BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Após obter vitórias importantes para a pauta econômica no Congresso Nacional, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) está prestes a sofrer alguns reveses em votações no Senado Federal ?a despeito da boa relação construída com os parlamentares.
A Casa deve votar nesta terça-feira (13) na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) um projeto de lei que pode prorrogar até o fim de 2027 a desoneração da folha de salários para empresas de 17 setores da economia.
A política já foi estendida repetidas vezes e, na versão atual, tem validade até o final deste ano. Adiar esse prazo pode desfalcar os cofres públicos em ao menos R$ 9 bilhões ao ano. Há ainda o risco de o projeto reduzir a contribuição previdenciária paga por municípios com até 142,6 mil habitantes, potencializando o impacto sobre as contas.
A proposta foi apresentada pelo senador Efraim Filho (União Brasil-PB), sob o argumento de que é necessário manter empregos nos setores mais intensivos em mão de obra.
A legenda compõe a base de apoio ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e indicou três titulares de ministérios, mas tem demonstrado infidelidade em algumas votações no Legislativo.
Os senadores também articulam a votação de um projeto de lei que autoriza o alongamento de dívidas de crédito rural contratadas por pequenos agricultores. O Tesouro Nacional entraria com até R$ 10 bilhões para servir de fiador às novas operações, quitando os débitos em caso de inadimplência.
A proposta estava na pauta da CAE desta terça, mas, neste caso, o governo conseguiu adiar a votação. No entanto, ainda há risco de o tema ser retomado na semana que vem.
No plenário do Senado, o risco para a equipe econômica vem de um projeto de lei complementar que estabelece regras para a concessão e avaliação de subsídios ?incluindo incentivos tributários.
A proposta endurece a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) ao prever um limite para a concessão desses benefícios e exigir a fixação de metas de geração de emprego e renda, ampliação de exportações, ganho de arrecadação ou redução de pobreza, entre outros indicadores.
O texto ainda prevê a possibilidade de responsabilizar gestores em caso de concessão de incentivos sem respeito às regras. Ainda que Haddad trabalhe para reduzir a conta de subsídios, que encerrou 2022 em R$ 581,5 bilhões, a avaliação da Fazenda é de que a criminalização não é o caminho mais apropriado e pode engessar a política fiscal.
Interlocutores do governo e do Congresso afirmam que, embora Haddad goze de prestígio junto aos congressistas, uma derrota mesmo que parcial nestes assuntos é dada como certa.
A discussão dos projetos se dá no momento em que a Casa é palco de votações extremamente sensíveis para o governo. Tramitam no Senado de forma simultânea o novo arcabouço fiscal, já aprovado na Câmara dos Deputados, e as indicações de Gabriel Galípolo para a diretoria do Banco Central e de Cristiano Zanin para o STF (Supremo Tribunal Federal).
A conjunção dessas pautas acabou dando poder de barganha aos senadores. A Fazenda esperava, por exemplo, uma tramitação mais tranquila do arcabouço no Senado, mas a votação pode acabar ficando para 28 de junho, uma semana após o prazo pretendido pela pasta. O texto também pode sofrer mudanças.
A equipe econômica também ficou incomodada com o envio da indicação de Zanin para uma cadeira no STF no momento em que o Senado analisa a nova regra fiscal. O ato foi encarado como mais um dispêndio de energia dos articuladores políticos do governo.
O Palácio do Planalto já tem enfrentado dificuldades para consolidar uma base de apoio no Legislativo. O desgaste teve seu ápice na votação da MP (medida provisória) da estrutura administrativa do governo, que quase perdeu validade em meio aos ruídos entre Planalto e Congresso.
Na ocasião, Lula precisou entrar em campo para resolver o impasse e tentar atenuar as reclamações de parlamentares a respeito da articulação política do governo. O Planalto também liberou um patamar recorde de emendas parlamentares.
Apesar das reclamações generalizadas sobre a ala política, Haddad e sua equipe têm tido um bom trânsito no Congresso Nacional. O ministro da Fazenda é constantemente elogiado por sua capacidade de diálogo e disposição em atender aos chamados de parlamentares, postura que já lhe rendeu vitórias importantes.
Por isso, a formação de uma "pauta-bomba" no Senado acendeu o alerta na equipe econômica.
O projeto da desoneração da folha busca estender até 31 de dezembro de 2027 o benefício que hoje alcança 17 setores da economia.
Os segmentos contemplados são calçados, call center, comunicação, confecção e vestuário, construção civil, empresas de construção e obras de infraestrutura, couro, fabricação de veículos e carrocerias, máquinas e equipamentos, proteína animal, têxtil, tecnologia da informação, tecnologia de comunicação, projeto de circuitos integrados, transporte metroferroviário de passageiros, transporte rodoviário coletivo e transporte rodoviário de cargas.
O relator do projeto, senador Angelo Coronel (PSD-BA), acrescentou um artigo que reduz a contribuição ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) paga por municípios com até 142,6 mil habitantes, dos atuais 20% para 8%.
O argumento do parlamentar é que as prefeituras menores têm poucas receitas próprias e recebem repasses menores do FPM (Fundo de Participação dos Municípios), acumulando dívidas com a Previdência Social.
Grande parte dos pequenos municípios têm seus servidores ligados ao INSS, diante da ausência de um regime próprio de Previdência (os chamados RPPS).
O senador Efraim Filho, autor da proposta que prorroga a desoneração, afirma que a perspectiva para a votação do texto é positiva. "Acredito que foram cumpridos todos os ritos preliminares. A resistência do governo é natural", diz ele, que preside a Frente Parlamentar do Comércio e Serviços.
Segundo Efraim, a medida é importante para evitar demissões em setores que são intensivos em mão de obra. O grupo estima que o fim da política afetaria 600 mil trabalhadores, entre demissões e ausência de novas contratações.
"O governo já não tem essas receitas. Ninguém perde o que não tem. Com o fim do benefício, teria um aumento de custos com seguro-desemprego, e cabe ao governo assumir essa conta. Não é vantagem tirar um benefício para arrecadar mais e ter que arcar custos", afirma o senador.
A equipe econômica é contra a prorrogação do benefício, mas admite nos bastidores a necessidade de adotar uma estratégia de "contenção de danos", focada em derrubar ao menos o dispositivo que reduz a cobrança sobre as prefeituras.
Além do impacto bilionário, sua aprovação criaria uma disparidade ante municípios que têm seus próprios RPPS e hoje pagam alíquotas até maiores do que 20% sobre a folha.
Segundo interlocutores, parlamentares negociam a possibilidade de deixar o pleito das prefeituras para um projeto de lei paralelo, desobstruindo a votação da desoneração para as empresas.
Já a proposta do crédito rural busca viabilizar uma renegociação de débitos de pequenos produtores. O texto, apresentado em 2022 pelo ex-senador Álvaro Dias (Podemos-PR), pretende alongar as dívidas e dar um prazo de 20 anos para pagamento. O texto ainda "autoriza" o Tesouro a emitir R$ 10 bilhões em dívidas para oferecer como garantia a essas operações em caso de inadimplência.
Técnicos do governo afirmam que, mesmo que o Congresso aprove esse projeto, o presidente receberia recomendação para vetá-lo, uma vez que o texto não aponta a fonte dos recursos, nem como acomodá-los no Orçamento.
No entanto, isso não isenta o governo de riscos, pois o veto poderia ser derrubado posteriormente pelo Congresso Nacional. Por isso, a preferência é manter o tema fora da pauta o quanto for possível.
O relator da proposta, senador Wilder Morais (PL-GO), tenta costurar uma nova versão do texto, eventualmente com um impacto menor para o Tesouro.
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R$ 9 bilhões
É o impacto anual para os cofres públicos com a desoneração da folha de pagamento
R$ 10 bilhões
É quanto o Tesouro pode ter que pagar caso aprovado um projeto que prevê alívio para dívidas do setor rural
R$ 581,5 bilhões
Foi o total da conta de subsídios tributários, financeiros e creditícios do governo em 2022
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