BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avalia propor um sistema de avaliação dos servidores públicos federais, ao alcance dos próprios cidadãos, como um dos pilares de sua reforma administrativa caso vença as eleições.
Outros pontos que norteiam a proposta são o aprofundamento da transição digital, a modernização do formato dos concursos públicos e o combate ao assédio moral e sexual na administração federal. Um programa de qualificação dos funcionários deve ser um dos temas tratados nas mesas de negociação com as categorias, que devem ser retomadas.
A alteração das estruturas de carreira também é defendida por integrantes da campanha. A ideia é aumentar o número de degraus entre o salário inicial e o do término das carreiras -hoje, alguns servidores levam poucos anos para atingir a remuneração máxima. Mexer na estabilidade dos servidores, porém, é algo descartado pela equipe de Lula.
Em conversas com interlocutores, aliados do petista sinalizaram que a mudança nas carreiras deve valer apenas para novos servidores, ou seja, aqueles que ingressarem na carreira após sua aprovação. Dessa forma, os atuais funcionários não seriam atingidos por essa alteração.
Para implementar essas propostas, a campanha trabalha com um cenário de recriação do Ministério do Planejamento, extinto no governo Jair Bolsonaro (PL) e cujas funções foram integradas ao atual Ministério da Economia.
A reforma administrativa foi defendida por Lula em evento com empresários promovido pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) no início de agosto. Os detalhes, porém, não foram divulgados oficialmente pela campanha.
"Vamos ter que fazer uma reforma administrativa, sim. Tem pouca gente ganhando muito e muita gente ganhando pouco. É preciso moldar a burocracia a uma nova cultura", disse o petista na ocasião.
A revisão das regras do serviço público é considerada, fora do governo, uma medida essencial para torná-lo mais eficiente e ao mesmo tempo gerar economia de recursos no futuro.
Desde o governo Michel Temer (MDB), há o diagnóstico de que, em muitas carreiras, poucos degraus separam um servidor iniciante do topo salarial da categoria. Isso acaba, na visão de alguns técnicos, reduzindo incentivos para o constante aprimoramento.
De lá para cá, no entanto, uma reforma dessa estrutura, de maneira a ampliar o número de etapas para ascensão na carreira, nunca saiu do papel.
Bolsonaro enviou ao Congresso Nacional uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que buscava alterar a estrutura administrativa. O texto, polêmico, flexibilizava a estabilidade de boa parte dos servidores, preservando apenas as categorias consideradas de Estado, como auditores da Receita Federal e policiais federais.
A proposta enfrentou diversas críticas, não só por mexer na estabilidade, mas também por excluir membros do Judiciário e do Legislativo das medidas mais duras, como corte de penduricalhos que turbinam os salários e ajudam a driblar o teto remuneratório (hoje em R$ 39,3 mil mensais).
Nos governos petistas, os servidores federais tiveram ampla valorização salarial. Houve também grande número de concursos públicos. Só nos dois mandatos de Lula, o número de vínculos de servidores civis saiu de 371,8 mil em 2003 para um pico de 794,2 mil em 2010, segundo dados compilados pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
O histórico alimenta a incerteza no mercado financeiro sobre qual será a reforma administrativa proposta pelo petista, caso ele seja eleito. Integrantes da campanha, por sua vez, ressaltam que, mesmo com a valorização, o gasto com pessoal se manteve entre 4,3% e 4,5% do PIB (Produto Interno Bruto).
"Esse tema a gente trata dentro da discussão de reforma do Estado. Não estamos discutindo só uma nova estrutura de carreiras ou qualquer coisa desse tipo. O foco é sempre melhorar a qualidade e a entrega do serviço público para a população", afirma o economista Guilherme Mello, coordenador do Napp (Núcleo de Acompanhamento de Políticas Públicas) Economia da Fundação Perseu Abramo e que colabora com o programa do PT.
"Isso passa por valorizar os profissionais, por uma qualificação e capacitação permanente, também por modernizar o formato dos concursos públicos, constituir um sistema de gestão de desempenho bem estruturado, capacitar lideranças", diz.
Mello não descarta modificações do ponto de vista de carreira e salários, embora evite dar detalhes sobre quais mudanças seriam feitas.
"Não estou falando que não tem nada a se fazer do ponto de vista de carreira, de salários, é óbvio que tem. Mas isso tem que ser discutido dentro desse espaço de diálogo e negociação, para construir saídas pactuadas entre as partes e que visem à melhoria da qualidade do serviço, não só de gasto", diz.
Por parte dos atuais servidores, há também uma expectativa de reabertura do diálogo para a concessão de reajustes. A maior parte das carreiras, com 1 milhão de funcionários, está com salários congelados desde o início de 2017.
A interlocutores, integrantes da campanha de Lula têm manifestado a preferência por fazer a reforma via projetos de lei, sem necessidade de uma PEC.
A avaliação de gestão e desempenho, por exemplo, já está prevista na Constituição e pode ser regulamentada via projeto de lei complementar. A reestruturação das carreiras também pode ser feita via projeto de lei.
As mesas de negociação, por sua vez, podem tratar não só da questão remuneratória, mas também de um programa para a capacitação dos servidores, inclusive por meio da oferta de cursos e qualificações pelas escolas de governo.
A discussão de ferramentas para o combate ao assédio moral, institucional e sexual também é uma preocupação dos integrantes da campanha. O episódio envolvendo o ex-presidente da Caixa, Pedro Guimarães, demitido após funcionárias o acusarem de assédio sexual, é considerado emblemático e um retrato do tipo de conduta que deve ser coibida.
A equipe de Lula também pretende aprofundar a transição digital da administração pública, que ganhou impulso diante da necessidade de atender a população de forma remota durante a pandemia de Covid-19. Nos planos da equipe, esse pilar envolve o fortalecimento da governança de dados (para evitar vazamentos de informações sensíveis da população), a inovação e o atendimento humanizado aos cidadãos.
O PT também quer usar a reforma administrativa para ligar as recomendações de boas práticas na administração pública ao cumprimento de metas de desenvolvimento inclusivo e sustentável. A chapa de Lula aposta nessa agenda para ajudar na retomada da credibilidade do país não só na área econômica, mas perante a comunidade internacional.
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PROPOSTAS DOS CANDIDATOS PARA A REFORMA ADMINISTRATIVA
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA (PT)
Propõe um sistema de avaliação dos servidores, ao alcance dos cidadãos. Também prevê mudança na estrutura das carreiras, aumentando o número de degraus entre o salário inicial e a remuneração final. Planeja manter a estabilidade funcional. Outro ponto em discussão é a retomada das mesas de negociação com as categorias, para discutir salários, iniciativas de capacitação e ferramentas de combate ao assédio no ambiente de trabalho. Prevê aprofundar a transformação digital da administração pública.
JAIR BOLSONARO (PL)
Propõe o aperfeiçoamento de planos de cargos e salários para incentivar o servidor, assim como o reconhecimento de seus talentos, suas potencialidades e a realização de suas promoções por mérito, fruto de avaliações que incentivem o cumprimento de metas. Durante seu primeiro mandato, enviou PEC propondo flexibilização da estabilidade e novas formas de ingresso no serviço público.
CIRO GOMES (PDT)
Propõe a obrigatoriedade de processos seletivos baseados em competências na ocupação de cargos e funções de liderança. Também promete articular uma "Lei de Qualidade do Gasto", que exigiria planejamento orçamentário focado na qualidade do gasto público.
SIMONE TEBET (MDB)
Defende promover uma reforma administrativa que torne o Estado mais eficiente, ágil, produtivo e amigável para o cidadão, com objetivo de ampliar e melhorar a oferta de serviços públicos.
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