SANTOS, SP (FOLHAPRESS) - "O que exatamente funciona aqui?"

A historiadora Angela Bonard Micci, 62, conta que a pergunta se tornou frequente quando se posiciona em frente aos portões de ferro que dão acesso à casa acastelada cor-de-rosa, no topo de uma rocha, no centro histórico de Santos, no litoral paulista.

No local está o Outeiro de Santa Catarina, marco inicial do povoamento do município, em 1532, mas que chama a atenção por uma ressignificação recente e inédita em sua história.

Fechado por quase uma década por necessidade de restauração, o equipamento foi reaberto no último ano, após R$ 3,2 milhões investidos em reformas, e ganhou nova vida nos últimos meses, unindo visitas monitoradas com shows e atividades culturais.

No último dia 25 de janeiro, na véspera do aniversário de 477 anos da cidade, centenas de pessoas estiveram no local para uma happy hour.

O evento uniu passeios pelo local, ao mesmo tempo em que acontecia um show de bossa nova. A organização ainda disponibilizou brinquedos infláveis e eletrônicos para crianças, além de food trucks com diversos tipos de comidas.

"Apesar de morar em Santos, nunca tinha ido ao Outeiro. Cheguei após a indicação de um amigo e pretendo voltar", conta o pesquisador Ivan dos Santos Freire, 31.

Para março, a administração municipal negocia receber um festival de tango. Além das atrações culturais, a imersão guiada pelo espaço é um dos principais atrativos aos visitantes.

"Fizemos uma leitura e decidimos transformar um equipamento histórico em turístico, também. É uma roda que começou a girar, e os eventos são muito importantes para atrair esse novo público", explica Selley Storino, secretária de empreendedorismo, economia criativa e turismo de Santos.

No último dia 14 de janeiro, o local abrigou um concurso que definiu o rei, a rainha e a princesa do Carnaval da cidade, com a presença do sambista Neguinho da Beija-Flor e líderes de escolas de samba da região.

O trabalho tenta atrair o olhar da praia para os equipamentos do centro histórico. Isso foi acelerado a partir de 2021, com mudanças em funções nas pastas.

A antiga Secretaria de Turismo passou a abrigar também economia criativa, música, artesanato, design e gastronomia. O Outeiro, consequentemente, foi um dos equipamentos repensados.

Além da movimentação cultural organizada pela própria prefeitura, o espaço também está disponível para eventos privados -o aluguel custa R$ 2.000 por dia.

"Em abril, por exemplo, vamos ter apresentações culturais por parte de um produtor privado", afirma Luiz Dias Guimarães, diretor-presidente da Fundação Arquivo e Memória de Santos.

"Deixando claro que há, sim, restrições. No mês passado recebemos uma consulta para locar para um baile funk de madrugada, mas não é esse o propósito. Respeitamos a natureza do equipamento", acrescenta.

O Outeiro tem funcionado diariamente para visitação, mas só conta com monitores aos finais de semana e feriados, das 11h às 17h. Em eventos, os horários são adaptados.

Depois da reforma, há novas áreas de acessibilidade que dão acesso a parte da visitação. Repleto de bancos, árvores e jardins, o espaço também passou a ser frequentado por pessoas que trabalham nas proximidades.

Logo quando entram, os visitantes são provocados a conhecerem o Outeiro: "Vocês acham que a vida em Santos começou na praia?".

Eles então são conduzidos até o marco inicial, no sopé da rocha onde fica uma placa de 22 de outubro de 1902, que atesta o Outeiro como marco inicial de Santos.

A história contada por eles diz que Braz Cubas, fundador do município, se instalou na região construindo as primeiras casas e o hospital Santa Casa de Misericórdia de Todos os Santos, em 1945.

Na mesma época, o casal português Luiz de Góes e Catarina de Aguilar, devota de Santa Catarina de Alexandria, construíram na base de um monte uma capela que seria chamada de Outeiro de Santa Catarina.

O local foi destruído em 1591, após a invasão pelo corsário inglês Thomas Cavendish, que saqueou as vilas de Santos e São Vicente, além de ter destruído a Capela de Santa Catarina, lançando a imagem ao mar.

A santa foi encontrada anos depois, em 1663, por pescadores, e o local foi reconstruído. Hoje, é a peça mais antiga do acervo no Museu de Arte Sacra de Santos, também no centro da cidade.

"Eu só ficava entre a praia e o shopping", conta a técnica de enfermagem Nathany Viana de Campos, que levou o filho de 4 anos a um dos eventos.

O passeio prossegue com a visita a uma gruta e termina na casa construída pelo médico italiano João Éboli, na década de 1880.

Durante o período de reformas, historiadoras da região escavaram o local e resgataram no próprio terreno da casa material arqueológico como cachimbos, louças, azulejos, vidros de licor, perfumes, bebidas e outros itens de diversas épocas. As peças ficam expostas na visitação.

"Queremos utilizar as atividades culturais como uma mola propulsora para olharem para estes equipamentos", diz o prefeito Rogério Santos (PSDB).

A ideia da prefeitura é atrair ainda mais público ao local com a instalação de uma cafeteria ainda neste ano. Em parte do jardim há uma exposição com 17 fotos e imagens históricas da cidade.

Chama atenção, também, um painel de 230 m², uma obra artesanal formada por 1.452 azulejos decorados que apresentam rostos de diversos tamanhos.

O local ainda é visto com grande potencial por ser parte da linha do bonde turístico. Além disso, receberá em breve um boulevard, fechando uma das ruas de acesso para maior conforto do público.


Entre na comunidade de notícias clicando aqui no Portal Acessa.com e saiba de tudo que acontece na Cidade, Região, Brasil e Mundo!