BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quer impor multas às indústrias que não cumprirem as metas acordadas para redução das emissões de carbono, uma medida que enfrenta oposição em setores empresariais.

A proposta foi incluída na minuta mais recente do projeto de lei que regulamenta o comércio de créditos de carbono.

O texto, obtido pela reportagem, prevê a aplicação de advertência e multas de até 5% do faturamento bruto da empresa no ano anterior à abertura do processo administrativo.

No caso de outras pessoas físicas ou jurídicas e associações de entidades que não exerçam a atividade empresarial, a multa pode variar de R$ 50 mil a R$ 5 milhões.

Também há a previsão de interdição das instalações associadas a emissões irregulares. O texto ainda deixa claro que o pagamento de multa não exime a empresa sancionada de ainda precisar comprar os créditos de carbono para compensar as emissões.

A elaboração da minuta foi liderada pelo Ministério da Fazenda, mas teve colaboração de uma série de outras pastas, como Indústria e Comércio, Meio Ambiente e Minas e Energia. Agora, passa por revisão dos departamentos jurídicos desses órgãos.

Apesar de terem sido consultados durante a construção do texto, setores da indústria veem com preocupação o capítulo que trata das multas.

Sob condição de anonimato, representantes da iniciativa privada afirmam que parece muito abrupta a previsão de pena sobre 5% do faturamento e a de interdição de instalações, sem um escalonamento maior de sanções.

Afirmam que não são contrários à previsão de sanções, mas que não foram consultados para determinar esse percentual.

O setor industrial, em geral, está em consonância com a minuta proposta pelo governo, que inclusive vai ao encontro de uma proposta apresentada pela CNI (Confederação Nacional da Indústria) sobre o tema.

A divergência está no modelo de penalização adotado no texto.

Uma pessoa ouvida pela reportagem, sob reserva, lembra que na elaboração de outras propostas de regulação desse mercado houve o debate sobre penas e que surgiram ideias, como a aplicação de 20% de multa sobre o valor de crédito devido. Mas que nenhuma das propostas ventiladas até então é similar ao caminho seguido pelo governo no ponto das penalidades.

Dizem sentir falta, ainda, de mecanismos de incentivo financeiro para o atingimento e a superação das metas.

O mercado regulado de carbono é uma forma de reduzir as emissões de gases de efeito estufa na atmosfera, com o estabelecimento de metas de redução e a possibilidade de venda da quantidade excedente.

É uma das apostas do governo Lula e uma das prioridades do ministro da Indústria e vice-presidente, Geraldo Alckmin, para atrair recursos para o país. A estimativa mais recente prevê o acréscimo em receitas de até US$ 120 bilhões até 2030 com essa atividade econômica.

No entanto, grande parte desse mercado ainda se vê travado no país por falta de regulamentação. Há propostas em tramitação na Câmara e no Senado, mas com avanço lento.

O conselho político de Lula ainda irá definir se apresenta essa proposta como um novo projeto de lei ou se usa o seu conteúdo como substitutivo de outra proposta em tramitação.

Segundo a minuta do projeto, as multas serão aplicadas para as empresas e demais entidades que não tiverem, no prazo previsto para os acertos de compensação dos créditos, as quantidades dos chamados CBEs (Cota Brasileira de Emissões) e RVEs (Redução ou Remoção Verificada de Emissões).

Também sofrerá pena aquele que não apresentar relatórios periódicos sobre a emissão de gases de efeito estufa ou descumprir o plano de redução das emissões.

Também fica passível de multa aquele que criar obstáculos para a fiscalização dos órgãos competentes ou fornecer dados falsos no Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa ?a inserção de informações inverídicas é uma das formas mais comuns de burlar o CAR (Cadastro Ambiental Rural), por exemplo.

Após a conclusão da minuta, o governo agora irá começar a pensar em metas, mecanismos de credenciamento e nas entidades que irão regular o mercado de carbono.

A intenção é que a proposta seja aprovada até o final do ano, antes da COP (Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas) 28, que acontece em dezembro.

Uma vez em vigor, a lei precisará ser regulamentada, etapa na qual deve ser definida a estrutura da autoridade responsável por supervisionar o mercado, definir as metas de redução de gases de efeito estufa, a metodologia de mensuração e criar os mecanismos de certificação e credenciamento das empresas do setor.

A autoridade também será responsável por definir a percentagem do total de créditos de carbonos devidos que poderão ser adquiridos no mercado voluntário.

Outro ponto da minuta diz respeito aos povos indígenas ou comunidades tradicionais. Pelo texto, esses grupos poderão ter direito a comercializar créditos de carbono das áreas que ocupam.

Segundo a proposta, deve haver, antes, a consulta livre e irrestrita às populações.

São consideradas aptas para vender os créditos as terras indígenas, áreas públicas não destinadas onde habitem povos ou comunidades tradicionais que promovam atividades de preservação, algumas unidades de conservação e assentamentos agroextrativistas.

Aqueles que aderirem a programas para comercialização de crédito de carbono também recebem o direito a uma indenização de 150% do valor do projeto caso terceiros envolvidos no empreendimento causem danos "individuais e coletivos, materiais e imateriais" às terras ocupadas por estes grupos.


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