FOLHAPRESS - Um político disse, alguém me disse, que é mais fácil ser presidente do que prefeito. O presidente lida com abstrações, como orçamento, inflação, desemprego etc. O prefeito, ao contrário, experimenta mais ou menos os mesmos problemas, só que em um permanente corpo a corpo com seus munícipes.

É bem o caso de Clémence Colombet, vivida por Isabelle Huppert, prefeita de uma cidade nos subúrbios pobres de Paris. No momento, ela se empenha pela revitalização de um grande conjunto habitacional popular que enfrenta vazamentos, cortes de luz e tudo mais.

Em suma, está caindo aos pedaços. Com a ajuda de Yazid, encarnado por Reda Kaleb, seu fiel assistente, Clémence se movimenta para que o governo federal financie a obra, enquanto o assistente batalha para conseguir que os habitantes entrem com as contribuições necessárias para que o processo possa ser aceito (claro, existe um prazo limite que está estourando: sempre há algum prazo para estourar no cinema).

Yazid foi criado naquele conjunto habitacional, o que facilita as coisas, mas nem tanto. Existem interesses contraditórios em questão, há também os que pretendem puxar o tapete da prefeita etc. Mas o prestígio dela é alto em Paris, tanto que recebe uma sondagem para um cargo ministerial.

É tentador. Trata-se de deixar para trás os problemões do dia a dia proletário (ou quase) e entrar no reino encantado das abstrações. Mas as sondagens não vão adiante, o que causa em Clémence uma profunda frustração. Afinal, havia prometido aos eleitores e ao partido que não seria candidata à reeleição. De repente o horizonte se transforma. Ela, que só pensava em servir à população do seu município, passa a pensar em si mesma. E decide se candidatar novamente à eleição.

Não custa lembrar que, embora honesta e sinceramente preocupada com o destino do conjunto habitacional, Clémence habita bem longe dele, numa casa bem luxuosa. Mas isso é apenas um elemento marginal em toda a trama.

O que se passa a seguir é encontro da teia de tramas lançada por Thomas Kruithof, o diretor do filme, que, como se vê, não são poucas e não raro se acotovelam, de maneira que o desenvolvimento do filme é bem desigual.

No entanto, algo no projeto de Kruithof chama a atenção: não é a atuação (boa, como de hábito) de Huppert que fica na memória, mas os rostos dos moradores do conjunto habitacional. Eles podem transmitir raiva com a situação, ou esperança, ou frustração. Mas é todo o desenrolar da trama, com o inevitável séquito de promessas, mentiras, verdades, meias-verdades e rasteiras que eles orientam, ao mesmo tempo em que são vítimas.

Afinal, essa população suburbana, em outros tempos fiel aos partidos de esquerda (aos comunistas, em particular) agora entrega-se a políticos razoavelmente progressistas, que pouco conseguem obter para ela.

Ou seja, é da crise dos estados democráticos ocidentais que trata "Belas Promessas", ou mais amplamente: da dificuldade, da lentidão que seus caracterizam seus procedimentos, quando se trata de assistir uma população desassistida --ainda que as intenções sejam as melhores. Em quem, doravante, essas pessoas poderiam confiar? Naqueles que condenam "a política", que botam a culpa de tudo "nos políticos". Para resumir, a próxima parada dessas pessoas pode muito bem ser na extrema direita.

Apesar de tropeçar de vez em quando nas armadilhas de uma trama extremamente complexa, o projeto de Kruithof parece longe de ser insignificante.

BELAS PROMESSAS

Avaliação Bom

Onde Nos cinemas

Classificação 12 anos

Elenco Isabelle Huppert, Reda Kateb, Naidra Ayadi

Produção França, 2021

Direção Thomas Kruithof


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