BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Para o líder do governo Jair Bolsonaro (PL) no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ), a PEC da Transição --principal aposta do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para pagar o Bolsa Família no ano que vem-- está sendo construída em uma "confraria do PT", sem diálogo, nem valores concretos.
"[O texto está sendo elaborado] Sem ministro [da Economia], sem proposta, sem valor e sem conversa. Não tem como a gente aprovar isso, não tenho nem como responder [qual a posição do governo]. Em princípio, de bate-pronto, impossível [apoiar]", disse à reportagem.
A entrega da PEC acabou adiada em meio à falta de acordo político no Senado, e agora o governo de transição promete apresentar o texto nesta quarta-feira (16).
A proposta precisa ser aprovada nas duas Casas ainda neste ano para que a próxima gestão consiga manter o pagamento do valor de hoje, mas, no atual cenário, a PEC pode enfrentar resistência da base do governo no Senado porque, segundo Portinho, está sendo construída de forma atropelada.
"Isso está sendo discutido dentro de uma confraria do PT e dos partidos aliados. Isso é um erro político tão grande. Já há insatisfação de vários partidos, porque estamos sendo colocados a reboque, no atropelo, porque eles não estão conversando [com a base do governo]", afirma.
"Eu teria feito o contrário, eu sentaria com o partido do governo, com o líder. Falaria 'vem cá, estamos pensando assim, assado'. Aqui é que eles têm que fazer trabalho político. Não tem trabalho político nenhum. Estão fazendo gestos completamente errados."
A ideia da PEC de Transição é deixar as despesas do Auxílio Brasil --que voltará a se chamar Bolsa Família-- de fora do teto de gastos (o limite fiscal que limita o avanço das despesas pela variação da inflação) e, assim, conseguir manter o valor atual de R$ 600 no próximo ano.
A mudança deixaria cerca de R$ 175 bilhões de fora da regra fiscal, enquanto os R$ 105 bilhões atualmente reservados para o programa social seriam redistribuídos a outras áreas que correm risco de apagão --como os programas Farmácia Popular, Minha Casa, Minha Vida, e a Lei Aldir Blanc.
Aliados de Lula têm batido na tecla de que os dois candidatos se comprometeram em manter o valor do Auxílio Brasil, e que o atual presidente também precisaria furar o teto de gastos para pagar o benefício a partir do ano que vem.
Portinho afirma, no entanto, que a conta de Bolsonaro para garantir o auxílio seria bem menor, e que a indefinição sobre os rumos do Ministério da Economia assusta o mercado financeiro. Pelos cálculos do atual governo, o Auxílio Brasil custaria um extra de cerca de R$ 50 bilhões.
"Se trouxessem aqui [uma proposta de] R$ 50 bilhões, R$ 60 bilhões, a gente já tinha resolvido a questão", diz Portinho, defendendo que o montante previsto por Lula é muito alto. "O futuro ministro que vai ter legitimidade para tratar disso."
Para o senador, a incógnita sobre o próximo ministro da Economia reduz a credibilidade da proposta e aumenta o receio por parte dos parlamentares, que cobram um fiador político.
Na última semana, o relator-geral do Orçamento, o senador Marcelo Castro (MDB-PI), e a equipe de transição sinalizaram a intenção de excluir o Bolsa Família do teto de gastos permanentemente ou por no mínimo quatro anos. O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), por sua vez, defendeu que essa seja uma medida excepcional apenas para 2023.
O líder do governo afirma ainda que o desgaste não coloca em xeque apenas a aprovação da PEC, mas também os rumos do Senado --onde vem trabalhando para derrotar o atual presidente, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e assumir o comando da Casa em 2023.
O presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, já afirmou que o partido terá candidato próprio nessas eleições, concorrendo com Pacheco, que articula o apoio do próximo governo.
A avaliação de Portinho é que Pacheco, na busca por votos da ala petista, se fechou para o diálogo com a bancada do Partido Liberal, que será a maior sigla do Senado em 2023, com 14 cadeiras.
Com a promessa de fazer oposição ao governo Lula, o senador não defende um golpe antidemocrático para evitar que o petista assuma o poder --mas diz ser legítima a insatisfação que motiva os atos em frente a postos militares pelo Brasil.
"Foi uma diferença apertada, campanha polarizada. Um candidato que, para boa parte da população, deveria estar preso, porque houve roubo. Não estou dizendo que foi o candidato 'a' ou o 'b' [que roubou], mas foi no governo [do PT]. Tem um sentimento, e tem um espasmo, uma ressaca eleitoral", diz.
"Não quero golpe. Eu, particularmente, sou completamente liberal. E não é a primeira vez que falam em intervenção militar. Nos protestos contra a Dilma [Rousseff] já tinha isso. Eu acho que as pessoas têm o direito de pedir isso e a gente tem o dever de mostrar a elas que é antidemocrático", completa.
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