SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O que o mandato do presidente Jair Bolsonaro (PL) e dos ex-presidentes Michel Temer (MDB), Dilma Rousseff (PT) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) têm em comum entre si?

Em todos eles, as ações do índice Ibovespa dos setores de commodities, bancos e consumo estiveram entre as que mais se valorizaram na Bolsa de Valores brasileira, segundo levantamento da plataforma TradeMap. Os dados consideram as ações que faziam parte do Ibovespa, principal índice da Bolsa, na data final de cada governo.

Ciclos de alta nos preços das matérias-primas por motivos variados, como o crescimento da China e a retomada pós-Covid, contribuíram para o destaque dos papéis de commodities, enquanto os bancos se beneficiaram tanto dos momentos de alta quanto de baixa da taxa básica de juros.

"Entra governo, sai governo, os grandes vencedores da Bolsa nos últimos 20 anos foram, de um lado, as commodities, e de outro, o setor financeiro, o que faz todo sentido, considerando o ambiente macroeconômico no período", diz Sérgio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados.

Ainda segundo o economista, a perspectiva de um crescimento econômico baixo do PIB (Produto Interno Bruto) do país em 2023 e os níveis elevados nos quais os preços das commodities continuam sendo negociados devem fazer com que as exportadoras de matérias-primas voltem a se destacar no mercado acionário local nos próximos meses.

Já no caso do setor financeiro, o analista da Necton Rodrigo Barreto afirma que os bancos têm a habilidade de navegar bem tanto em ambientes mais positivos para a economia brasileira como em situações em que o ritmo de crescimento é mais modesto.

Isso porque, em cenários de pujança econômica, em que os juros costumam estar em patamares menores em relação à média histórica, os bancos conseguem ganhar dinheiro no aumento do volume transacionado. E, quando a inflação dispara e os juros sobem, cai o volume transacionado mas aumenta o spread, que é o quanto o banco cobra para emprestar dinheiro para os clientes, diz o especialista.

"Os bancos são muito resilientes e representam uma opção segura aos investidores em qualquer momento", diz Barreto.

O setor de consumo, por sua vez, viveu seus melhores dias na Bolsa quando a economia brasileira se encontrava mais aquecida, com os juros em patamares mais moderados, ou em momentos em que os governos adotaram medidas extraordinárias para estimular o consumo, como o Bolsa Família no governo Lula e a liberação do FGTS durante o governo Temer.

Além dos ciclos econômicos, a presença importante dos setores na economia brasileira, e dentro da própria Bolsa, são igualmente responsáveis pelo resultado apresentado ao longo dos últimos mandatos presidenciais.

"No governo Bolsonaro, temos as commodities entre os principais destaques positivos, o que tem muita relação com a retomada da demanda global pós-Covid, bem como com os problemas de logística que dificultaram a oferta", afirma João Frota Salles, analista da Senso Investimentos.

A petroleira privada PetroRio liderou os ganhos das ações do Ibovespa entre 31 de dezembro de 2018 e 9 de setembro de 2022, com uma rentabilidade acumulada em torno de 1.300% no intervalo.

Eneva e Copel, de energia, o frigorífico Minerva e a SLC Agrícola também despontam entre as maiores altas do Ibovespa nos últimos quatro anos.

Sales acrescenta que o setor financeiro, por meio de nomes como BTG Pactual e Banco Pan, também foi outro destaque positivo sob o mandato de Bolsonaro, em meio à queda dos juros em razão da pandemia e à adoção pelo governo de pacotes de benefícios para incentivar a demanda, e, portanto, o crédito.

Ponto fora da curva, a fabricante de computadores Positivo, diz Vale, da MB, pode ter se destacado pela distribuição de dinheiro feita nos momentos mais agudos da pandemia, com a população trancada dentro de casa se valendo da medida para adquirir bens de consumo.

Sob o governo de Michel Temer, o principal destaque ficou com os papéis da varejista Magazine Luiza, com uma alta de cerca de 2.300% em pouco mais de dois anos, entre agosto de 2016 até o final de 2018.

No período, a taxa Selic encostou na então mínima histórica de 6,5% ao ano, o que serviu como incentivo para o aumento dos gastos da população com viagens, refletido também na presença das ações da Gol e da CVC entre as maiores altas do Ibovespa.

O economista da MB Associados afirma que os programas de distribuição de renda, com a liberação do saque do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), também deram sua contribuição para os destaques do setor de consumo.

De toda forma, as grandes produtoras de commodities e o setor financeiro, via BB (Banco do Brasil), novamente se fazem presentes entre os principais destaques do período.

No segundo mandato de Dilma Rousseff, o setor financeiro se beneficiou do pico da taxa Selic, que chegou a alcançar os 14,25% ao ano, com a cobrança de juros maiores dos clientes, o que favoreceu papéis de empresas como B3 e Santander Brasil.

Além disso, a demanda crescente por bens essenciais de consumo, como os medicamentos, ajudou a sustentar ganhos destacados de ações como RaiaDrogasil e Hypera, bem como de empresas que atuam no setor de utilidades públicas, tais como Sabesp, Equatorial e Energias do Brasil.

Segundo Enrico Cozzolino, chefe de análise e sócio da Levante Investimentos, os governos Dilma podem ser sintetizados por políticas de fomento ao consumo e incentivo à indústria, junto ao investimento em setores de infraestrutura.

"Dessa forma, é possível ver um crescimento muito mais diversificado dos ativos da Bolsa. Entretanto, todos atrelados com alguma frente das políticas adotadas no período", diz Cozzolino.

Já durante o primeiro mandato da petista, a dobradinha setor financeiro --com Cielo e Bradesco-- e commodities, via BRF e JBS, voltou a se repetir. Consumo, com Ambev e Lojas Americanas, e educação, via Yduqs (antiga Estácio), também se destacaram no período.

Barreto, da Necton, afirma ainda que o desempenho destacado da TIM, e também da Telefônica Brasil, que avançou quase 60% no primeiro mandato da petista, foi beneficiado pela implementação do PNBL (Programa Nacional de Banda Larga), que visava promover a inclusão digital e massificar o acesso à internet no país.

Já nos governos do ex-presidente e favorito nas eleições deste ano, segundo as pesquisas de intenção de voto, o superciclo das commodities deixou as exportadoras, mais uma vez, entre as maiores altas da Bolsa local.

CSN, MMX, e Vale, além da concessionária CCR, marcaram as principais valorizações no segundo mandato do governo Lula.

Souza Cruz, Ambev e Lojas Renner, do setor de consumo, por sua vez, foram nomes que também conseguiram se destacar entre 2006 e 2010.

"O crescimento econômico do período e os programas sociais, como o Bolsa Família, que fomentaram o consumo, começaram a favorecer empresas do setor de varejo", diz Cozzolino.

Ele acrescenta que, no segundo mandato de Lula, o lançamento do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) contribuiu para a continuidade do momento positivo para as commodities e para os papéis de infraestrutura, como da CCR.

Barreto, da Necton, afirma ainda que nomes de energia elétrica, como Transmissão Paulista e Eletropaulo, despontaram em um cenário de ascensão da classe média, que trouxe uma demanda crescente por energia, e, consequentemente, a necessidade de investimentos na área para evitar a possibilidade de apagões.

Já Usiminas e Gerdau, além de novamente CSN e CCR, foram os destaques no primeiro mandato do petista.

"O movimento de boom de commodities está atrelado ao alto crescimento da China no período", diz Cozzolino, da Levante. "A demanda por materiais básicos para sustentar a construção civil chinesa fomentou a alta dos preços em toda a América Latina."

Na avaliação de especialistas do mercado, caso o ex-presidente confirme os prognósticos e volte para um terceiro mandato, papéis de construtoras voltadas à baixa renda e de educação, além das commodities, são apontadas como as prováveis vencedoras da Bolsa.

Já se o cenário a se confirmar à frente for de uma reeleição do atual mandatário, analistas apostam que as estatais Petrobras e BB devem ter um bom desempenho, com a continuidade da política econômica liberal e a possibilidade de novas privatizações.


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