SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Um dos artistas a participar da próxima Bienal de São Paulo, Igshaan Adams cria tapeçarias e esculturas com o uso de materiais ligados ao universo feminino da África do Sul, como miçangas e tecidos, em trabalhos que refletem seu crescimento numa área de Cape Town destinada aos negros durante o apartheid.
Outra das artistas selecionadas, Torkwase Dyson faz pinturas abstratas informadas pelos deslocamentos forçados de corpos negros na diáspora. Já Daniel Lie vai apresentar uma instalação formada por tecidos, terra e especiarias para refletir sobre o ciclo da vida, numa obra com plantas e flores que vão nascer e morrer durante os dois meses de duração da bienal.
Os três artistas, todos com projeção internacional -Adams esteve na Bienal de Veneza de 2022, por exemplo- fazem parte da primeira lista com 42 nomes que participarão da 35ª Bienal de São Paulo, marcada para começar no início de setembro, na capital paulista. A seleção parcial, divulgada pela Fundação Bienal de São Paulo nesta quinta-feira, dia 27, contempla artistas com trabalhos que lidam com as durezas do mundo.
"Para a gente é interessante pensar como determinados contextos impossíveis afetam a produção artística. Qual tipo de impossibilidade determinados corpos enfrentam quando estão inseridos em determinados contextos geográficos", afirma Diane Lima, uma das organizadoras da exposição, ao comentar a lista. Como exemplo de impossibilidade no mundo de hoje, Lima cita as migrações forçadas.
A geografia do impossível está localizada principalmente no Sul Global, dado que 75% dos nomes da lista vêm de países de fora do circuito hegemônico das artes. Ela também tem cor -dos 36 artistas, quatro duplas e dois coletivos anunciados nesta quinta, 91% são negros, indígenas ou não-brancos.
Este panorama não foi intencional, afirma Hélio Menezes, outro dos organizadores, mas sim resultado de pesquisas suas e dos outros três responsáveis pela cara da exposição, a artista portuguesa Grada Kilomba, o ex-diretor do museu Reina Sofía, em Madri, Manuel Borja-Villel, e a curadora Diane Lima.
Menezes questiona a própria expressão Sul Global, dizendo que ela não dá conta de abarcar a heterogeneidade dos artistas da bienal, e Kilomba fala que a mostra quer também discutir o desmantelamento da ideia de nação.
Dos brasileiros, marcam presença nomes que vêm ganhando destaque no circuito, como Aline Motta, Castiel Vitorino Brasileiro e Tadáskia, ao lado de outros já estabelecidos, como Rosana Paulino e Ayrson Heráclito, que fará uma obra junto do cantor e compositor Tiganá Santana. Denilson Baniwa, com uma mostra individual em cartaz agora na Pinacoteca, e Gabriel Gentil Tukano representam os indígenas.
A lista final de artistas terá mais de cem nomes e será anunciada ainda neste semestre, mas por ora os organizadores se encontram com o público nesta quinta para apresentar os divulgados até aqui, em uma conversa no prédio da Bienal. Será tema do bate-papo também o título do evento, "Coreografias do Impossível".
Em linhas gerais, a expressão se refere a práticas artísticas que lidam com urgências do presente e tratam, de maneira abstrata ou não, das violências dos sistemas nos quais estão inseridas, sejam elas cotidianas ou estruturais. A arte, dizem os organizadores, é entendida como uma saída. "Os artistas geram elementos de ruptura, elementos de onde há a possibilidade de imaginar outros futuros", afirma Borja-Villel.
Como o nome do evento indica, haverá obras relativas ao movimento do corpo, a exemplo de um trabalho da dançarina e coreógrafa marroquina Bouchra Ouizguen e outro da dupla de artistas não-binários Pauline Boudry e Renate Lorenz, que coreografam a tensão entre a visibilidade e a opacidade, segundo uma descrição em seu site.
Contudo, na bienal a palavra coreografia não será limitada a seu significado imediato, o de desenhar sequências de movimentos com o corpo humano. Kilomba destaca o trabalho da artista e designer gráfica do Zimbábue Nontsikelelo Mutiti, professora em Yale, responsável pela identidade visual desta edição do evento.
No cartaz da bienal, vemos o título da exposição feito a partir de tranças africanas. Segundo Kilomba, "a artista cria uma coreografia dentro do alfabeto em que se consegue ler e não se consegue ler".
LISTA PARCIAL DE ARTISTAS DA 35ª BIENAL DE SÃO PAULO
Aline Motta*
Ana Pi e Taata Kwa Nkisi Mutá Imê*
Anna Boghiguian*
Ayrson Heráclito e Tiganá Santana*
Bouchra Ouizguen
Castiel Vitorino Brasileiro*
Daniel Lie*
Dayanita Singh*
Deborah Anzinger
Denilson Baniwa*
Duane Linklater
Elda Cerrato
Elizabeth Catlett
Ellen Gallagher
Frente 3 de Fevereiro
Gabriel Gentil Tukano
Geraldine Javier
Igshaan Adams*
Inaicyra Falcão*
Julien Creuzet*
Leilah Weinraub
Luiz de Abreu
Manuel Chavajay
Marilyn Boror Bor
Mounira Al-Solh
Nadal Walcott
Nadir Bouhmouch e Soumeya Ait Ahmed*
Niño de Elche
Nontsikelelo Mutiti*
Pauline Boudry e Renate Lorenz
Philip Rizk
Rolando Castellón*
Rosana Paulino*
Sammy Baloji
Santu Mofokeng
Sarah Maldoror
Stanley Brouwn
Tadáskía*
Tejal Shah
The Living and Dead Ensemble
Torkwase Dyson*
Trinh T. Minh-Ha
Wifredo Lam
* artistas que desenvolvem obras comissionadas pela Bienal
CONVERSA COM OS CURADORES DA BIENAL DE SÃO PAULO
Quando Qui. (27), das 19h às 20h30
Onde Pavilhão da Bienal, 1° andar - av. Pedro Álvares Cabral, s/n, São Paulo.
Entrada pelo portão 3.
Preço Grátis, limitado a cem pessoas
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