SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Em um cenário esperado para 2023 de elevada incerteza econômica e política, as empresas com uma forte geração de caixa, baixo endividamento e inseridas em setores com potencial para crescer a despeito do desempenho do PIB (Produto Interno Bruto) são apontadas por gestores de fundos entre as que devem entregar os melhores rendimentos por meio de dividendos aos investidores.
Em 2022, o ambiente local de pressão inflacionária, juros altos e eleições já contribuiu para que as empresas pagadoras de dividendos tenham apresentado um desempenho acima da média do mercado -enquanto o índice de dividendos da Bolsa, o Idiv, subiu 12,6%, o índice amplo Ibovespa avançou 4,7%.
Segundo Marcos Peixoto, gestor da XP Asset, essa é uma reação natural de se esperar por parte dos investidores. Ele explica que é comum que, em momentos de maior aversão ao risco e busca por proteção, as ações de dividendos despertem maior interesse, por se tratarem de empresas bem estabelecidas em seus respectivos nichos de atuação, com capacidade para atravessar melhor que os pares de mercado períodos de baixo crescimento econômico.
O gestor afirma que essa predileção pelos dividendos foi um movimento que se acentuou na esteira do processo de alta de juros pelos bancos centrais globais -com a migração de empresas de tecnologia com uma alta expectativa de crescimento no futuro, conhecidas como ações de crescimento no jargão de mercado, com o fluxo direcionado para empresas que já têm lucros elevados de setores tidos como mais tradicionais, conhecidas como valor.
Empresas do setor de energia elétrica, bancos e seguradoras e as exportadoras de commodities estão entre as que mais reúnem as características desejadas pelos investidores de dividendos, com operações robustas que se revertem em lucros trimestrais elevados recorrentes distribuídos aos acionistas.
Gestor de renda variável da Genial Investimentos, Roberto Lira afirma ter a expectativa de que o interesse por ações de dividendos siga em alta em 2023, frente ao cenário projetado à frente de desaceleração econômica e incertezas relacionadas ao início do novo governo no Brasil que podem retardar o processo de queda da taxa de juros.
"Por ser uma estratégia de caráter mais defensivo, os fundos de dividendos representam uma porta de entrada para quem quer entrar no mercado de renda variável", afirma Lira.
Comumente presente nas carteiras de dividendos pelos contratos indexados à inflação e pela demanda inelástica, o setor elétrico, por meio de nomes como Engie, CPFL, Equatorial e Eletrobras, é apontado pelo gestor da Genial como uma das principais apostas que carrega no fundo Plural Dividendos FIA (Fundo de Investimento em Ações), que sobe 21,1% de janeiro a novembro.
A BB Seguridade, beneficiada pelos juros altos que rentabilizam as aplicações financeiras mantidas em caixa e pela provável queda da sinistralidade, e a distribuidora de combustíveis Vibra, impactada positivamente pela reabertura econômica, também são apontadas entre as ações no portfólio, assim como a produtora de papel e celulose Klabin e a B3, a Bolsa brasileira.
São negócios que, de modo geral, apresentam boas perspectivas de crescimento dos resultados nos próximos trimestres a despeito do incerto quadro econômico de forma mais ampla, afirma Lira.
"Consideramos muito importante que as empresas tenham sustentabilidade na estratégia de pagamento dos dividendos, não queremos negócios que distribuam um valor alto em um ano e no seguinte o reduzam drasticamente", diz o gestor da Genial.
Lira conta que o resultado recente do fundo também teve contribuição importante dos papéis da Petrobras, que esteve entre as maiores distribuidoras de dividendos do mercado em escala global nos últimos meses.
Com a forte alta dos papéis no ano, e com a mudança de governo e as possíveis alterações no direcionamento estratégico da companhia, o gestor diz que preferiu tirar as ações da petroleira da carteira, ao menos até que seja possível ter uma visibilidade maior sobre os rumos do negócio.
"Não sabemos qual será a nova Petrobras", afirma.
Peixoto, da XP Asset, diz que também surfou o momento bastante positivo para o recebimento de dividendos distribuídos pela estatal, mas que desinvestiu da empresa após o resultado das eleições, com a perspectiva de mudança nos rumos da companhia a partir de 2023.
"Um dos grandes chamarizes da Petrobras eram os dividendos, e isso está claro que vai acabar", diz Peixoto.
Apesar da decisão em relação à petroleira, tanto o gestor do Plural como o da XP dizem que mantêm em carteira papéis do BB (Banco do Brasil), pela avaliação de que a instituição financeira, apesar do controle estatal, negocia a níveis considerados muito baratos para serem ignorados frente aos últimos resultados entregues.
Ainda no setor financeiro, Itaú e BB Seguridade estão entre as ações preferidas na carteira de dividendos da gestora da XP, com o impacto positivo dos juros altos para a rentabilidade das operações.
Peixoto diz ainda que a Eletrobras também é uma posição relevante na carteira do fundo de dividendos, posição que já vem desde antes do processo de privatização da elétrica.
Com a privatização, a empresa deve aumentar a competitividade frente aos concorrentes no mercado e gerar resultados crescentes, afirma o gestor do fundo XP Dividendos FIA, que acumula valorização de 17,6% de janeiro a novembro.
Diretor de investimentos da Trígono Capital, Werner Roger afirma que ações de menor capitalização (mid e small caps) de empresas de commodities e do setor industrial estão entre as principais posições do fundo de dividendos Delphos Income, que sobe 15,8% no ano até o final de novembro.
As metalúrgicas Tupy e Ferbasa, a fabricante de peças automotivas Mahle Metal Leve, a petroquímica Unipar e a empresa de armazenagem agrícola Kepler Weber estão entre as ações que, por terem uma liquidez menor em comparação às mais negociadas da Bolsa (blue chips), muitas vezes acabam ficando fora do radar da maior parte do mercado, mas que têm potencial para entregar dividendos atraentes na casa dos dois dígitos, defende o gestor da Trígono.
"Observamos o histórico de dividendos da empresa, mas o que mais nos interessa é sempre olhando para frente", afirma Roger, que aponta o rearranjo em curso nas cadeias globais de suprimentos e a inflação persistentemente alta nos países desenvolvidos como fatores que devem sustentar os preços das commodities em patamares elevados em 2023.
Sobre as discussões que tratam de uma eventual tributação dos dividendos, hoje isentos para a pessoa física, o gestor da Genial afirma que, quando o assunto veio à tona nos governos anteriores, ele esteve acompanhado de uma contrapartida que era a redução nas alíquotas da tabela do IRPJ (Imposto de Renda da Pessoa Jurídica).
"Ainda não sabemos como vai voltar essa discussão agora no novo governo, se terá a queda do imposto às empresas", afirma Lira.
Peixoto, da XP Asset, acrescenta que a tributação pode levar a mudanças nas estratégias de negócio das empresas para minimizar o impacto da medida, como por meio de um aumento na recompra de ações na Bolsa ou até via a antecipação do pagamento dos dividendos.
Segundo ele, já há empresas que avaliam a possibilidade de antecipar os pagamentos de dividendos aos acionistas em 2023, visto que a aprovação de uma medida do tipo em meados do ano tende a demorar alguns meses até entrar em vigor, possivelmente no início de 2024. "Têm muitas variáveis ainda em jogo. A tributação dos dividendos deve vir dentro da discussão de um arcabouço tributário mais amplo."
Lira acrescenta que é comum que os fundos dedicados à estratégia reinvistam os dividendos recebidos das empresas no próprio patrimônio, sendo que os fundos têm alíquota tributária de 15% sobre os ganhos auferidos. A medida, portanto, tende a trazer maior impacto para a pessoa física que compra diretamente as ações na Bolsa do que para os fundos, diz o gestor.
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