RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - No final dos anos de 1990 e começo dos anos 2000, só dava Vinny na cena musical. Vinícius Bonotto Conrado -seu nome de registro- vivia nos programas de auditórios de todas as emissoras e dominava as pistas de danças do Brasil afora com hits como "Heloísa, Mexe a Cadeira", "Shake Boom", "Na Gandaia" e "Uh! Tiazinha", entre outros.

As músicas eram marcadas por batidas eletrônicas pulsantes e letras que abusavam das onomatopeias. Como explicar versos como "no badauê, no balancê / boom, boom, shake, shake, shake, boom"? Ou então: "mexe a cadeira, sabe tudo e nada fala / mexe a cadeira e vai fazendo a minha mala"? Foram "fenômenos doidos", como descreve o próprio cantor.

Vinny reconhece que, a princípio, não gostava de ver suas canções nas mãos DJs e remixadas a torto e a direito. "Odiei. Era contra", lembra o paulista de Leme, que, após um período de baixa no mercado musical, decidiu estudar e se tornar psicanalista. "Já atendi em uma clínica e alguns pacientes me reconheciam, outros não", conta.

Desde o ano passado, ele decidiu fechar a agenda de atendimentos para voltar a trabalhar com música. "Estou feliz pra caramba com meu retorno por mil motivos", afirma. "O primeiro e mais importante deles é que hoje, diferentemente daquele momento da vida, eu não preciso mais da música para sobreviver, sabe? Faço por prazer mesmo, desejo e tesão."

Confira abaixo os melhores trechos da entrevista de Vinny à reportagem.



PERGUNTA - A pergunta que não quer calar: as pessoas comentam que você não envelhece? Sempre tem aquela curiosidade do tipo 'dorme no formol'?

VINNY - Total (risos). É o que mais ouço. Mas não durmo no formal e eu sempre respondo que a minha aparência jovem é por causa da alegria de viver. Sou muito grato de poder abrir os olhos, ir e vir, produzir... Também nunca fui de beber, drogas e noitadas, sabe? As noitadas só aconteciam mesmo quando eu tinha shows que varavam as madrugadas.

P - Você tem mais de 200 composições, são 14 discos no total, mas se tem uma que é associada a você é 'Heloísa, Mexe a Cadeira'. Um hit com o qual você deve faturar alto até hoje...

VI - Com certeza. Foi um fenômeno doido, porque a música aconteceu em 1998. Não tinha internet e ela tomou uma proporção gigantesca. Principalmente depois do remix.

P - Como assim?

VI - A música virou um remix, e eu fui contra. Quando o presidente da gravadora apresentou a ideia de fazer um remix, eu falei: 'Nossa, isso vai ficar uma merda, de jeito nenhum, não topo'. Ele fez, me mostrou e eu odiei (risos). Mesmo eu odiando, ele entregou aos DJs e aí aconteceu o estouro de 'Mexe a Cadeira'. Eles estouraram a música na noite antes mesmo de ela ir para as rádios e para a televisão. Foi um circuito alternativo muito louco.

P - Mas, como era na sua cabeça fazer sucesso com uma música que você odiou? Suas letras eram, digamos, mais profundas ou você era de outro estilo?

VI - O meu universo era totalmente diferente. Tocava em uma banda de hard rock chamada Hay Kay [o grupo lançou um álbum em 1990 e teve a música "Segredos" incluída na trilha sonora da novela "Vamp", da Globo]. As coisas não foram tão bem e aí eu lancei o meu primeiro trabalho solo em 1995 pela Indie Record. Era um disco acústico, outro tipo de som e a minha resistência inicial aos DJs era total.

P - O que te fez quebrar essa resistência?

VI - Uma vez que eu entendi como era que funcionava isso na noite, o que o pessoal queria ouvir nas pistas, percebi que podia ser maneiro e, obviamente, lucrativo. Meti o pé e aí vieram "Shake Boom", "Na Gandaia" e "Uh! Tiazinha".

P - Você é mestre em Filosofia e é também psicanalista? Quando foi que virou essa chave de compositor de sucessos das pistas de danças para um estudioso?

VI - Olha... essa parada de fazer sucesso nas pistas de danças foi um aprendizado. Confesso que fui muito preconceituoso. Achava que aquilo era, sei lá, inferior, e o que eu fazia era muito melhor. Incompreendido, mas muito melhor. Percebi a burrice a tempo. A gente vive num país tropical e há uma inclinação natural à festa, né? O brasileiro tem essa inclinação natural. E aí você é abraçado por uma galera gigantesca, sabe? Me sinto sortudo e orgulhoso da minha trajetória.

P - E ter outras profissões? Você chegou a fazer faculdade de direito?

VI - Amo direito e cheguei a trabalhar no setor jurídico da Bradesco Seguros, aqui no Rio, mas sabia que iria ser um péssimo advogado porque tinha medo de falar na frente de um juiz (risos). Vi que a música tinha mais a ver comigo. Depois, fiquei um tempo querendo mudar de vida. O mercado também não estava bom e fui estudar filosofia e ciências sociais. No final, acabei me interessando pela psicanálise.

P - Mas você clinica? Os pacientes te reconhecem?

VI - Sim, já atendi em uma clínica e alguns pacientes me reconheciam; outros não. Sabia que esse era um temor que eu tinha e debatia isso com os meus coordenadores, porque o fato de ser uma pessoa pública poderia ser muito ruim. Ou muito bom.

P - Como assim?

VI - O fato de ser público, de alguma forma, pode já estabelecer alguma intimidade, né? Você já me viu de alguma forma. Eu não sou uma pessoa 100% estranha para você. Mas poderia ter também um bloqueio pela exposição. Felizmente, não tive grandes problemas. Tive muitos pacientes, tenho um carinho enorme por todos, só que, desde o final do ano passado, fui avisando um a um que agenda iria fechar por causa da minha volta à música.

P - Você está voltando?

VI - Fui contratado por uma gravadora de Los Angeles, a Expand Music, para lançar pelo menos uns dois, três discos. O primeiro já foi lançado e se chama "Baile do Vinny". O repertório é formado pelas músicas das pistas revistas e com alguns arranjos novos. Como falei, fechei a minha agenda de pacientes e agora quero sair pelo Brasil com esse trabalho.

P - Está feliz com esse retorno?

VI - Estou feliz pra caramba com meu retorno por mil motivos. O primeiro e mais importante deles é que, hoje, diferentemente daquele momento da vida, eu não preciso mais da música para sobreviver, sabe? Amo fazer o que eu faço. Faço por prazer mesmo, desejo e tesão. Tenho 58 anos e sair de casa para tocar em um cidade do interior, passar horas dentro de um ônibus, pegar avião, fazer várias turnês seguidas... Você tem que estar com vontade de fazer isso ou estar precisando muito. Hoje, o meu caso é o primeiro, graças a Deus.


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