SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Varais de secar roupa servem necessidades básicas da vida, desempenhando funções relativas à limpeza e à lavanderia. Quando não estão em uso, são dobrados e guardados. Mas eles não são só um item prosaico do cotidiano para a artista sul-coreana Haegue Yang.

"Como escultora, meu interesse é pegar esse objeto tão simples e dar um corpo a ele. Quando estão vestidos, os varais adquirem as suas próprias formas corporais. É uma incorporação", afirma a artista, justificando por que cobriu com mantos de sinos três racks de secar roupa expostos agora na Pinacoteca Contemporânea.

Yang, artista que nos últimos anos vem expondo em alguns dos principais museus e bienais do mundo, falou com a reportagem em São Paulo pouco antes da inauguração de sua primeira mostra institucional no Brasil -"Quase Coloquial" começa neste sábado (4), marcando a abertura do novo prédio da Pinacoteca, e reúne um conjunto enxuto mas representativo de seu trabalho.

Os varais são um exemplo de suas esculturas feitas com objetos banais produzidos em escala industrial. Como os racks têm dimensões variadas -a artista projetou até hoje 40 deles, ela estima-, já foram usados para compor o cenário de um balé, em que os seguranças mexiam as peças para os sinos gerarem sons. Na Pinacoteca, contudo, eles ficarão estáticos.

Outra amostra da habilidade de Yang em estetizar e também tentar dar vida a artefatos sem graça são suas esculturas e grandes instalações de persianas em diversas cores e tamanhos, iluminadas por lâmpadas -uma das primeiras versões desta pesquisa foi exibida na Bienal de São Paulo de 2006.

Na galeria da Pinacoteca, estruturas de persianas azuis, verdes e cor de terra estão presas aos ornamentos de metal do teto, pendentes como se fossem candelabros gigantes, ou colocadas no chão como totens. São esculturas de evidente preocupação estética -Yang diz prestar atenção nas partes dianteira e traseira das persianas, algo com que ninguém se preocupa.

O que há de tão especial em persianas, lâmpadas, varais e demais artefatos comuns? "Talvez a familiaridade. É como quando você encontra alguém numa rua inesperada, tipo encontrar seu vizinho em Roma. É este tipo de sentimento."

"Eu respeito os objetos porque eles servem as funções na vida diária, mas na galeria eu quero que esse objetos falem por si mesmos", afirma a artista, com sua fala mansa e voz baixa.

Nascida na capital da Coreia do Sul, em 1971, Yang é filha de uma professora e de um jornalista que foi demitido do jornal onde trabalhava por protestar contra a censura. Ela se formou em artes pela Universidade Nacional de Seul, mas sua tentativa de cursar o mestrado foi rejeitada pela instituição.

A artista acabou aceita na concorrida Städelschule, em Frankfurt, para onde se mudou em 1994 para estudar, praticamente sem falar alemão. Sua primeira exposição individual aconteceria dez anos mais tarde.

Em 2004, mostrou numa galeria de Berlim "Storage Piece", obra que reunia sua produção artística anterior embrulhada e colocada sobre pallets, como se estivesse pronta para ser armazenada -o trabalho também foi exposto na Bienal de São Paulo de 2006.

Seu trabalho cheio de metáforas e referências à história da arte foi aos poucos dando projeção internacional para a artista, um dos nomes centrais no cenário de hoje. Mesmo vivendo entre Berlim e Seul, onde tem ateliês, Yang está sempre em trânsito.

Ela conta que costuma visitar previamente os locais onde vai expor, mas isto não foi possível na Pinacoteca, já que o prédio estava em obras. A mostra foi projetada pela artista e pela equipe do museu a partir de desenhos em 3D no computador, croquis que previam como ficaria o espaço expositivo, o menor da nova Pinacoteca.

Isto não a impediu de desenvolver alguns trabalhos especialmente para esta galeria, tendo como base pesquisas sobre a cultura e a vida no Brasil. Um deles é uma parede monocromática pintada num vermelho de chão batido, uma cor que remete ao Pau Brasil, segundo a artista. Foram dez demãos até se atingir a tonalidade desejada.

O outro trabalho é uma série de colagens em grande formato, que Yang chama de totens, cada um com um tema -em um se vê uma alusão à música e à dança, com a famosa foto do olho de Caetano Veloso e um braço tocando violão; em outro, mãos seguram passaportes do Brasil ao lado de uma Hello Kitty. Em um terceiro, olhos de Oscar Niemeyer e Lina Bo Bardi miram o espectador.

"Quase Coloquial" ocupa a Galeria Praça, um dos dois espaços expositivos da nova Pinacoteca. Também no sábado, será inaugurada a mostra "Chão da Praça: Obras do Acervo da Pinacoteca", na Grande Galeria, uma área de mil metros quadrados no subsolo onde estará exposta uma seleção de 60 obras, sobretudo de artistas contemporâneos brasileiros.

A Pinacoteca Contemporânea se soma à Pina Luz e à Pina Estação, tornando a instituição do governo do Estado um importante centro cultural. O complexo artístico com os três prédios ocupa, ao todo, 22 mil metros quadrados no centro de São Paulo -dessa forma, o museu passa a ser o segundo maior da América Latina, apenas atrás do Museu de Antropologia Nacional do México, com quase 80 mil metros quadrados.

Jochen Volz, diretor geral da Pinacoteca, afirma que a Pinacoteca Contemporânea está contribuindo, junto a outros equipamentos, para tornar a degradada região da Luz e o bairro do Bom Retiro um grande polo cultural.

Ele cita o Museu de Arte Sacra, o Museu da Língua Portuguesa, a Casa do Povo e a Sala São Paulo como atrativos de "um público diverso para o centro, o que faz com que o centro ganhe força e a revitalização que todo mundo sempre fala".

QUASE COLOQUIAL

Quando De 4/3 a 28/5; qua. à seg., das 10h às 18h

Onde Pinacoteca Contemporânea - av. Tiradentes, 273, São Paulo

Preço R$ 20; nos primeiros 30 dias a entrada é grátis


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