SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Mesmo que não seja visível a olho nu, a nanotecnologia já aparece no dia a dia de muitas empresas e consumidores.
No mercado brasileiro, ela chega a produtos de setores como cosméticos, saúde, construção, eletrônicos, fertilizantes e moda. São materiais produzidos e manipulados a partir da escala nanométrica, entre 1 e 100 nanômetros. Cada nanômetro é igual a um metro dividido por 1 bilhão.
Jefferson Gomes, diretor de inovação e tecnologia do Senai Nacional, diz que o potencial da nanotecnologia está em sua capacidade de oferecer precisão e eficiência. Essa característica se aplica em áreas variadas, como geração de energia e desenvolvimento de novos materiais.
Além disso, é uma das viabilizadoras da indústria 4.0, que deverá contar com sensores em escala nanométrica, inteligência artificial e grande capacidade de envio de dados.
Na avaliação de Gomes, o Brasil vem se destacando como um dos países com boa produção científica no tema da nanotecnologia e há exemplos de aplicação no país.
Por outro lado, ele diz que o volume de investimento dedicado ao setor ainda é baixo em relação à necessidade e em comparação com países mais desenvolvidos --e defende maior participação do Estado no impulsionamento do setor.
"A qualidade do que se faz aqui é boa, mas o volume ainda é pequeno", afirma Gomes.
Para Leandro Antunes Berti, presidente da Brasil Nano (Associação Brasileira de Nanotecnologia), o Brasil tem maturidade para se desenvolver no setor, por contar com grande volume de pesquisadores qualificados e abundância de materiais.
O país se destaca em especial no setor de cosméticos, no qual houve aquisições de empresas de nanotecnologia por grandes indústrias, diz.
O próximo desafio é colocar o país na vanguarda de áreas em que o conhecimento vem se desenvolvendo, entre elas medicina e eletrônica. "Está havendo no mundo uma corrida para dominar a produção de semicondutores, e as tecnologias nano são a base para isso", diz.
Uma das companhias que buscam aliar nanotecnologia e eletrônica é a Embeddo, do Rio de Janeiro.
A startup vem trabalhando junto a empresas do setor automotivo. Nesses projetos, utiliza nanopartículas de grafeno na construção de sensores para medir pressão e deformação, diz Daniel Giacometti, um dos sócios da empresa.
Os equipamentos, que são desenvolvidos em parceria com pesquisadores da Unifesp, podem ser ligados ao maquinário da indústria para identificar problemas e antecipar a manutenção, evitando desgaste e interrupções na produção, por exemplo.
Giacometti também prevê o uso da tecnologia para monitorar a integridade da estrutura de aeronaves.
Uma vantagem de realizar a produção dos sensores no Brasil é a possibilidade de oferecer projetos com maior personalização. A Embeddo também desenvolve softwares para análise dos dados coletados em parceria com clientes.
Apoios vindos de programas para fomento a pesquisa e inovação com frequência são o ponto de partida ou o que viabiliza os primeiros anos de uma empresa de nanotecnologia. A NanoScoping, por exemplo, começou após um prêmio da Fapesc (Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação de Santa Catarina) recebido pelas sócias da empresa em 2014.
O negócio foi criado pelas pesquisadoras Beatriz Veleirinho e Letícia Mazzarino, ambas com pós-doutorado pela UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).
Foram três entre a premiação e ter produto no mercado, conta Veleirinho. Hoje a companhia possui laboratório e duas unidades de produção. Fornece insumos baseados em nanotecnologia para os setores veterinário, agrícola e de cosméticos.
A expertise da companhia em desenvolver sistemas baseados em nanopartículas com diferentes materiais permitiu a entrada em setores variados, diz Mazzarino.
Os ativos vendidos para indústrias pela NanoScoping são produzidos com o objetivo de proporcionar uma melhor absorção tanto pela pele como por cabelos, pelos de animais ou folhas.
A velocidade e o modo como essas partículas são absorvidas também podem ser trabalhados com a nanotecnologia, explica Mazzarino.
Empresas do setor farmacêutico já procuraram a Nanoscoping com demandas como aumentar a resistência de um medicamento. O objetivo de diminuir a degradação de uma substância no estômago do paciente e aumentar a absorção no intestino.
Outra possibilidade da nanotecnologia é explorada pela empresa Nanox, de São Carlos (interior de São Paulo): o efeito bactericida obtido a partir de nanopartículas de prata.
A companhia fornece os ativos, em pó ou dissolvidos em meio líquido, para que sejam adicionados a produtos do setor têxtil, embalagens ou materiais de construção.
Segundo Gustavo Simões, sócio e presidente da empresa, 60% dos quase 25 profissionais possuem mestrado ou doutorado.
A experiência em pesquisa permitiu à companhia participar do enfrentamento à pandemia de Covid-19. Além de produzir artigos científicos, a Nanox participou do lançamento de máscaras, embalagens, roupas, tapetes e até brinquedos que traziam a proteção com prata.
Na moda, a startup Insider Store usou a nanotecnologia para criar uma linha de produtos que tem como objetivo impedir que o usuário fique com odor resultante do suor.
Para isso, a companhia adiciona nanoprata a camisetas para eliminar as bactérias responsáveis pelo mau cheiro.
Karen Prado, pesquisadora na Insider Store, diz que a empresa busca inovações a partir de nanofibras e nanopartículas. Ela acredita ser possível melhorar a condução térmica das roupas, trazer proteção contra raios ultravioleta e dar propriedades autolimpantes e e de condução elétrica para incorporação de sensores.
O potencial de avanço da nanotecnologia no Brasil impulsionou a criação da empresa FabNS, de nanoscópios. Os equipamentos permitem a análise de materiais na escala nanométrica.
A companhia resulta de pesquisas no Laboratório de Espectroscopia do departamento de física da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
A empresa vende o equipamento e o software para outras companhias e laboratórios que trabalham no setor. Também faz serviço de análise de materiais sob demanda. Segundo os sócios Cassiano Rabelo e Hudson Miranda, o nanoscópio deve servir como uma plataforma que habilite o surgimento de mais inovações.
PARA ENTENDER A NANOTECNOLOGIA
O que é:
Manipulação de materiais em nível nanométrico, menor do que o microscópico.
Um nanômetro é equivalente a um metro dividido por um bilhão.
Para se ter uma ideia da dimensão minúscula, imagine que a proporção entre uma bola de futebol e todo o planeta Terra é semelhante a que existe entre um nanômetro e um metro.
Surgimento:
Uma palestra realizada pelo físico americano ganhador do Nobel Richard Feynman em 1959, com o título "Há muito espaço no embaixo", é considerado o marco inicial da nanotecnologia ?apesar de o termo ter
sido criado mais tarde. Microscópios que permitiram observar partículas em nível nanométrico surgiram nos anos 1980.
Exemplos de aplicação:
Bactericida
A nanoprata tem sido adotada em roupas, embalagens, material de construção e decoração.
Acumuladores
Permite a construção de baterias com mais capacidade de armazenamento, velocidade de carregamento e potência.
Cosméticos
O tamanho reduzido das nanopartículas permite maior absorção por pele e cabelos.
Defensivos agrícolas
A formulação de produtos com partículas em escala nanométrica promete melhorar a absorção, além de reduzir a quantidade de produto e os danos ambientais.
Energia
A nanotecnologia promete criar painéis solares mais eficientes e turbinas eólicas com maior resistência.
Eletrônicos
Os nanotubos de carbono são candidatos para substituir o silício na produção de semicondutores.
Infraestrutura
Sensores baseados em nanotecnologia deverão ser usados para monitorar em tempo real a integridade da estrutura de pontes, túneis e trilhos.
Manutenção
A nanotecnologia pode ser usada aumentar a proteção e conservação de fachadas, vidros e interiores de residências.
Saúde
São esperados novos métodos para diagnóstico de doença e o desenvolvimento de remédios mais eficazes e personalizados.
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