RIBEIRÃO PRETO, SP (FOLHAPRESS) - O MPF (Ministério Público Federal) divulgou na segunda (15) nota técnica em que contesta o mínimo existencial de R$ 303, definido por lei. Segundo o documento, o valor é irrisório e desvirtua o sentido original da proposta.

Segundo a nota, a Lei do Superendividamento deveria servir para preservar os direitos do consumidor, mas, da maneira como foi regulamentada, não garante renda suficiente para os compromissos domésticos básicos e amplia as possibilidades de endividamento da população mais vulnerável.

Um decreto do presidente Jair Bolsonaro (PL), publicado no último dia 27, regulamentou as regras que definem um indivíduo superendividado e o mínimo existencial que não pode ser comprometido com dívidas.

O texto estabelece que a quantia mínima que uma pessoa precisa para pagar despesas básicas é um quarto do salário mínimo, o que equivale a R$ 303. O decreto define este como o mínimo existencial ?valor que não pode ser comprometido para quitar dívidas.

Na prática, um indivíduo endividado que solicite uma audiência conciliatória para fazer uma nova proposta de pagamento das suas dívidas tem a garantia de que pelo menos R$ 303 não serão comprometidos e poderão ser utilizados para subsistência.

A nota do MPF, elaborada pelo Grupo de Trabalho Consumidor, questiona também o fato de o decreto permitir, na prática, que despesas não relacionadas ao consumo, como financiamento imobiliário e crédito consignado, possam comprometer o mínimo existencial.

Para o órgão, a lei viola o código de defesa do consumidor, que define que o tratamento do superendividamento deve considerar quaisquer compromissos financeiros, incluindo "operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada".

O MPF ainda alerta para o "assédio agressivo" de instituições financeiras que se beneficiam de populações vulneráveis e pouco escolarizadas. Segundo a procuradora da República e coordenadora do Grupo de Trabalho Consumidor, Mariane Guimarães, o poder regulador deveria evitar esse tipo de prática para garantir o equilíbrio saudável das relações de consumo.

Para Maria Paula Bertran, professora da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto e responsável pelo Programa de Apoio ao Endividado, essa medida coloca abaixo da linha da pobreza as pessoas que querem pagar suas dívidas.

Ainda de acordo com a professora, a lei desconsidera que o mínimo existencial varia de um indivíduo para outro e defende que o valor deveria ser definido caso a caso, variando por exemplo, de acordo com os custos da cidade onde o indivíduo mora, seus gastos médicos e a quantidade de filhos.

A mesma ideia foi proposta pelo Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), que também já havia contestado o decreto.

Para os que defendem o documento, como a Febraban (Federação Brasileira de Bancos), ele permite que a Lei do Superenvidamento, que foi aprovada há mais de um ano, seja aplicada na prática. Segundo a federação, um mínimo existencial para todos os brasileiros traz "segurança jurídica".


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