BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Os escritórios Galdino & Coelho Pimenta Takemi Ayoub e Ferro Castro Neves Daltro & Gomide, que defendem o banco BTG Pactual, enviaram no sábado (14) ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro uma petição para derrubar a liminar concedida na última sexta-feira (13) à Americanas. O documento, ao qual a Folha de S.Paulo teve acesso, traz expressões de indignação contra a varejista.

O BTG foi impedido de cobrar uma dívida "superior a R$ 1,2 bilhão" (a Folha de S.Paulo apurou que o valor total é de R$ 1,9 bilhão), depois que a companhia barrou a cobrança de todos os seus credores por meio da liminar. A decisão foi obtida após a divulgação de um escândalo contábil de R$ 20 bilhões no seu balanço, anúncio feito pelo ex-presidente da companhia, Sergio Rial.

"A semente da autodestruição: pirotecnia contábil" é o título do agravo de instrumento redigido pelos advogados, com pedido de atribuição de efeito suspensivo à A Americanas não quis falar com a reportagem sobre os termos da petição. Por meio de nota, sua assessoria afirmou que. "nesse momento, a companhia segue acreditando na proteção da medida cautelar e no compromisso dos credores de retornarem com uma proposta. A Americanas apontará em breve a sua equipe de negociação com os credores".

Na petição do BTG, à qual a Folha de S.Paulo teve acesso, são alvo, além da companhia, os empresários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, fundadores da companhia de private equity 3G Capital, atuais acionistas de referência da Americanas -até 2021, eles eram os controladores da varejista.

"Os três homens mais ricos do Brasil (com patrimônio avaliado em R$ 180 bilhões), ungidos como uma espécie de semideuses do capitalismo mundial 'do bem', são pegos com a mão no caixa daquela que, desde 1982, é uma das principais companhias do trio", diz o documento.

"Dois dias depois, têm a pachorra de vir em Juízo pedir uma tutela cautelar, preparatória de uma recuperação judicial, para impedir os credores de legitimamente protegerem o seu patrimônio à luz da maior fraude corporativa de que se tem notícia na história do país. É o fraudador pedindo às barras da Justiça proteção 'contra' a sua própria fraude", diz o texto da petição.

Os advogados fazem menção ao livro "Sonho grande: Como Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira revolucionaram o capitalismo brasileiro e conquistaram o mundo" (editora Sextante), lançado em 2013 pela jornalista Cristiane Correa, mencionando dois trechos em especial, com aspas dos empresários: "Nós temos que fazer pirotecnia. De vez em quando vamos ter que dar uma de maluco para esses caras saberem que é pra valer" e "O dinheiro começou a ir para o bolso, o sonho de construir deixou de existir [...] a semente da destruição estava plantada."

De acordo com a petição, trata-se do "fraudador cumprindo a sua própria profecia, dando verdadeiramente 'uma de maluco para esses caras saberem que é pra valer'. É o fraudador travestindo-se como o menino da antiga anedota forense, que, após matar o pai e a mãe, pede clemência aos jurados por ser órfão."

A Folha de S.Paulo solicitou à Americanas e ao 3G Capital um posicionamento do trio de acionistas de referência. A varejista afirmou não ter previsão sobre uma resposta dos empresários. O 3G não se manifestou sobre as críticas a seus fundadores, porque são eles, e não a empresa de private equity, que têm ligação com a Americanas.

Segundo os advogados dos escritórios Galdino Coelho e Ferro Castro Neves na petição, a Americanas pediu à Justiça não apenas a suspensão o congelamento de vencimentos antecipados, mas também que os vencimentos que já tivessem sido declarados e compensações que já tivessem sido feitas fossem desfeitas.

A petição afirma que a liminar obtida na sexta (13) pela Americanas "entrega R$ 1,2 bilhão do patrimônio alheio (no caso do Banco) a um fraudador confesso, que admite em sua petição (...) ter dívidas superiores a R$ 40 bilhões; ou seja, o R$ 1,2 bilhão do banco virarão pó do dia para a noite nas mãos de quem se vangloria por 'pagar de maluco'".

Os advogados também reclamam que a liminar, assinada pelo juiz Paulo Assed Estefan, da 4ª Vara Empresarial da Comarca do Rio de Janeiro, estabelece um marco temporal para a antecipação da tutela a data de 11 de janeiro de 2023, "ironicamente o dia em que a companhia confessou publicamente a fraude ao mercado."

OU CONTROLADORES FAZEM APORTE OU HAVERÁ FALÊNCIA DA EMPRESA, DIZ BTG

Segundo a defesa do BTG Pacual, a Americanas adota uma "narrativa canhestra e disléxica", que levou a uma "decisão gravíssima" da Justiça, que "distorce por completo os limites e a finalidade do instituto da recuperação judicial, conferindo proteção legal, inclusive em caráter antecipado, a alguém que se tornou insolvente sponte propria [por vontade própria] por ter fraudado o mercado de crédito e o mercado de ações."

A petição afirma que, "se a insolvência decorre de fraude, como é o caso, ou o acionista controlador aporta os recursos necessários para cobrir o rombo da fraude ou é caso de falência; não existe uma terceira hipótese".

A liminar, diz a defesa do BTG, "absolve liminarmente os acionistas controladores -literalmente, os três homens mais ricos do Brasil, com patrimônio conjunto avaliado em mais de R$ 180 bilhões (!!)-, livrando-os de pagar a conta de sua própria pirotecnia e colocando todo o fardo da sua lambança contábil nos ombros dos credores."

A reportagem procurou o escritório Galdino & Coelho Pimenta Takemi Ayoub para comentar a petição, mas não obteve retorno até o fechamento deste texto.

LEIA A NOTA DA AMERICANAS

Procurada pela Folha de S.Paulo, a Americanas respondeu com uma nota, enviada pela sua assessoria de imprensa. Segue íntegra do texto:

"A Americanas S.A informa que a medida cautelar visa somente a sustentação jurídica necessária para que tanto a Americanas como os credores possam chegar a um possível acordo. A Americanas reitera a importância da manutenção da liminar, apesar da tentativa de suspensão, o que poderia gerar assimetria entre os seus credores, inclusive bancos, e não ajudaria no processo."

"A Americanas trabalha para, dado o seu peso social em todo o Brasil gerando mais de 100 mil empregos diretos e indiretos, encontrar uma solução com os seus credores e, assim, a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica. Nesse momento, a companhia segue acreditando na proteção da medida cautelar e no compromisso dos credores de retornarem com uma proposta. A Americanas apontará em breve a sua equipe de negociação com os credores."


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