(FOLHAPRESS) - O Balé da Cidade de São Paulo, que completa 55 anos neste 2023, está em temporada no Theatro Municipal, sua casa, com duas obras de seu repertório: "Inacabada" (2022), de Ihsan Rustem, e "Balcão do Amor" (2014), de Itzik Galili.

Criada especialmente para o Balé paulistano, a obra do israelense Galili poderia se encaixar em uma temporada de comemorações (até agora não anunciadas) pelo aniversário da companhia. Inspirada na música cubana do "rei do mambo" Pérez Prado (1916-1989), é uma coreografia festiva: leve, divertida, uma dança tranquilamente considerada agradável. "Alguma coisa fácil, de entretenimento, que possa ser admirada pela multidão", disse o próprio Galili no programa da estreia, quase uma década atrás.

Expressar o puro e simples prazer de dançar é uma possibilidade legítima (e deliciosa), mesmo em tempos críticos. A arte não está obrigada a tratar exclusivamente da crise política, social, ética, climática ou qualquer outro tema definidor do espírito do tempo.

Jogar para a plateia com uma obra que não apenas agrade, mas também fale ao público muitas vezes refratário à complexidade da dança contemporânea não é um problema em si -e tem a vantagem de tornar a linguagem mais acessível ao grande público.

O problema de "Balcão do Amor" é ter envelhecido rapidamente e mal. Apesar de ser todo trabalhado em uma quase paródia dos musicais de Hollywood dos anos 1950, a entrega ao ritmo contagiante do mambo e ao fascínio criado pela virtuose dos bailarinos em duos tecnicamente mais complexos (e belos) apaga a ironia fina, mata a paródia.

Sobram algumas gags coreográficas meio manjadas: o nerd de óculos se atrapalhando e sendo rejeitado pelas mulheres, o tapinha brejeiro na bunda das meninas -tudo muito singelo, sem o desconforto que uma cena do tipo causa em, por exemplo, uma coreografia da Pina Bausch.

Um atenuante, talvez, para o "Balcão do Amor": a coreografia foi criada antes de o MeToo explodir, os incels saírem do armário e Anitta sapatear na cara do bom gosto burguês com o sucesso de "Envolver".

Não é intenção dessa coreografia chocar ninguém -e fazer isso não é compulsório para a arte contemporânea, embora faça parte. Mas é difícil, em 2023, achar graça em piadas pueris de "bom gosto" -tudo é muito chique no "Balcão do Amor".

Galili optou por uma montagem minimalista, sem cenário, com um figurino de alfaiataria, calça preta e camisa branca, igual para homens e mulheres do elenco. Essa opção poderia ser um contraponto aos clichês coloridos de fêmea e macho da latinidade hollywoodiana, mas parece mais uma tentativa de negar esse kitsch -tão bem aproveitado por Almodóvar, lembrado aqui por ter usado a música Pérez Prado em seu filme "Kika", de 1993.

Se o minimalismo buscado por Galili, por um lado, valoriza a excelência e a elegância dos bailarinos, também parece buscar aquele outro clichê de "ser sexy sem ser vulgar" -não sendo nem um nem outro, mas escorregando acrítico e sem filtro para os estereótipos.

Mesmo assim, "Balcão do Amor" cumpre muito do que se propõe a ser: pode não ser tão engraçado hoje em dia, mas não chega a causar revolta; agrada quem quer um entretenimento leve e oferece uma coreografia redonda, sem arestas -não causa espanto, aquele "uau" que esperamos em um espetáculo de uma companhia contemporânea com 55 anos de dança, mas permite algumas performances admiráveis.

E aqui vale mais esse elogio, contextualizado, ao elenco: mesmo passando por uma crise particular -o Balé da Cidade está, mais uma vez, sem direção artística e sem espaço próprio-, é admirável como os bailarinos seguram o mambo (tocado ao vivo pela orquestra do Municipal) e garantem o brilho do espetáculo.

O BALCÃO DO AMOR

Avaliação Bom

Quando De ter. a sex., às 20h, sáb., às 17h. Até 10 de junho

Onde Theatro Municipal de São Paulo - pça. Ramos de Azevedo, s/n

Preço De R$ 12,00 a R$ 84,00

Classificação 14 anos


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