SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Pelo segundo ano, a literatura transitará por bocas, mãos e ouvidos em praça aberta no Pacaembu --mas agora, sobre pernas mais firmes. Se a estreia da Feira do Livro em São Paulo, em junho do ano passado, foi feita em esquema de mutirão, ela avança para se estruturar como um projeto cultural sólido.
O festival foi idealizado pelo editor Paulo Werneck, presidente da Associação Quatro Cinco Um, que publica a revista de mesmo nome, e o arquiteto Álvaro Razuk, da Maré Produções. A parceria ergue tendas e abre auditórios na praça Charles Miller a partir da tarde desta quarta até o fim do domingo de feriado.
A grande notícia da vez, diz Werneck, é que a feira conseguiu recorrer à Lei Rouanet -em 2022, quando deu seu pontapé inicial, o evento não pôde captar recursos junto à Secretaria de Cultura do Ministério do Turismo, então responsável pela área no governo Jair Bolsonaro.
O financiamento do projeto anual da Quatro Cinco Um, do qual o festival literário fazia parte, estava bloqueado e com processo correndo na Justiça.
Neste ano, uma proposta nova foi elaborada junto ao governo federal e, já no Ministério da Cultura do governo Lula, o evento obteve aprovação para captar até R$ 1,6 milhão, dos quais conseguiu colher cerca de metade junto a patrocinadores. Foi o bastante.
"É algo que ilustra como as políticas públicas são fundamentais para projetos de cultura", diz o editor, ressaltando também que nesta edição a prefeitura paulistana e o Sesc entraram como apoiadores. "Não seria viável fazer todo ano como da última vez."
O que ele quer dizer é que, quando foi inaugurada, a feira dependeu muito mais da cooperação e da boa vontade de editoras e parceiros para financiar a estrutura e trazer convidados. O que ainda acontece, em certa medida, mas agora há um colchão confortável que ampara um evento de maior porte.
Chamariz principal, a programação gratuita de encontros com autores começa com um desfalque de última hora. O líder yanomami Davi Kopenawa cancelou sua participação, em luto pela morte de sua ex-nora, que se suspeita ter sido assassinada em Roraima.
Responsável por "A Queda do Céu" e "O Espírito da Floresta" ao lado do antropólogo Bruce Albert, ele abriria o festival no que se anunciava como um grande ritual indígena com a pesquisadora Hanna Limulja, o músico Xavier Bartabaru e o jornalista britânico Tom Phillips, amigo de Dom Phillips, assassinado há um ano na Amazônia com o indigenista Bruno Pereira.
Os povos originários ainda estarão presentes no encontro de Txai Suruí e Jerá Guarani, no sábado de manhã, mas a mudança é um golpe duro numa feira que apostava em Kopenawa como um de seus destaques -vale lembrar que ele também havia suspendido sua participação em outro festival literário, a Flip, em novembro ao contrair Covid.
A escala de programação, contudo, segue robusta. Subirão aos dois palcos paralelos do evento, dentro e fora do estádio do Pacaembu, um total de 74 participantes, entre autores e convidados de outras áreas, como jornalistas, instrumentistas e fotógrafos.
Há nove presenças internacionais neste ano -algumas de relevo, como a socióloga Patricia Hill Collins, autora de "Interseccionalidade", a poeta francesa muçulmana Fatima Daas, autora de "A Última Filha", e dois vencedores do Pulitzer, o poeta Jericho Brown, de "A Tradição", e o biógrafo Richard Zenith, de "Pessoa". Em junho passado, os nomes estrangeiros mal davam para completar uma mão.
A programação de escritores nacionais, já forte na edição de estreia da feira, investe agora em medalhões como Sueli Carneiro, que acaba de publicar sua tese "Dispositivo de Racialidade"; João Silvério Trevisan, que tirou do forno o autobiográfico "Meu Irmão, Eu Mesmo"; e ficcionistas consagrados como Milton Hatoum e Geni Guimarães.
Fechando as noites de sexta e sábado, haverá dois encontros entre autores dos mais relevantes na cena contemporânea. Primeiro, o carioca Geovani Martins, dos contos de "O Sol na Cabeça" e do romance "Via Ápia", conversa com a paulista Luiza Romão, que venceu o prêmio máximo no Jabuti pela coletânea de poemas "Também Guardamos Pedras Aqui".
No dia seguinte, se reunirão a escritora Ana Maria Gonçalves, que publicou uma nova edição do já clássico "Um Defeito de Cor", e Itamar Vieira Junior, colunista da Folha de S.Paulo que está rodando o Brasil para lançar seu "Salvar o Fogo".
E a feira termina com um "autografaço" que coroa o ciclo que começou com o projeto chamado "Um Grande Dia para as Escritoras", organizado por autoras como Giovana Madalosso no ano passado, agora tornado um livro que busca retratar a literatura feita por mulheres no país.
Para as crianças, uma boa pedida é o Espaço Folhinha, que receberá todos os dias autores de livros infantis como Antonio Prata, Kiusam de Oliveira e Ilan Brenman para conversar com as crianças, além de promover contação de histórias toda manhã, às 10h, e shows de Hélio Ziskind, no sábado, e do palhaço Hugo Possolo, no domingo. A Folha de S.Paulo é parceira do evento, onde terá um estande próprio.
É mais amplo também o cardápio dos expositores nas tendas que circulam a praça, que saltaram de 127 para 154 de um ano a outro. Ou seja, há maior diversidade de editoras e projetos literários de todo tipo mostrando seu trabalho ao público -e Paulo Werneck destaca o aumento na quantidade de livrarias, o que indica que elas não têm enxergado o evento como antagonista.
Mesmo que o comércio seja parte fundamental da feira, ela não prioriza os descontos massivos para atrair leitores, diferentemente de outras que costumam enfurecer o mercado livreiro. A decisão de baixar preços ou não cabe a cada um dos expositores.
Nos retoques finais, Werneck lembra que ouviu reclamações de escassez de café e comida, o que procurou sanar. "Afinal, livro sem café não dá."
A FEIRA DO LIVRO
Quando De 7 a 11 de junho. Qua., a partir das 15h. De qui. a dom., das 10h às 20h
Onde Praça Charles Miller, em São Paulo
Preço Grátis
VEJA A PROGRAMAÇÃO COMPLETA
**Quarta, 7**
19h - Tom Phillips, Hanna Limulja e Xavier Bartaburu
**Quinta, 8**
10h - Bela Gil, Néli Pereira e Clarice Reichstul
11h45 - Max Lobe e Abdellah Taïa
12h15 - Homenagem a Pelé (Luiz Antonio Simas e Lorenzo Mammì)
13h30 - Interlúdio Musical (Hermínio Bello de Carvalho e Joyce Moreno)
15h - Luiz Antonio Simas e Bianca Tavolari
17h - João Silvério Trevisan e Renan Quinalha
17h15 - Ligia Fonseca Ferreira e Hebe Mattos
19h - Sueli Carneiro e Bianca Santana
**Sexta, 9**
10h - Ginevra Lamberti e Camila Appel
11h45 - Antônio Bispo dos Santos e Bianca Tavolari
12h15 - Conrado Corsalette e Natália Viana
13h30 - Maria Stockler Carvalhosa e Isabel Teixeira
15h - Patricia Hill Collins
15h15 - Pedro Cesarino, Aparecida Vilaça e Rita Carelli
17h - Jericho Brown e Stephanie Borges
17h15 - Ynaê Lopes dos Santos e Marcio Farias
19h - Geovani Martins e Luiza Romão
**Sábado, 10**
10h - Txai Suruí e Jerá Guarani
11h45 - Geni Guimarães e Eliane Marques
12h15 - Eugênio Bucci
13h30 - Interlúdio Musical (Arthur Nestrovski e Celso Sim)
15h - Richard Zenith e Lira Neto
15h15 - Samir Machado de Machado e Antônio Xerxenesky
17h - Fatima Daas e Diogo Bercito
17h15 - Fernando Romani Sales, Mariana Celano de Souza Amaral e Marina Slhessarenko Barreto
19h - Itamar Vieira Junior e Ana Maria Gonçalves
**Domingo, 11**
10h - Cida Bento, Winnie Bueno e Juliana Borges
11h45 - Milton Hatoum e Roberta Martinelli
12h15 - Bob Wolfenson e Renato Parada
13h30 - Interlúdio Musical (Paula Lima, Tiê e Tulipa Ruiz; homenagem a Rita Lee)
15h - Aline Motta, Felipe Charbel e Paulo Roberto Pires
15h15 - Pablo Katchadjian
17h - Edição ao vivo do podcast Foro de Teresina, com os jornalistas Fernando de Barros e Silva, José Roberto de Toledo e Thais Bilenky
17h15 - Pedro Vinicio e Laerte
19h - Encerramento: Um Grande Dia para as Escritoras - Esmeralda Ribeiro, Natália Timerman, Paula Carvalho e Giovana Madalosso
CONVIDADOS DO ESPAÇO FOLHINHA
**Quinta, 8**
14h - Marcelo Duarte
17h - Ilan Brenman
**Sexta, 9**
14h - Salvador Nogueira
17h - Kiusam de Oliveira
**Sábado, 10**
14h - Hélio Ziskind
17h - Antonio Prata
**Domingo, 11**
16h - Hugo Possolo
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