SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Das pouco mais de 370 mil pessoas que investiram R$ 6 bilhões do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) na privatização da Eletrobras em junho do ano passado, 11%, ou cerca de 40 mil, migraram para fundos com uma carteira mais diversificada de ações.
Esses fundos, os FMP (Fundo Mútuo de Privatização) Carteira Livre, foram criados por bancos e corretoras no fim do ano passado para receber os investidores que querem sair dos FMP Eletrobras que têm apenas ações da empresa de energia.
As ações da Eletrobras recuam cerca de 4,5% desde a privatização, que precificou os papéis à época em R$ 42 --na sexta-feira (23), eles fecharam cotados a R$ 40,08.
As tentativas de aumento de influência na empresa pelo governo e as chuvas que aumentaram os níveis dos reservatórios e reduziram o preço da energia têm pesado sobre o desempenho da Eletrobras na Bolsa nos últimos meses.
Analista da Toro Investimentos, Paloma Brum vê com bons olhos a migração para os FMP Carteira Livre. Eles não precisam limitar a sua alocação a único ativo, portanto, contam com a possibilidade de montar um portfólio mais diversificado, diz a especialista.
Ela lembra ainda que esses fundos têm a prerrogativa de ter uma parcela do portfólio destinado às ações, com outra voltada para a renda fixa, o que pode favorecer uma composição de investimentos com uma relação entre risco e retorno mais eficiente do que exclusivamente em uma única ação.
"Dessa forma, o investidor tende a ter uma experiência de investimentos mais suavizada, com menos volatilidade."
XP, BTG Pactual, Itaú, Santander, Genial e BB lançaram fundos nesses moldes entre o fim de 2022 e o início de 2023.
Para quem migrou para os FMP Carteira Livre, ou para os que permaneceram nos fundos de Eletrobras, o saque segue as mesmas regras que o resgate do FGTS, como aposentadoria, aquisição de imóvel ou demissão. Veja as 16 situações de saque do FGTS permitidas por lei.
Além disso, passado um ano da privatização, desde 14 de junho o poupador também tem a opção de migrar o dinheiro investido na Eletrobras de volta para o FGTS.
Analista da Ativa Investimentos, Ilan Arbetman afirma que, diante do retorno mirrado do FGTS de 3% ao ano mais a TR (Taxa Referencial), hoje em 2%, não recomenda a migração do FMP Eletrobras de volta ao fundo de garantia.
Arbetman diz também que, para aquele investidor que já tem uma carteira diversificada em outras aplicações financeiras, pode fazer sentido continuar nos fundos de Eletrobras, que representam nesses casos mais um fator de diversificação dentro de um portfólio mais amplo.
De todo modo, ele reconhece que a pressão do governo para aumentar sua influência na empresa e os níveis elevados dos reservatórios podem manter as ações da elétrica sob pressão a curto prazo.
Analista-chefe de ações do Simpla Club, Gabriel Bassotto diz que a migração de volta ao FGTS pode valer a pena para aquelas pessoas que estão prestes a se aposentar ou que se enquadram em alguma das situações que permitem o saque.
"Mesmo rendendo pouco, o FGTS apresenta uma segurança maior do que os FMPs, seja da Eletrobras, sejam os Carteira Livre, que, por estarem no segmento renda variável, podem apresentar uma rentabilidade negativa a curto prazo."
Gerente de produtos de investimento do Itaú, Tatiana Belizario afirma que têm chegado ao banco nos últimos dias alguns pedidos de clientes que querem voltar para o FGTS, mas que, na grande maioria dos casos, são justamente de quem se encontra em condições de fazer o saque do recurso.
"São poucos os casos de clientes que pedem para voltar para o FGTS para continuar com o dinheiro rendendo os 3% mais a TR", diz a especialista.
INVESTIDOR BEM-SUCEDIDO
A maior parte dos FMP Carteira Livre ainda não completou seis meses, e, pelas regras da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), não pode divulgar a rentabilidade acumulada no período.
Entre os que já ultrapassaram o período, o XP Investor FMP tem retorno de 12,6% desde o lançamento, em 25 de novembro de 2022, até 20 de junho de 2023, ante uma queda de 13% das ações da Eletrobras no período.
A XP lançou dois FMPs classificados como Carteira Livre para receber os recursos daqueles que querem sair dos fundos com ações da Eletrobras --o XP Investor, que replica estratégia existente desde 2006, e o XP Balanceado FMP FGTS, que acompanha a estratégia original até 51% da carteira, com os outros 49% em títulos públicos. O Balanceado acumula retorno de 8,6% no ano.
"O investidor que fez a migração foi bem-sucedido até agora, o que não quer dizer que isso vá se repetir, já que resultado passado não é garantia de resultado futuro", afirma Marcos Peixoto, gestor da XP Asset.
Os fundos têm de 15 a 20 ações na carteira, sendo o setor elétrico uma das principais posições, representando 25% do portfólio.
Auren Energia, Equatorial, Energisa e a própria Eletrobras, que o gestor espera que venha a se valorizar com os ganhos de eficiência trazidos pela privatização, compõem os nomes do setor elétrico na carteira.
Trata-se de um segmento resiliente da economia, que seguirá demandado independentemente do cenário econômico e que tende a ir bem em cenários de queda dos juros, diz Peixoto.
BB e Itaú e as empresas de commodities Petrobras, PetroRio, Gerdau e BR Foods também estão entre os principais investimentos nos fundos da XP Asset.
CUSTO MAIS ALTO COMPENSA RISCO DE CONCENTRAÇÃO EM UM ÚNICO ATIVO
Por terem uma gestão ativa, os FMPs Carteira Livre têm uma taxa de administração mais alta em comparação aos monoações FMP Eletrobras, de modo a remunerar o gestor pelo trabalho na seleção das ações.
Levantamento de Einar Rivero do TradeMap mostra que, na média, os FMP Eletrobras têm uma taxa de administração de 0,2% ao ano, enquanto os FMP Carteira Livre cobram 1,5%.
Laércio Henrique, sócio do BTG Pactual e gestor de portfólio do Absoluto Carteira Livre, afirma que o custo mais elevado mais do que compensa o risco de o investidor estar investido em um único ativo.
Os investidores que estavam alocados em Americanas no início do ano são um bom exemplo. Embora fosse uma empresa com um histórico antigo no mercado, controlada por executivos tidos como referência, as ações da varejista desabaram 80% em janeiro após virem à tona inconsistências contábeis que a empresa reconheceu se tratarem de fraude.
"O fundo tem uma taxa mais alta porque tem uma inteligência de gestão muito maior, e a rentabilidade que ele busca alcançar compensa esse custo maior", afirma Tatiana, do Itaú.
Em meados de fevereiro, o banco estruturou o fundo Itaú Balanceado Ativo FMP FGTS Carteira Livre, que tem 45% de renda fixa, seja em títulos públicos, seja em privados, cujo objetivo é superar o CDI, e 55% em renda variável, com a meta de superar o Ibovespa.
O banco já tinha estruturado no início dos anos 2000 dois fundos FMP Carteira Livre, para receber recursos dos fundos mútuos criados no âmbito das ofertas de ações da Petrobras e da Vale na ocasião. Os dois fundos mais antigos têm estratégias de gestão passiva, com o objetivo de acompanhar o CDI e o Ibovespa. "A gente entende que a melhor opção para o cliente é o Balanceado Ativo, que tem uma gestão ativa", afirma Tatiana.
Na avaliação de Henrique, do BTG Pactual, o momento é propício para o investidor diversificar a carteira no mercado de renda variável, diante da provável queda de juros no segundo semestre.
O banco de André Esteves lançou em janeiro dois FMPs Carteira Livre, o FMP FGTS Reference Absoluto, com 95% em ações e 5% em títulos públicos, e o FMP Reference Absoluto Moderado, com 60% em ações e 40% em títulos públicos. Os ganhos de ambos estão entre 5,5% e 6% desde o lançamento.
O setor elétrico, via distribuidoras de energia como Energisa e Equatorial, Itaú e a locadora de veículos Localiza estão entre as principais posições dos fundos do BTG.
"As ações brasileiras estão muito depreciadas e têm um potencial de valorização relativamente alto para os padrões históricos", diz Henrique, que afirma que mira empresas com potencial de crescerem o lucro entre 15% e 20% ao ano.
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