BRASÍLIA, SP (FOLHAPRESS) - Em meio à pressão por redução dos juros, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, rebateu nesta quinta-feira (30) as críticas do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dizendo que o trabalho da autoridade monetária é "puramente técnico" e que tem visto uma politização da linguagem usada pelo Copom (Comitê de Política Monetária).
Na quarta-feira da semana passada (22), o Copom manteve a taxa básica (Selic) em 13,75% ao ano -o maior patamar desde o fim de 2016. O tom do comunicado divulgado logo após a reunião foi classificado pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) como "muito preocupante" e criticado por outros membros do primeiro escalão do governo.
"A gente começa a ver mais recentemente uma politização do que é uma linguagem muito técnica de ata do Copom. Quem acompanha sabe que a forma como os analistas de ata olham, que [eles] veem em termos de histórico de comunicação, cada vez que a gente muda uma palavra, tem significado", disse Campos Neto.
No texto do último comunicado, o colegiado do BC manteve a mensagem no parágrafo final sinalizando que poderia voltar a subir juros diante de uma piora no cenário inflacionário. "O Comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado", escreveu.
Campos Neto ressaltou que o último trecho constava no comunicado desde setembro, antes das eleições. "É um parágrafo que reduz essa assimetria de expectativa quando tem uma situação em que você não está atingindo a meta. De lá para cá, nossas projeções pioraram, e as expectativas desancoraram mais", disse.
"Seria muito inusitado, dado que as nossas projeções pioraram, a gente retirar um parágrafo que diz exatamente que nós estamos comprometidos com o atingimento da meta", acrescentou.
Em reação às críticas que tem recebido por parte do governo, o presidente do BC afirmou que a instituição é "um órgão técnico e não deveria se envolver em temas políticos" e mostrou boa vontade em ser mais transparente sobre o trabalho realizado pela autoridade monetária.
Em suas últimas comunicações, o BC tem adotado um tom mais didático ao justificar as razões pelas quais optou por manter os juros elevados no atual patamar pela quinta vez seguida -a segunda sob o governo Lula.
"O que a gente pode fazer é comunicar da melhor forma possível como é feito o nosso trabalho, ser o mais transparente possível no aspecto técnico, abrir o máximo possível de modelagem, falar das considerações que nós temos de como acompanhamos cada variável", disse.
'Haddad está muito bem-intencionado' Campos Neto disse ainda ter um bom relacionamento com o Ministério da Fazenda e "convicção" que Haddad "está muito bem-intencionado".
"Temos trabalhado junto, diria que do nosso lado, estamos fazendo um trabalho técnico, precisamos explicar para a sociedade que esse trabalho técnico tem um custo a curto prazo, mas que não fazê-lo tem um custo muito maior e mostrar as vantagens de ter uma inflação sob controle do ponto de vista social", afirmou.
Segundo o presidente do BC, seria necessário elevar os juros a 26,5% ao ano se a autoridade monetária não fizesse um processo de "suavização" do cumprimento da meta de inflação. No relatório trimestral de inflação, divulgado nesta quinta, o BC admitiu que a probabilidade de o índice ficar acima do teto da meta neste ano é de 83%.
"Se fosse atingir a meta (de inflação) em 2023, a última informação que tive é de que a taxa (de juros) teria de ser de 26,5%. É óbvio que a gente entende que isso seria impossível", disse.
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