SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Apesar do crescimento da taxa de investimentos no segundo trimestre de 2022, o setor produtivo ainda vê restrições para que o país se recupere do colapso verificado a partir de 2013.

Uma das questões em discussão, inclusive entre os candidatos à Presidência da República, é qual será a contribuição do setor público para que o país consiga suprir todas as suas necessidades de investimentos em infraestrutura produtiva e social.

Puxada pelo setor privado, a taxa de investimento da economia brasileira passou de 14,3% do PIB (Produto Interno Bruto) no segundo trimestre de 2017 para 18,7% no mesmo período de 2022. Apesar da recuperação, o número está há nove anos abaixo do recorde de 21,5% verificado em 2013, época em que o desempenho do indicador era puxado pelo governo federal e pelas empresas estatais.

Naquela época, os investimentos em infraestrutura públicos e privados chegaram ao equivalente a R$ 208 bilhões (a preços de 2021). No ano passado, foram R$ 148 bilhões, aquém da necessidade anual de R$ 374 bilhões para os próximos dez anos, segundo estimativa da Abdib (Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base).

Para a entidade, não será possível alcançar tal cifra apenas contando com recursos privados, uma vez que muitos projetos não têm retorno econômico --caso de boa parte da malha rodoviária que ainda não foi privatizada.

"Não adianta querer jogar tudo para o setor privado, porque o setor privado não tem apetite, em função de rentabilidade e risco, para todas as necessidades. O mercado de capitais privado sozinho não é suficiente. Vai precisar do BNDES", afirma Roberto Figueiredo Guimarães, diretor de planejamento e economia da Abdib.

Ele cita ainda dados do IBGE que mostram que o investimento total no segundo trimestre deste ano apresentou queda em relação ao quarto trimestre do ano passado. Guimarães diz que o indicador deve ficar estável no segundo semestre, diante de muitas incertezas que estão levando ao adiamento de projetos.

"Muitas decisões de investimento estão sendo postergadas. A gente não acredita que seja por questões políticas. É mais pela questão econômica: crise mundial, crise brasileira, taxa de juros muito alta, preços de insumos", afirma.

Grande parte da contração do investimento durante a recessão de 2014-2016 está ligada ao setor de construção civil, principal componente desse indicador. O setor perdeu participação no investimento de 52% (2014) para 44% (2019, último dado do IBGE disponível).

Com isso, cresceu o peso de itens como máquinas e equipamentos (de 37% para 41%) e investimentos de propriedade intelectual (de 10% para 13%), como criação de softwares e pesquisa e desenvolvimento.

Na divulgação do segundo trimestre de 2022, ainda sem números consolidados, o IBGE destacou o crescimento da construção e softwares.

A abertura desses dados feita pelo Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da FGV) mostra que o crescimento acumulado em 12 meses da construção foi de 6,8% até junho deste ano, enquanto o item máquinas e equipamentos encolheu 0,8% --em uma tendência de desaceleração vista desde setembro do ano passado.

"Máquinas e equipamentos deram um salto em 2021. Houve investimento naquele momento, tanto de nacionais como de importadas, mostrando que entraram novas tecnologias. No período mais recente, voltou a ficar negativo", afirma Claudio Considera, coordenador de Contas Nacionais do FGV Ibre.

"O que aconteceu agora foi graças à construção, que subiu um pouco no período mais recente."

Considera afirma que ainda não vê uma clara recuperação do investimento no Brasil. Segundo ele, os períodos em que houve recorde na formação bruta de capital fixo foram aqueles em que havia grandes obras feitas pelo governo. Agora, há uma expectativa de que mudanças regulatórias e concessões ajudem a melhorar o indicador.

"Provavelmente vai ter investimento agora em função do marco do saneamento e das concessões de aeroportos. São coisas que poderão vir, não significa que já temos isso."

Candidatos discordam sobre papel do Estado

Em um momento em que o investimento público alcança os menores patamares desde o fim da hiperinflação, os candidatos à Presidência da República têm dado atenção especial ao tema, mas com propostas divergentes sobre o papel do governo federal e dos bancos públicos.

O investimento público federal caiu 65% na comparação entre 2010 e 2021, descontada a inflação, segundo a Abdib. Os valores apontados no Orçamento indicam novas quedas em 2022 e 2023, quando deve chegar ao piso de R$ 22,4 bilhões.

Dados do Observatório de Política Fiscal da FGV mostram que o total passou de 1,94% do PIB em 2017 para 2,05% no ano passado, os menores valores da série histórica iniciada em 1947, considerando também estados, municípios e estatais federais. Desde 2016, os gastos não têm sido suficientes nem para repor a depreciação dos ativos, como a manutenção de pontes e rodovias. No ano passado, essa perda foi de R$ 31 bilhões.

O programa de governo do candidato Jair Bolsonaro (PL) destaca o papel do governo de ampliar o processo de desestatização e concessões da infraestrutura e garantir segurança jurídica, por meio da implementação de marcos legais. Também fala em melhorar a infraestrutura nas regiões menos desenvolvidas. O BNDES não é citado no documento entregue ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

O ex-presidente Lula (PT) defende em seu programa um "vigoroso programa de investimentos públicos", com o fortalecimento do BNDES na oferta de crédito e garantias em projetos e a retomada de obras importantes que foram paralisadas. Também fala em elevar a taxa de investimentos públicos e privados --este último, estimulado por meio de crédito, concessões, parcerias e garantias.

O candidato Ciro Gomes (PDT) defende o papel do BNDES como financiador e estruturador de projetos e propõe a criação de um fundo para investimento em infraestrutura. O programa fala em estimular o setor privado a investir fortemente no país, ampliar o investimento público, com impulso à construção civil, e retomar 14 mil obras licitadas paralisadas ou não iniciadas.

A equipe da candidata Simone Tebet (MDB) calcula que a modernização da infraestrutura brasileira demandará um aumento nos investimentos públicos, "corretamente priorizados e executados", dentro dos limites de responsabilidade fiscal, de 0,5% para estimados 0,9% do PIB, e dos investimentos privados de 1% para ao menos 2,8% do PIB. Também defende manter o programa de concessões e privatizações, ampliar a participação dos mercados de capitais no financiamento e utilizar o BNDES como estruturador de projetos.

O QUE DIZEM OS PROGRAMAS DE GOVERNO

Lula (PT)

Elevar a taxa de investimentos públicos e privados

Investimento privado estimulado com crédito, concessões, parcerias e garantias

Fortalecimento do BNDES (na oferta de crédito a longo prazo e garantias em projetos)

Recompor o papel indutor e coordenador do Estado e das empresas estatais

Jair Bolsonaro (PL)

Ampliar o processo de desestatização e concessões da infraestrutura

Garantir segurança jurídica, por meio da implementação de marcos legais

Melhoria da infraestrutura nas regiões menos desenvolvida

BNDES não é citado, mas tem atuado como estruturador de projetos

Ciro Gomes (PDT)

BNDES como financiador e estruturador de projetos

Fundo para investimento em infraestrutura

Ampliar investimento público, com impulso à construção civil

Retomar 14 mil obras licitadas paralisadas ou não iniciadas

Estimular o setor privado a investir fortemente no país

Simone Tebet (MDB)

Praticamente dobrar os investimentos públicos e triplicar os privados

Manter programa de concessões e privatizações

Ampliar a participação dos mercados de capitais no financiamento

BNDES como estruturador de projetos

Fonte: Programas de governo entregues ao TSE


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