SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Ruban Nielson lidera uma banda que desafia clichês, tamanha a dificuldade para definir o tipo de música que faz. Mas de um chavão o neozelandês não consegue escapar: ele canta e, assim, os males espanta.

Por meio do Unknown Mortal Orchestra, que se apresenta no próximo domingo (19) no Balaclava Fest, em São Paulo, Nielson descarrega toda a sorte de dramas, de questões familiares a problemas com drogas, em letras permeadas por um pessimismo do qual, afirma, ele tenta se distanciar na vida real.

A fala calma e o jeito bem-humorado do guitarrista de fato contrastam com a atmosfera soturna de suas letras, que discorrem sobre como o "isolamento pode colocar uma arma na sua mão" e a "sensação de que não viverei muito além desses anos". "Talvez eu queira tirar sarro de mim mesmo. Ou talvez eu seja muito otimista e ache legal ser cínico", diz Nielson à reportagem. "E é uma defesa. Você fica menos vulnerável quando é pessimista. Meu senso de humor também é sombrio, então pode ser uma forma de encontrar equilíbrio."

Doze anos após debutar com um celebrado álbum que leva o nome da banda, o Unknown Mortal Orchestra lançou em 2023 seu quinto disco, "V", no qual segue desfilando questões existenciais e a mistura solar de indie, jazz, psicodelismo e funk que marca o grupo. Apesar das referências diversas, as canções passam longe de serem misturebas e tampouco descambam para demonstrações gratuitas de virtuosismo.

Também como nos registros anteriores, o álbum mais recente da banda tem várias camadas, cheias de construções quebradas, e a gravação é meticulosamente desenhada para parecer um tanto retrô.

Questionado como descreve aos filhos adolescentes a música que faz, Nielson, 43, dá risada, conta que eles "gostam mesmo é de K-Pop" e que, se tivesse de explicar a um motorista de Uber o som de sua banda, diria apenas rock'n'roll, "porque ainda espero um gênero que seja fiel ao meu estilo". "Se houver um que compreenda o que estou fazendo, eu o usaria sem problemas. Rótulos são legais, como tropicália."

A conexão do neozelandês com o Brasil se estreitou recentemente. Além de mencionar Caetano Veloso como uma de suas maiores influências -ok, outro clichê- e a tropicália como um movimento ao qual recorre para lembrar "o que uma boa música é", Nielson trabalhou na produção de dois videoclipes de "V" com os brasileiros Giordano Maestrelli e Duran Sodré, que até há pouco tempo formavam o duo Vira Lata.

Com ar de cinema, os vídeos de "Layla" e "Nadja", concebidos para mostrar as aventuras de duas jovens mulheres, foram filmados no litoral do Paraná e contaram com uma equipe formada por outros brasileiros.

Se antes a banda produziu clipes com animações, a ideia no pós-pandemia, afirma Nielson, era retratar "gente de verdade". "Eu tinha em mente apenas a vontade de exibir um relacionamento com intimidade. Quando vi os vídeos pela primeira vez, um atrás do outro, chorei. Eram melhores do que havia imaginado."

A pandemia foi fundamental tanto para a criação de "V" quanto para reforçar o otimismo do guitarrista. A Covid forçou Nielson a viajar para ajudar um tio com problemas de saúde no Havaí, onde se reconectou às suas raízes -a mãe do músico nasceu na ilha-, extraindo elementos que mais tarde colocaria no disco. Lá, também se reencontrou com o irmão, o baterista Kody, que colaborou na concepção do álbum.

Já o senso de mortalidade que o coronavírus trouxe, em vez de jogá-lo para baixo, diz o neozelandês, gerou um efeito rebote, como se a situação pedisse uma reação. "Não virei uma pessoa mais positiva porque não acredito que coisas ruins possam acontecer, mas porque minha família e meus amigos precisam que eu seja mais otimista. Se as coisas ficarem piores, vamos precisar de otimistas no mundo."

Como "V" foi idealizado entre Havaí e Palm Springs, na Califórnia, conhecida pelas paisagens desérticas, não é estranho que Nielson cite em suas letras palmeiras e nuvens cor-de-rosa, mesmo porque menções à natureza são algo recorrente em sua obra, como em "Swim and Sleep (Like a Shark)" e "Hunnybee".

Com tantas marcas de seu líder, o Unknown Mortal Orchestra parece mais um projeto solo sob um nome coletivo, embora Nielson negue que essa seja a intenção. Para tal, cita os australianos do Tame Impala.

"Kevin Parker é o Tame Impala, e eu não desejo isso, quero estar numa banda. Quanto mais componho e o disco avança, trabalho mais e mais com meus companheiros", afirma ele. "É um pouco como a Nova Zelândia: você começa isolado como uma ilha e depois caminha para um cenário coletivo."

Na segunda passagem pelo Brasil, Nielson, com o baixista Jacob Portrait e o irmão Kody, fechará o festival após os shows de American Football, Thus Love e Whitney, todos dos EUA, Hatchie, da Austrália, e PVA, do Reino Unido, além da brasileira TerraPlana e da meio brasileira e meio americana Shower Curtain.

Nielson conta que há sete anos, quando veio ao país pela primeira vez, ficou chocado com a quantidade de pessoas que conheciam o Unknown Mortal Orchestra -e a popularidade da banda parece ajudá-lo numa espécie de terapia coletiva. "Às vezes é mais fácil encarar a vida quando componho canções sobre os meus problemas", diz ele. "Se eu estiver sendo realmente honesto em relação à maneira como me sinto, isso me dá a sensação de que posso ajudar alguém. Alguém pode ouvir e se sentir da mesma forma."

BALACLAVA FEST

Quando 19/11, a partir das 15h

Onde Tokio Marine Hall - r. Bragança Paulista, 1.281, Várzea de Baixo

Preço A partir de R$ 290

Classificação 16 anos

Link https://www.ingresse.com/balaclavafest23


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