SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Uma mulher abdica de sua vida confortável em busca do gozo e da dor. Esta história poderia ser uma pequeníssima sinopse de um livro de Clarice Lispector, mas trata-se da premissa sobre a qual Regina Parra baseou sua primeira grande mostra num museu.

"Pagã", em cartaz agora na Pinacoteca Estação, em São Paulo, usa como referência o romance "A Paixão Segundo G.H.", um clássico de Lispector, para narrar em nove cenas a vida de uma personagem. O visitante assume um papel ativo, já que ele percorre o espaço expositivo numa ordem sugerida pela artista, como se acompanhasse o desenrolar de uma peça de teatro.

Ele não vai, contudo, se deparar com quadros nas paredes, como em exposições de arte tradicionais, mas sim com grandes pinturas espalhadas pela sala, conectadas por temas. Logo na entrada, por exemplo, há telas das figuras mitológicas dos sátiros retratados com o pênis ereto, como a indicar o erotismo que perpassa toda a mostra.

Ao fundo do espaço expositivo, uma pintura de vários metros de altura mostra três mulheres na entrada de uma casa com os seios descobertos. Ao lado, em outra tela, braços e pernas se deleitam sobre uma água branca, em clima de bacanal. A tonalidade predominante nas pinturas é o vermelho, não por acaso também a cor do carpete que forra a sala de uma ponta a outra.

"Eu queria que as pinturas não ficassem nas paredes, como quadros para serem vistos, mas que fossem cenários para situações que acontecem", afirma Parra, explicando o caráter teatral da exposição.

"Pagã" surgiu em parte da obsessão da artista pelas mitologias grega e romana e em parte de seu passado no teatro -quando era mais jovem, ela trabalhou por três anos como assistente do diretor Antunes Filho, antes de enveredar pelas artes visuais.

Nas pinturas expostas, todas feitas de 2021 para cá, o prazer das mulheres aparece explícito, ao contrário de trabalhos anteriores da artista, nos quais os corpos retorcidos deixavam no ar a dúvida se sofriam ou se gozavam.

O prazer erótico passou a aparecer mais no trabalho de Parra a partir da pandemia, ela afirma. "O que a gente vai fazer depois da pandemia, que é um mundo devastado? Em termos de vida e em termos de arte, mesmo. Não dá para desistir porque senão a gente se mata. Eu não queria fazer mais dor. Eu queria um pouco pensar no lugar do gozo."

Parra, um nome relevante no contexto da arte contemporânea com idade por volta dos 40 anos, é conhecida por desenvolver trabalhos que pensam o lugar da mulher em sociedades patriarcais, valendo-se para isso de suportes diversos como pinturas, fotografias, performances, vídeos e luminosos.

Muita gente já viu obras da artista sem saber que eram de autoria dela, como por exemplo seus néons que ficaram instalados por meses no Largo da Batata e no Centro Cultural São Paulo, ambos na capital paulista. O primeiro luminoso trazia a mensagem de que era preciso continuar, e o segundo dizia "a grande chance".

Na Pinacoteca, o tom dos dois néons expostos é menos otimista -eles trazem expressões de sofrimento em grego, intraduzíveis para o português. "Os gregos têm um vocabulário bem maior para expressões ligadas à dor e ao lamento", diz a artista. "É um misto de palavra mas também um grito, uma interjeição."

A mostra se completa com uma série de acessórios vestíveis feitos de argila, que o público pode colocar enquanto vê a exposição. Há uma armadura, um chifre, uma pata e um rabo, que dão um ar carnavalesco de fantasia ao mesmo tempo em que impõem uma dificuldade nos movimentos de quem os usa.

A ideia, para a artista, é que o corpo dos visitantes mude -e, assim, afete a forma de eles olharem os trabalhos.

REGINA PARRA - PAGÃ

Quando Até 13/8.

Visitação de quarta a segunda, das 10h às 18h

Onde Pinacoteca Estação - Largo General Osório, 66, São Paulo

Preço Grátis


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