BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A escolha da equipe de transição para a economia sinaliza que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem ambição e estofo para fazer uma revisão completa do arcabouço fiscal e orçamentário. Mexer na regra do teto de gastos seria apenas uma fração do processo.
Como definiu um economista sem nenhuma ligação com o PT e que prefere não ser citado, a reunião de André Lara Resende, Persio Arida, Nelson Barbosa e Guilherme Mello, sob a coordenação do vice-presidente eleito Geraldo Alckmin, pode ser um tricô de quatro agulhas na redefinição da macroeconomia.
A comparação considera que existem, sim, divergências acadêmicas e políticas entre os egressos do antigo PSDB, Lara Resende e Arida, e os petistas Barbosa e Mello. No entanto, prevalece a percepção de que eles nunca estiveram tão próximos na atual discussão econômica.
Apenas para citar algumas convergências dentro dos temas que serão colocados à mesa, os quatro acreditam que é urgente garantir recursos no Orçamento de 2023 para a área social, que o investimento precisa estar atrelado à sustentabilidade ambiental e que a reforma tributária é prioridade.
É claro que, nos detalhes, será preciso saber negociar.
A reforma tributária é um exemplo de ajuste fino a ser feito. Arida e Alckmin têm dado sinalizações de que querem criar um IVA (Imposto sobre Valor Agregado) amplo, que reuniria inclusive o tributo estadual ICMS e o municipal ISS. Mas a Fundação Perseu Abramo, que consolidou o plano de governo de Lula, trabalhou com a ideia da criação de um IVA Dual (um IVA para a União e outro para estados e municípios).
Pessoas que preferem não ter o nome revelado e são próximas aos economistas acreditam que a convergência mais importante está na disposição de reformular as regras fiscais. O desenho final vai demandar aval do ministro, ainda não escolhido, mas a predisposição para fazer essa reformulação está registrada em textos individuais e coletivos assinados por esses economistas.
Arida preside o CDPP (Centro de Debate de Políticas Públicas), que produziu textos sobre essa questão, e também colaborou com o documento "Contribuições para um governo Democrático e Progressista", que defende mudanças estruturais mais profundas.
O texto fala da necessidade de o Brasil "amadurecer novo regime fiscal". E sugere: "Essa revisão, de caráter geral, é complexa e precisa ir além da alteração das regras fiscais, devendo contemplar também a reformulação das regras orçamentárias e a redução da rigidez dos gastos, que prejudicam a gestão racional das finanças públicas e do próprio federalismo fiscal."
Barbosa tratou dessa questão, em diferentes momentos, como colunista da Folha e em entrevistas. Em um de seus textos, destacou que "chegou a hora de mudar para metas fiscais flexíveis, compensando a flexibilidade com mais transparência na execução de um orçamento público". "Já fazemos assim na política monetária e cambial. Falta fazer o mesmo no fiscal", afirmou.
Lara Resende publicou livros, como "Camisa de força ideológica: a crise da macroeconomia" e a coletânea de ensaios "Consenso e contrassenso: Por uma economia não dogmática." Parte do seu pensamento está resumido no texto "Diretrizes de Políticas Públicas para 2023 - Elementos para uma Estratégia de Retomada do Crescimento Sustentável e Inclusão Social", do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais).
Nessa proposta, ele destaca que é preciso coordenar as políticas monetária e fiscal e sugere, inclusive, a criação de um novo órgão técnico, uma espécie de comitê, com essa finalidade.
Mello participou da coordenação do programa de governo do PT, que defende medidas nessa linha
Quem observa de fora diz também que a união dos quatro economistas denota uma tentativa de equilibrar as diferentes experiências.
Da última vez que Lara Resende e Arida trabalharam juntos, nos anos de 1980 e 1990, foram formuladores de um instrumento vital para o sucesso do Plano Real, a moeda digital transitória, batizada de URV (Unidade Real de Valor). Como Arida já recordou em diferentes entrevistas, o trabalho foi de equipe. A implementação coube a outros integrantes do governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
Barbosa, com dez anos de experiência em gestão pública, conhece a máquina estatal por dentro. Foi ministro de Planejamento e de Fazenda. Mello é um conhecedor da estrutura e do pensamento do PT e participou da coordenação do plano de governo, equilibrando as propostas de quase cem especialistas de diferentes áreas.
No grupo, apenas Arida está cotado para assumir como ministro da Economia. Como participar da transição não significa passe livre para entrar no futuro governo, a definição do nome segue em suspenso.
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