SÃO BERNARDO DO CAMPO, SP (FOLHAPRESS) - A Mercedes-Benz iniciou, nesta quinta-feira (8), as negociações com o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC para a demissão de 3.600 funcionários na fábrica em São Bernardo do Campo (ABC).
As propostas devem ser apresentadas aos trabalhadores em assembleia nesta quinta. A empresa anunciou os cortes na terça-feira (6) à tarde e pegou os funcionários de surpresa. Serão desligados 2.200 funcionários diretos e 1.400 terceirizados.
Inaugurada em 1956, a unidade tem hoje 10,4 mil funcionários e é a maior planta da empresa fora da Alemanha. Segundo a montadora, as demissões fazem parte de um processo de reestruturação para concentrar esforços no que é demandado pelo mercado atualmente.
Na porta da fábrica, o clima é de apreensão. Profissionais aceitaram falar com a reportagem apenas sob anonimato. A maioria teme ser demitida.
O terceirizado Evandro Portela, 38 anos, lamenta. "Não serei afetado diretamente, mas a gente fica muito chateado pelos companheiros", diz.
Portela trabalha em uma empresa que fornece alimentos para o restaurante e diz esperar mudanças futuras para que a economia da região volte a crescer. "É preciso olhar para os trabalhadores, é a gente que move esse país."
José Pedro de Melo, 60, proprietário de uma banca em frente à fábrica há 28 anos, diz que já viu muita movimentação de corte de trabalhadores nesse período.
"Eu comecei aqui quando a empresa tinha 25 mil funcionários. Hoje, não tem nem metade. Não perco muito, porque sempre tem movimento, mas o bairro está acabando", afirma.
O bairro é Pauliceia, cortado pela rodovia Anchieta, polo onde está a Mercedes e que abrigou a antiga fábrica da Ford, fechada em 2019.
Basta atravessar a passarela para se deparar com os resultados da crise persistente que acabou com a vocação automotiva da região.
A rua Pacaembu, famosa por suas banquinhas de camelôs, é um retrato dos bons tempos. "Chegamos a ter mais de 20 bancas aqui, agora não são nem cinco", diz Sandro Ferreira, comerciante de 49 anos, há 28 anos no local.
Alex Jerônimo dos Santos, 44, vende itens no local há 29 anos e vê como mais uma crise com a qual terá de lidar. "Vou cortar gasto para poder sobreviver. Cortar tudo: luz, internet."
Estudo feito pelo Dieese em 2019 aponta que, a cada demissão no ABC, cinco trabalhadores são impactados dentro da cadeia automotiva, com corte em diversas prestadoras de serviços às montadoras. Com isso, o efeito dos desligamentos na Mercedes atingiriam 18 mil profissionais.
A ideia da montadora é direcionar as atividades na fabricação de caminhões e chassis de ônibus e investir no desenvolvimento de novas tecnologias.
A empresa deixará de produzir alguns componentes e vai terceirizar áreas como logística, manutenção, fabricação e montagem de eixos dianteiro e transmissão média, ferramentaria e laboratórios.
Em nota, a montadora afirma que todas as discussões que impactam os funcionários serão debatidas com o sindicato nas negociações. "Mantendo o nosso comportamento histórico, a Mercedes-Benz fará todos os esforços possíveis para que se atinja uma solução negociada", diz o texto.
CORTES PEGARAM SINDICATO DE SURPRESA
O anúncio de demissão em massa na fábrica de São Bernardo pegou o sindicato dos metalúrgicos de surpresa na tarde de terça. Em comunicado nas redes sociais, o atual presidente da entidade, Moisés Selerges, disse que três representantes da montadora chegaram na sede do sindicato à tarde para informar das mudanças na unidade.
Ao mesmo tempo, comunicados informando sobre os cortes foram distribuídos e os funcionários ficaram sabendo dos desligamentos de forma não oficial. Ainda não foram enviadas cartas de demissão individuais para os trabalhadores. Nesta quinta (8), o comunicado oficial do sindicato deverá ser feito em assembleia marcada para 14h.
FECHAMENTO DE MONTADORAS
Nos últimos anos, com a crise econômica, fechamentos de montadoras têm atingido o Brasil. O ABC deixou de ser polo de empresas produtoras de veículos, e o número de metalúrgicos caiu drasticamente.
Em 2019, a Ford anunciou o encerramento de suas atividades na unidade de São Bernardo do Campo. Um ano depois, foi a vez dos funcionários de Taubaté (interior de SP) receberem a notícia do fim das atividades e, em 2021, a montadora anunciou o encerramento de sua produção no Brasil.
Neste ano, em maio, a Caoa Chery decidiu limitar suas atividades em Jacareí (80 km de SP) e fechar a fábrica de forma temporária para fazer alterações. Cerca de 600 funcionários forma demitidos. A unidade será remodelada.
MERCEDES DO ABC FOI INAUGURADA HÁ 65 ANOS
A unidade da Mercedes em São Bernardo do Campo foi inaugurada em 28 de setembro de 1956 como ponto de partida da atuação da empresa no Brasil. No local, são fabricados os caminhões das famílias Accelo, Atego, Axor, o Novo Actros e o mais novo lançamento, o Arocs.
Em março de 2018, a unidade ganhou uma nova linha de montagem final de caminhões com conceitos da Indústria 4.0, que reúne as tecnologias mais avançadas de conectividade, internet das coisas, armazenamento na nuvem, Big Data & Analytics para a produção desde leves a modelos pesados de caminhões.
Na planta do ABC paulista, a Mercedes tem também um centro de desenvolvimento tecnológico. Com 30 anos de atividades, é o maior do Brasil e o maior da Daimler fora da Alemanha para veículos comerciais.
A montadora tem ainda unidades em Campinas (93 km de SP), Juiz de Fora (MG) e Iracemápolis (167 km de SP), onde mantém um campo de provas e um centro de testes.
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