos de "Velma" estrearam na plataforma de streaming na última quinta-feira depois de a série ser rechaçada pela crítica especializada e pelos fãs do desenho clássico que estreou em 1969.

Nas redes sociais, reclamam que a produção deturpou os personagens. "A DC decidiu lacrar. Se querem personagens gays, basta criá-los. Não precisa alterar os heróis clássicos", escreveu uma pessoa no Twitter. Outro publicou que o novo desenho é "a coisa mais péssima, nojenta, horrorosa e idiota que o ser humano já fez".

Não é o que pensa Fernanda Baronne, que dubla a Velma no Brasil desde 2013. "Não dá para comparar a série nova com a antiga. Ela celebra os personagens e atualiza a história com diversidade de raça e sexual. É uma homenagem", afirma.

"Velma" se tornou um dos seriados mais mal avaliados no IMDb, site que agrega resenhas de filmes e séries, com uma nota média de 1,4. Para a cineasta e artista visual Erica Modesto, que é LGBTQIA+, as pessoas podem estar incomodadas porque a produção rompe com o que há de patriarcal em "Scooby-Doo".

"Tinha o mocinho bonito, a mocinha indefesa, o alívio cômico e o pet fofo e atrapalhado. Se falam que a Velma agora pertence a um universo que os conservadores não estão prontos para assimilar, essas pessoas piram", diz.

O novo seriado é mesmo disruptivo. Velma agora é feminista e filha de uma mulher indiana. Daphne é adotada por duas mulheres lésbicas. O cabelo laranja do Salsicha foi substituído por dreads pretos. Já Fred perde a alcunha de galã inspirador para lembrar o espectador dos privilégios que homens brancos ricos ostentam.

Para além dos protagonistas, o texto da série é ácido, debochado e crítico. Toca em temas delicados como racismo, violência policial, misoginia, pressão estética e outros problemas da sociedade americana.

Baronne, a dubladora, não vê problema com as piadas sobre gente branca. Diz que são feitas com o mesmo humor americano que sempre zombou de minorias. Modesto ecoa a opinião dela e acrescenta que os desenhos animados permitem uma abordagem simples e profunda de temas relacionados à diversidade.

A polêmica em torno da sexualidade de Velma ganhou força em 2020, quando Tony Cervone, o produtor de "Scooby-Doo", afirmou no Instagram que a personagem é lésbica.

O cineasta James Gunn, que escreveu o roteiro dos filmes "Scooby-Doo", de 2002, e "Scooby-Doo 2: Monstros à Solta", de 2004, já disse que os longas precisaram ser modificados na época para esconder a verdadeira sexualidade de Velma. Segundo ele, o estúdio quis deixar a ideia ambígua até eliminá-la na versão final do primeiro filme.

Uma cena de beijo entre Velma e Daphne foi gravada e depois cortada do longa de 2002. Quem confirmou a informação foi Sarah Michelle Gellar, a intérprete da Daphne.

Outro burburinho que rodeou "Velma" foi a exclusão do Scooby-Doo da trama. Charlie Grandy, um dos criadores da série, deu a entender que o teor adulto da história atrapalhou a inclusão do cão. A produção é recomendada para pessoas que tenham mais de 16 anos.

"O que torna 'Scooby-Doo' um programa infantil é o Scooby-Doo. Não conseguiríamos fazer isso [incluir o personagem]. Coincidiu com a Warner Bros. dizendo que não podemos usar o cachorro."

A justificativa pode parecer estapafúrdia, mas é verdade que a inocência do cão detetive pouco combina com as cabeças cortadas ao meio exibidas na série. Para Modesto, isso pode ser mesmo um fator que repele o público. "É delicado pegar um produto que passou anos sendo vendido para o público infantil e de repente embalá-lo para os adultos", diz.

Apesar das críticas e do suposto insucesso, Channing Dungey, a presidente da Warner Bros. Television Group, já deu a entender que a empresa está trabalhando numa segunda temporada da série.

Baronne, a dubladora, celebra o título. "Temos que caminhar para um lugar em que o importante da história não seja se a Velma é lésbica, hétero, não binária ou transexual, mas sim quem ela é."

VELMA

Onde Na HBO Max

Classificação 16 anos

Produção EUA, 2023


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