SÃO PAULO, SP, E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Diante da falta de propostas claras sobre políticas e reformas econômicas dos candidatos Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro à Presidência da República, o jornal Folha de S.Paulo realizou um levantamento das principais ações adotadas durante os governos do PT (2003-2016) e na atual gestão (2019-2022).

Obviamente, não há garantia de que essas políticas irão se repetir --e alguns leitores certamente desejarão que muitas delas não se repitam.

Em alguns casos, os três governos analisados (Lula, Dilma Rousseff e Bolsonaro) promoveram mudanças profundas em suas ações na área econômica na segunda metade de suas gestões. Especialmente quando próximos do período eleitoral ou durante crises políticas e/ou econômicas.

Divididos em 14 tópicos, são abordados temas como política fiscal, reformas tributária, trabalhista e da Previdência, relação com órgão estatais e políticas de distribuição de renda, em um período que engloba a maior parte dos últimos 20 anos.

MEDIDAS ADOTADAS POR CADA GOVERNO MOSTRAM PREFERÊNCIAS NA ECONOMIA

POLÍTICA FISCAL

LULA

2003-2006: Governo eleva a meta de superávit do setor público, entrega resultados próximos a 3,5% do PIB e reduz a dívida bruta. Aumento de arrecadação compensa alta da despesa. Ministros Dilma Rousseff e Guido Mantega barram tentativa da equipe econômica de aprofundar ajuste fiscal

2007-2010: Crise de 2008/2009 acelera processo de expansão de gastos. Arrecadação é recorde, mas superávits ficam menores (3% do PIB, em média). Governo tira estatais da contabilidade pública. Brasil ganha selo de bom pagador (investment grade). É lançado o PAC

DILMA

2011-2014: Desaceleração econômica e benefícios fiscais reduzem receitas. Despesa cresce e superávits caem, mas são obtidos com medidas classificadas como contabilidade criativa. Estatais bancam despesas do Tesouro (pedaladas fiscais). Em 2014, o país entra em recessão e as contas, no vermelho

2015-2016: Déficit nas contas públicas se aprofunda com queda de receitas e aumento de despesas, principalmente do INSS. Aumento da dívida bruta para 68% do PIB (72% na metodologia do início do governo Lula). Tentativa de ajuste fiscal é barrada no Congresso, que aprova "pautas bombas"

BOLSONARO

2019-2022: Governo não cumpre promessa de zerar déficit em 2019. Pandemia leva a despesa recorde em 2020. Constituição é alterada em 2021 e 2022 para permitir furos no teto de gastos e ajudar na reeleição. Despesa é a menor desde 2014, com gasto menor em servidor, INSS e investimento

DESONERAÇÕES E INCENTIVOS

LULA

2003-2006: Aprovação da Lei do Bem e Lei de Inovação Tecnológica

2007-2010: Promoção de desonerações para compra de veículos e outros bens e para operações de crédito a partir de 2008

DILMA

2011-2014: Desoneração da cesta básica e aprovação do Plano Brasil Maior (com desoneração da folha de pagamentos de alguns setores, instituição do programa Inovar-Auto, criação de regimes fiscais diferenciados e concessão de isenção tributária a produtos)

2015-2016: Em 2015 e 2016, conta de subsídios bate recorde. Gasto tributário atinge pico de 4,5% do PIB com desonerações aprovadas em anos anteriores

BOLSONARO

2019-2022: Depois de reduzir gasto tributário nos três primeiros anos, presidente anuncia benefícios às vésperas da eleição. Também renova e passa a defender desoneração da folha de pagamento para mais setores

SALÁRIO MÍNIMO

LULA

2003-2006: Salário mínimo cresce 35% acima da inflação com política de valorização

2007-2010: Medidas provisórias garantem correção pelo INPC mais crescimento do PIB e antecipação de reajuste para 1º de janeiro (aumento real de 17% no período)

DILMA

2011-2014: Regra de correção do mínimo vira lei e aumento fica 12% acima da inflação até 2014

2015-2016: Reajuste fica 4% acima da inflação. Nova lei garante regra de correção até 2019

BOLSONARO

2019-2022: Com o fim da política de ganho real em 2019, o mínimo tem reajuste de acordo com a inflação

REAJUSTE DE SERVIDORES

LULA

2003-2006: Redução na despesa com pessoal de 4,8% para 4,4% do PIB, com governo segurando reajustes no início do mandato

2007-2010: Despesa com pessoal estável em relação ao PIB, com concessão de reajustes maiores e contratação de mais servidores

DILMA

2011-2014: Redução na despesa com pessoal para 3,8% do PIB

2015-2016: Elevação na despesa com pessoal para 4,1% do PIB. Aprovados acordos de reajuste que seriam implementados no governo Michel Temer

BOLSONARO

2019-2022: Redução na despesa de pessoal (3,8% do PIB) e no número de servidores. Aplicados reajustes anunciados por Temer e novos aumentos para militares

REFORMA DA PREVIDÊNCIA

LULA

2003-2006: Aprovadas contribuição de inativos e pensionistas, alteração nas regras de paridade, integralidade e pensão de servidores, previdência complementar do funcionalismo, elevação do limite do salário de contribuição e benefício e novas regras de idade mínima para servidores

2007-2010: É criado o Fórum Nacional de Previdência Social para debater novas propostas

DILMA

2011-2014: Criação da Funpresp (Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal) e aprovação de emenda sobre regras de aposentadoria por invalidez para servidores

2015-2016: Aumento da aposentadoria compulsória dos servidores públicos de 70 para 75 anos de idade e mudança nas regras de pensão por morte, auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e auxílio-reclusão, com flexibilização do fator previdenciário

BOLSONARO

2019-2022: Reforma da Previdência com idade mínima de 65/62 (homem/mulher) para novos entrantes e regra de transição para os demais, novo cálculo das aposentadorias, novas regra de pensão por morte e limitação de acúmulo de benefícios

REFORMA TRIBUTÁRIA

LULA

2003-2006: Aprova a prorrogação da CPMF de 0,38% sobre as transações financeiras até 2007, a criação do Simples Nacional e a introdução da não-cumulatividade na Cofins

2007-2010: Congresso extingue a CPMF em 2007, e governo eleva IOF para manter arrecadação. Governo apresenta proposta para unificar tributos sobre o consumo, abandonada no ano seguinte

DILMA

2011-2014: Governo discute simplificação de tributos, mas desiste de proposta por falta de acordo

2015-2016: Proposta de recriação da CPMF com alíquota de 0,20%, que não chegou a ser votada

BOLSONARO

2019-2022: Governo é contra propostas da Câmara e Senado sobre tributação do consumo. Envia projeto de fusão do PIS/Cofins e propõe tributação de dividendos e correção da tabela (parados no Congresso)

REFORMA TRABALHISTA

LULA

2003-2006: Novos direitos para empregado doméstico (como descanso remunerado e férias de 30 dias), mas com veto a FGTS, multa de 40% e seguro desemprego. Regulação de prestadores de serviço como PJ. Lei do seguro defeso. Programa Primeiro Emprego

2007-2010: Criação do MEI. Ratifica lei que permite trabalho aos domingos e feriados aos empregados do comércio. Regulamentação do estágio. Lei da empresa cidadã, com licença maternidade opcional de seis meses. Autoriza redução do intervalo intrajornada

DILMA

2011-2014: Amplia direitos dos trabalhadores domésticos, com FGTS, multa de 40%, seguro desemprego etc.. Aumento do aviso prévio. Criação da certidão negativa de débitos trabalhistas. Regulamentação do vínculo no trabalho à distância

2015-2016: Mudança no período de carência para acesso ao seguro-desemprego

BOLSONARO

2019-2022: Lei da Liberdade Econômica traz novas regras de registro de ponto e a emissão de carteira de trabalho eletrônica. Adoção de programa emergencial de emprego durante a pandemia. Aprovação de regras alternativas em períodos de calamidade. Redução do número de normas.

REFORMA ADMINISTRATIVA

LULA

2003-2006: Promove reorganização da estrutura administrativa e das carreiras de servidores. Número de ministérios e órgãos da Presidência sobe de 28 para 36

2007-2010: Proposta para serviço público federal de saúde e outras áreas adotem modelo de fundação estatal de direito privado para aplicar regras da CLT. O projeto não foi adiante

DILMA

2011-2014: Número de ministérios e órgãos da Presidência chega ao recorde de 40

2015-2016: Reforma extingue oito ministérios, corta 3.000 cargos comissionados e 30 secretarias, reduz em 10% salários de presidente, vice e ministros e em até 20% gastos de custeio

BOLSONARO

2019-2022: Proposta que está travada no Congresso proíbe progressões automáticas de carreira, gratificações por tempo de serviço e flexibiliza estabilidade de boa parte dos novos servidores

AUTONOMIA DO BANCO CENTRAL

LULA

2003-2006: Henrique Meirelles assume o BC com autonomia informal. Lula minimiza importância de instituição independente e diz que essencial é ter BC "sério" e política monetária sem "aventuras"

2007-2010: Meirelles é mantido no comando do BC. Posteriormente, diz que Lula garantiu, na prática, o respeito à independência da instituição

DILMA

2011-2014: Tombini assume e diz ter recebido garantia de plena autonomia para perseguir objetivos da política monetária, mas surgem sinais de interferência em decisões. Dilma diz que não é necessário dar autonomia ao BC

2015-2016: Postura do presidente do BC na véspera de reunião do Copom levanta suspeitas de influência política na decisão da autoridade sobre os juros. Credibilidade do BC fica abalada

BOLSONARO

2019-2022: É sancionada em fevereiro de 2021 lei que dá autonomia ao BC, com criação de mandatos fixos para presidente e diretores, renovados apenas uma vez e não coincidentes com o do presidente da República

BENEFÍCIOS ASSISTENCIAIS

LULA

2003-2006: Bolsa Família é criado em 2003 e vira lei no ano seguinte. É um programa de transferência de renda condicionada (exigia cumprimento de medidas como vacinação e frequência escolar). Tem como público-alvo famílias em situação de extrema pobreza (renda familiar mensal de até R$ 89 por pessoa) e pobreza (renda per capita entre R$ 89 e R$ 178 por mês)

2007-2010: Minha Casa Minha Vida é criado em 2009 para facilitar o acesso de famílias com menor poder aquisitivo à moradia no Brasil. As concessões de benefícios são feitas por faixa de renda. As famílias que recebem até três salários mínimos por mês contam com subsídio integral do governo e são foco do governo nos primeiros anos do programa

DILMA

2011-2014: Brasil sem Miséria (2011). Um de seus pilares consiste na busca ativa dos que estavam fora do CadÚnico e na ampliação das ações de acesso à renda. Lançamento do Brasil Carinhoso em 2012 (Benefício para Superação da Extrema Pobreza, como complementação de renda para famílias com crianças de zero a seis anos incompletos do Bolsa Família)

2015-2016: Presidente veta reajuste do Bolsa Família em janeiro de 2016, justificando que o aumento não estava previsto no projeto de Lei Orçamentária. Em maio, anuncia aumento de 9%, levando o benefício médio para R$ 176. Naquele ano, o programa atendia 13,9 milhões de famílias, com gasto de 0,47% do PIB

BOLSONARO

2019-2022: Auxílio Brasil substitui Bolsa Família em novembro de 2021, com valor médio de R$ 217. Sobe para R$ 400 com aprovação da PEC dos Precatórios e para R$ 600 às vésperas da eleição (com autorização de consignado). Na corrida eleitoral, cria auxílio para caminhoneiros e taxistas e dobra vale-gás. Casa Verde e Amarela substitui Minha Casa Minha Vida

USO DOS BANCOS PÚBLICOS

LULA

2003-2006: Caixa e BB atuam no processo de ampliação da oferta de acesso ao crédito e em uma política de ampla bancarização, com a concessão de microcrédito e consignado. As instituições públicas aumentaram seu volume de crédito de 9,1% para 11,9% do PIB entre 2003 e 2006

2007-2010: Em meio à crise de 2008, BB e Caixa reduzem taxas de juros. Bancos públicos participam de estratégia para evitar colapso da economia e socorrem instituições privadas. Em 2009, há troca no comando do BB para implementar política mais agressiva de aumento e crédito

DILMA

2011-2014: Em 2012, sob determinação do governo, BB e Caixa cortam juros para tentar influenciar o restante do mercado. Presidente aposta na emissão de dívida pública para capitalizar instituições financeiras federais e defende fortalecimento dos bancos públicos

2015-2016: Em 2016, lei autoriza BB, Caixa e subsidiárias a comprar ativos de instituições financeiras públicas ou privadas, além de empresas dos ramos de seguros, previdenciário e de capitalização

BOLSONARO

2019-2022: Presidente promete reduzir participação de bancos públicos no crédito. Apesar do recuo, Caixa e BB se mantêm dominantes em alguns segmentos, como habitacional. Na eleição, Caixa é usada para reforçar programas sociais, com anúncios de potencial impacto eleitoral

ATUAÇÃO DO BNDES

LULA

2003-2006: BNDES atua na expansão do crédito de longo prazo a empresas de infraestrutura, energia e indústria em geral e financia obras no exterior das principais empreiteiras brasileiras. Em 2003, desembolsa R$ 35,2 bilhões para investimento produtivo

2007-2010: PSI (Programa de Sustentação do Investimento) é criado em 2009, operado por meio de repasses do BNDES. O governo oferece linhas de crédito com juros mais baixos para a aquisição de produtos destinados a aumentar a produção

DILMA

2011-2014: Entre 2008 e 2014, o BNDES recebe aporte de R$ 400 bilhões do Tesouro Nacional e, com o caixa reforçado, oferece crédito a baixo custo para grandes empresas. Desembolsos para investimento produtivo chegam a R$ 190 bilhões em 2013

2015-2016: BNDES desembolsa R$ 136 bilhões para projetos de investimento em 2015. Câmara dos Deputados cria CPI para investigar atuação da instituição financeira desde 2003

BOLSONARO

2019-2022: BNDES contrata auditoria para investigar operações de 2005 a 2018, mas não encontra indícios de corrupção. A instituição financeira reduz volume de crédito, atua na estruturação de projetos e devolve recursos ao Tesouro

PRIVATIZAÇÕES E CONCESSÕES

LULA

2003-2006: Em 2004, projeto de lei institui as PPPs (Parcerias Público-Privadas). Nessa modalidade, o agente privado arca com os riscos e as responsabilidades de gestão, e a remuneração é vinculada ao desempenho e à demanda pelo serviço

2007-2010: Sete rodovias federais são concedidas à iniciativa privada em outubro de 2007. Governo coloca na gaveta plano de privatizar Eletrobras e freia venda de distribuidoras, mas segue com leilões de transmissão e geração. Destaca-se o leilão da Usina de Belo Monte, em 2010

DILMA

2011-2014: No setor de energia, são feitos leilões de linhas de transmissão e hidrelétricas, como a concessão da usina de Três Irmãos (SP). De 2011 a 2014, são concedidos seis aeroportos. Com leilões de Confins (MG) e Galeão (RJ), governo arrecada R$ 20,8 bilhões

2015-2016: Nova etapa do PIL (Programa de Investimento em Logística), adotando o modelo de outorga. A expectativa é atrair a iniciativa privada para investir cerca de R$ 200 bilhões no setor de infraestrutura em concessões de portos, ferrovias, rodovias e aeroportos

BOLSONARO

2019-2022: Além de privatizar a Eletrobras, governo promove leilões de distribuidoras, como a CEB (Brasília) e a CEA (Amapá). Caixa, Petrobras e BB passam por processo de venda de ativos (R$ 91,3 bilhões em 2019). Plano de privatização da Petrobras fica em segundo plano

AGÊNCIAS REGULADORAS

LULA

2003-2006: Depois de se dizer surpreendido por reajustes das tarifas telefônicas e de energia elétrica e dos preços de combustíveis, o presidente tem intenção de mudar o papel das agências reguladoras. No ano seguinte, envia projeto de lei ao Congresso que prevê a transferência de parte do poder das agências para os ministérios. O projeto conhecido como Lei Geral das Agências Reguladoras não avança

2007-2010: Aparelhamento político das agências reguladoras marca os dois mandatos do presidente, apesar das negativas veementes dos órgãos e dos próprios indicados. Alguns gestores escolhidos têm pouca familiaridade com as entidades que representam

DILMA

2011-2014: Em 2013, a presidente decide arquivar o projeto da Lei Geral das Agências Reguladoras proposto por Lula, que estava sendo analisado pelos parlamentares há mais de oito anos. Ao anunciar a retirada da proposta que definia as atribuições das agências reguladoras, ela diz que a legislação da época basta

2015-2016: Lei Geral das Agências Reguladoras volta à pauta no Congresso em 2015. A proposta, que faz parte da chamada Agenda Brasil, estabelece regras relativas a gestão, organização e mecanismos de controle social das agências reguladoras federais, incluindo Anatel e Ancine

BOLSONARO

2019-2022: Presidente sanciona lei das agências reguladoras e veta lista tríplice para seleção de integrantes dos órgãos. Neste ano, indica 21 nomes para as cúpulas das agências e das autarquias federais, entre eles um advogado amigo do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ)


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