BRASÍLIA, DF, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Com o resultado da eleição presidencial no primeiro turno, grandes empresários do setor produtivo e financeiro avaliam como se posicionar em uma disputa política que, para eles, parece cristalizada entre os mais pobres, principais eleitores de Lula (PT), e os mais ricos, que escolheram Jair Bolsonaro (PL).

Esse impasse levou nomes conhecidos do empresariado nacional a evitarem comentários públicos sobre o resultado do primeiro turno que, para esse grupo, revelou um país dividido entre a esquerda de Lula e a direita, aliada de Bolsonaro.

Procurados pela Folha de S.Paulo, presidentes e donos de redes de varejo, bancos, corretoras, empresas de tecnologia, seguradoras, construtoras, entre outros setores, não quiseram se manifestar após o anúncio do resultado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) porque, segundo eles, precisam traçar a melhor política para atuar nesse cenário inédito.

Na avaliação do empresariado, tomar partido em um ambiente tão polarizado seria péssimo para os negócios --direcionados para todas as classes sociais.

Um banqueiro de São Paulo, por exemplo, disse, sob a condição de anonimato, que as urnas revelaram a "vingança do Sul e do Sudeste, que puxam o PIB do país" contra o petismo e deram margem de votos maior para Bolsonaro, que personifica a direita.

Por outro lado, ele identifica a dificuldade do atual presidente de tomar votos de Lula entre os menos favorecidos, mesmo tendo despejado bastante dinheiro público no Auxílio Brasil.

Um dos maiores acionistas de uma importante rede varejista avalia que essa divisão é ruim para os negócios e, por isso, deve reunir os executivos do grupo nesta semana para discutir cenários para o segundo turno.

Corretoras e bancos de investimento também já marcaram discussões para definição de estratégias de posicionamento político no segundo turno.

A ideia é manter a neutralidade em um ambiente de surpresas especialmente porque o futuro presidente terá de enfrentar um Congresso que começará 2023 com os partidos do centrão mais fortalecidos. Além disso, existe a chance de fusão entre os partidos PP e o União Brasil.

"Essa situação é muito sensível", disse João Paulo Luque, fundador da AFS Capital, um dos braços de investimento do BTG, que movimenta quase R$ 1 bilhão em ativos.

"Essa transferência de poder para o Legislativo está cada vez mais clara e, seja Lula ou Bolsonaro, não será fácil passar uma agenda própria sem acordo com o Legislativo."

Para ele, o resultado da eleição mostrou um país muito dividido.

"Bolsonaro demonstrou uma força surpreendente", disse o megainvestidor Naji Nahas, figura emblemática do mercado financeiro do Brasil, conhecido pelo episódio da quebra da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. Ele foi inocentado das acusações de manipulação do mercado que culminaram no caso.

Nahas, que se estabeleceu no país há cinco décadas e sempre manteve boas relações com os presidentes desde então, disse ser muito difícil prever quem vencerá. "É por isso que ninguém vai se posicionar."

Um dos sócios de um dos maiores fundos de investimento do país, que controla gigantes do varejo e da infraestrutura, tinha planejado fazer uma declaração pública caso Lula vencesse no primeiro turno, algo que acreditava ser possível diante dos resultados das pesquisas de intenção de voto. Mudou de posição com metade das urnas abertas.

"Uma vez descartada a hipótese do suicídio, só nos resta o otimismo". A frase, do romancista francês Alberto Camus (1913-1960), Prêmio Nobel de Literatura, foi usada por um alto executivo ouvido pela Folha para expressar seu estado de ânimo diante do crescimento de Bolsonaro no primeiro turno.

Os desafios na economia Seja Lula ou Bolsonaro o vencedor no segundo turno, para esses empresários, a dificuldade será o "terceiro turno", o que chamam de "dia seguinte".

Não acreditam que será possível pacificar o país diante de uma polarização tão grande e o custo da eleição baterá à porta.

Outro banqueiro ouvido sob anonimato considera que o novo governo terá de "fazer as pazes" com o Banco Central e tomar medidas que permitam ao regulador baixar juros.

Ele disse que não adianta insistir na narrativa eleitoral de que estamos há três meses com deflação, porque o BC vem tomando medidas em sentido contrário -aumentando juros para frear a inflação.

Esse banqueiro, um dos oito maiores do país, avalia que, apesar do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) seguir em queda, a inflação dos alimentos e de outros itens pesa demais sobre os mais pobres -hoje principais eleitores de Lula, especialmente no Norte e Nordeste, regiões onde Bolsonaro tem mais dificuldade de ganhar votos.

Para Jerome Cadier, presidente da Latam Brasil, independentemente do resultado da eleição, a primeira prioridade do novo governo deve ser reduzir as desigualdades sociais no Brasil.

"A segunda prioridade é diminuir o custo Brasil, para que a gente volte a ter um crescimento econômico significativo. E a terceira é garantir a eficiência da máquina pública, com a redução absoluta da corrupção no país", afirmou Cadier.

Na indústria, a visão é de que o governo terá de manter gastos sociais e, para isso, terá de fazer reformas, especialmente a administrativa e a tributária.

Acionista de uma importante siderúrgica avalia que, sem isso, não haverá recursos. Para ele, também não será possível abrir mão de algum controle de gastos.

Embora não defenda a manutenção integral do teto de gastos, medida que corrige as despesas correntes pela inflação do ano anterior, esse empresário defende que haja alguma âncora fiscal.

Na opinião de Caio Magri, presidente do Instituto Ethos, que fomenta os conceitos de responsabilidade ambiental, social e corporativa (ESG) nas empresas, "é preciso aferir melhor o que a sociedade realmente quer".

Magri participou, neste domingo (2), da Vigília Cívica pela Integridade do Processo Eleitoral, na sede da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), em São Paulo. O Ethos soma 454 associadas, entre elas Carrefour, Renner, Natura e Grupo Pão de Açúcar.


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