BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O projeto de lei que altera a Lei das Estatais e flexibiliza a quarentena para indicados para cargos de diretores e presidência de empresas públicas não deve seguir direto para o plenário do Senado Federal. Há chances, portanto, de que não seja apreciado ainda neste ano.

O líder do governo Bolsonaro no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ) apresentou requerimento solicitando que a matéria, cuja votação era inicialmente prevista nesta quinta-feira (15), seja analisada antes pela Comissão de Constituição e Justiça da Casa

Após o desgaste envolvendo a indicação de Aloizio Mercadante para o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), a bancada do PT na Casa indica que não vai se opor, e a tendência é que a proposta não seja apreciada com rapidez.

Caso o caminho mais longo seja adotado, ainda há chances de que a proposta entre na pauta de votação na semana que vem, considerando que o recesso legislativo tem início a partir do dia 23. No entanto, senadores apontam que dificilmente alguém assumiria o ônus de atropelar a medida na próxima semana.

A perspectiva de que a Lei das Estatais encontre no Senado maiores dificuldades para avançar acalmou em parte o mercado financeiro, que temia a desvalorização de grandes empresas estatais como Petrobras e Banco do Brasil. Como o peso delas é grande no mercado de ações, uma queda no valor dos papeis afeta a Bolsa como um todo.

Após a divulgação de que a votação no Senado pode ser adiada, a Bolsa de Valores brasileira operava em alta na tarde desta quinta, impulsionada pelos papéis das empresas sob controle do governo. As ações ordinárias da Petrobras, que tombaram quase 10% na sessão passada, registravam ganhos de 1,15% no início da tarde, enquanto as do BB (Banco do Brasil), que caíram 2,5%, avançavam 1,5%.

A bancada petista ficou contrariada com a ligação feita entre a aprovação da proposta e a nomeação de Mercadante, argumentando nos bastidores que o centrão é o principal beneficiado pela flexibilização da quarentena.

Aponta-se que outro interessado na medida seria o governador eleito de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que precisa dessa flexibilização para conseguir realizar nomeações a partir do próximo ano.

Mudança foi inserida em texto sobre publicidade e aprovada a toque de caixa Embora não conste na pauta oficial da sessão, havia a previsão de que a proposta fosse votada pelos senadores na tarde desta quinta-feira (15), dois dias após ter passado pela Câmara dos Deputados.

Na noite de terça-feira (13), a toque de caixa, os deputados federais aprovaram um projeto que muda a Lei das Estatais para reduzir para 30 dias a quarentena de indicados a ocupar cargos de presidente e diretor das empresas públicas.

Atualmente, a Lei das Estatais veda a indicação para esses cargos de pessoas que tenham atuado, nos últimos 36 meses, como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral.

O texto aprovado pelos deputados retira da lei a menção aos 36 meses. Além disso, inclui dispositivo que prevê que, para não haver vedação, a pessoa que tiver atuado em estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a campanha eleitoral deve comprovar o seu desligamento da atividade incompatível com antecedência mínima de 30 dias em relação à posse como administrador de empresa pública ou sociedade de economia mista, bem como membros de conselhos da administração.

A aprovação aconteceu algumas horas após a indicação de Aloizio Mercadante para o BNDES, anunciada por Lula durante evento para celebrar o encerramento das atividades dos grupos técnicos do gabinete de transição.

Aumentaram os rumores de que houve interferência da equipe de Lula o fato de que o presidente eleito e diplomado havia recebido horas antes para um café da manhã o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

O ônus pela alteração da Lei das Estatais recaiu então sobre o futuro governo, em particular para facilitar a nomeação de Mercadante. Na hora da votação, alguns deputados chegaram a apelidar a flexibilização de "Emenda Mercadante".

A referência irritou os integrantes do gabinete de transição e petistas históricos, mesmo tendo o partido de fato votado favorável à medida --apenas PSDB e Novo foram contrários.

Por isso, nesta quinta-feira (15), alguns caciques do PT no Senado têm dito nos bastidores que não vão se opor a qualquer tentativa de obstrução da votação. Vão simplesmente deixar o ônus pelo adiamento ou também por pressionar pela votação para os integrantes do bloco centrão, que eles apontam serem os principais beneficiários da medida.

Alguns petistas afirmam que Mercadante foi usado como um "bode expiatório" e que a iniciativa de colocar em votação a proposta na Câmara dos Deputados não contou com articulação de deputados do partido.

A indicação de Mercadante, segundo os integrantes da transição, desviou o foco da opinião pública e jogou a responsabilidade pela mudança na lei na conta do PT.

A equipe de Lula tem defendido que havia segurança sobre a legalidade no caso do petista e que a alteração na lei não era necessária para o futuro presidente do BNDES. De qualquer forma, a alteração deve tornar mais confortável a aprovação dele para o posto e, independentemente disso, provoca efeitos mais amplos na política.

Apesar do requerimento do líder Carlos Portinho, alguns senadores ligados ao governo tem evitado assumir uma defesa mais aberta do adiamento da votação nesta quinta-feira (15), embora busquem jogar a responsabilidade pela sua articulação no lado petista.

O requerimento apresentado defende a análise da CCJ do Senado, para evitar que uma norma dessa importância seja modificada "ao bel-prazer dos interesses de ocasião"

"Considerando que o instituto da quarentena é instrumento de proteção a áreas sensíveis e estratégicas da administração pública e que seu propósito é restringir, por período determinado, o desempenho de atividades por quem exerceu funções específicas e que terá, em função dos cargos, acesso a informações privilegiadas, é fundamental que se promova uma discussão aprofundada sobre a conveniência e oportunidade da pretendida alteração legislativa, especialmente no âmbito da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, evitando-se que normas dessa importância sejam modificadas ao bel-prazer dos interesses de ocasião, abrindo caminho para indicações de natureza meramente políticas nessas empresas", afirma o texto do requerimento.


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